Engine Building (construção de motor) é um estilo de jogo onde você constrói um motor de pontos que, no início você ganha 1 coisinha por ação, mas no final você já está combando tudo e cada ação lhe dá 135 pontos e 78 recursos. Mas para isso, você precisa construir sua maquininha direitinho, de forma lógica e que faça sentido.
Este para mim é um dos mais desafiadores tipos de jogo que um designer por criar, e também é um dos meus favoritos. Existe um desafio eterno de equilibrar a criação do motor robusto com a duração da partida que dificulta demais chegar a uma conclusão.
Por exemplo, The Colonist é provavelmente o melhor jogo de engine building que eu já joguei. Mas como já disse, de forma detalhada
neste texto, ele também é o melhor jogo que eu nunca mais vou jogar. Por que? Por que uma partida em 3 jogadores demora mais de 8 horas. Simples assim. Agora, mecanicamente, o jogo é perfeito. Você se sente totalmente evoluindo sua máquina, criando coisas que conversam entre si e maximizando sua capacidade de produção. É como se sua cidade de fato mudasse de Era junto com o jogo.
Por outro lado, quando eu joguei Civilization New Dawn, e me descepcionei com a parte de desenvolvimento do motor que em geral há nos jogos de Civilização. Eu senti que o jogo ficou tão curto que você simplesmente não conseguia distinguir de forma forte o desenvolvimento de uma nação versus a outra. Eu podia ter evoluido para Economia 4 e meu adversário ainda estava na Economia 2, que não se percebia uma diferença brutal entre eles.
Agora mesmo, recentemente, fui jogar o Gnomópolis, engine building muito bacaninha do Igor Knop e Patrick Matheus e terminei o jogo, que durou uns 45 minutos, achando que eu precisava de mais 45 para construir todo o motor que eu queria. Assim que eu consegui construir um motorzinho para combar as cartas com os trabalhadores, o jogo acabou.
E é aí que entra o Le Havre. Joguinho feinho do Uwë e já sem hype após 10 anos de lançamento que é, para mim, a equação perfeita de tempo x benefício do engine building.
Em uma primeira partida de Le Havre, é normal, como é em muitos jogos do Uwë, sentir que você está sendo jogado. Isso acontece por que, como todos sabemos, o Uwë passou fome na infância e o jeito de se vingar disso foi colocando fome/alimentação em todo jogo dele. E meio que por trauma do Agrícola, meio que por medo da penalidade de pontos negativos que você ainda não tem idéia do impacto, você meio que joga assim, jogando para alimentar, para que na outra rodada pegue mais comida para alimentar de novo seu povo. E aí você não faz mais nada no jogo.
Aliás demorou 2 partidas para eu perceber isso. Não era o dinheiro, comida, argila ou aço que era escasso no jogo. Era ação mesmo. O jogo tem 7 ações por turnos a serem divididas por todos os jogadores. Se for em 2 cada um faz 3 ou 4 ações por turno. Se jogar em 4, cada um fará apenas 1 ou 2 ações. Então, você deixa os caras morrerem de fome, pega empréstimo se precisar, e foca no seu motor. Só assim você vai conseguir jogar o jogo. E ver isso mudou totalmente a maneira com que eu me relacionava com Le Havre.
Le Havre é então, o típico Engine Building. Você começa o jogo colocando seu barquinho em um local e catando os recursos de um dos piers. No início você está ali, pegando 2 madeiras, 3 argilas ou 2 grãos. E gasta mais uma ação para transformar argila em tijolo outra para transformar madeira em carvão, uma terceira para pegar ferro e uma quarta para fazer aço. Pronto, agora, depois de quase 3 turnos, você tem 1 aço. Mais nada!
Agora, se você construir os prédios certos, deixar acumular os recursos certos e souber a hora de transformá-los, no final do jogo você vai estar transformando 18 trigos em pão em uma única ação. E na ação seguinte vende tudo por uma fortuna de dinheiro e paga todos aqueles empréstimos que pegou no início do jogo quando você resolveu simplesmente ignorar a alimentação.
Le Havre é portanto, um jogo que te faz, mais do que nunca, sair da visão do que é melhor para mim agora, para o que será melhor para mim no futuro. Quem curte jogos mais táticos, de pegar, fazer, entregar, vai ter problema com ele. É frustrante! Dá medo deixar a galera morrer de fome enquanto você está cheio de trigo e tem uma padaria. Mas não adianta em nada você dar comida para eles agora, quando vai gastar uma ação para transformar 3 trigos, ao inves esperar o fim do jogo e fazer isso 18x com uma única ação.
E no final de talvez, 2 horas, você está com inúmeras cartas de prédio espalhadas em volta da sua área de jogo, se sentindo o máximo por conseguir vender 25 couros de vaca por uma fortuna incalculável que lhe dará a vitória. Ou um lixo por ser o único da mesa que não consegue combar nada.
Não me lembro nenhum outro jogo que me passa tão bem essa sensação em tão pouco tempo. Eu curtia Imperial Settlers por exemplo, mas mesmo ele, não criava um motor tão grande quanto Le Havre e ainda podia demorar mais tempo se jogado em 4 pessoas.
Existem Engine Builders simples, de mecanismos bem leves como Splendor e Century que fazem isso de forma rápida, mas ambos têm designs relativamente simplistas na criação do motor.
Para um jogo que chegou a custar 120 reais em promoções malucas de algumas lojas, Le Havre é uma das melhores opções de jogo do mercado brasileiro. E para quem conseguir passar a curva da frustração e pegar o jeito de jogo, é apaixonante.
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PS: Estou de olho para jogar Everdell como um novo engine building. Além de lindo o gameplay me envolveu. Estou vendo pessoas do Rio que já tem o jogo e o Canal
E ai tem Jogo? do grande Cacá, prometeu um review em breve dele lá.
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