Não sei se muitas pessoas pararam para observar, mas o preço dos board games está caindo. É o mercado se regulando? Oferta maior que a demanda? Crise do mercado geral? Sou jornalista e game designer, e me contive para escrever este artigo: até tenho aqui alguns dados, mas o restante é puro “feeling”. Então vamos lá.
Lembro do tempo em que jogos out of print e/ou importados eram muito, muito caros. À época eu procurava Alquimistas, Robinson Crusoé e Dungeon Lords. Todos eles na faixa de R$ 400 (o que hoje seriam R$ 700). Atualmente, até esses estão caindo de preço. Battlestar Galactica, Lisboa e afins já chegaram a ser vendidos por R$ 600, R$ 700, mas quem coloca a esse preço hoje simplesmente não vende (ou demora muito). Excetuando algumas maluquices (como The Thing, que hoje sai a R$ 700 e ainda tem maluco que paga – rezo para que venha logo outra edição e aconteça o que ocorreu com Alquimistas e Robinson Crusoé), quem hoje quer lucrar com board game usado está quebrando a cara. São muitos os jogos que ficam anunciados por meses sem oferta. O mercado, aos poucos, está entendendo.

Mas e os jogos novos? Por incrível que pareça, eles também estão em queda. O preço, digo. São tantos os jogos lançados por ano que é impossível acompanhar a oferta. Em todo o mundo, são lançados entre 4 mil e 7 mil jogos de tabuleiro, segundo o site BoardGameGeek. Temos hoje no Brasil uma média superior a 300 jogos lançados por ano, movimentando entre R$ 700 milhões e R$ 1 bilhão, segundo dados da Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos (Abrinq). Pense comigo: tirando os colecionadores que compram de tudo um pouco, a maioria dos usuários compram três, quatro, cinco jogos por ano. Se 300 são lançados e eu me interesso por 50 deles (exemplo bem exagerado), isso quer dizer que, pelo menos, 45 dos novos títulos vão ficar para trás. E essa conta só aumenta de ano para ano (sem falar dos títulos clássicos que foram lançados lá atrás e vão ocupar as vagas dessas três ou quatro compras por ano). Que sejam 12 por ano, um jogo novo por mês, ainda assim muita coisa fica para trás. O que nos leva a uma:
Seleção natural: na verdade é uma seleção pessoal, mas o “natural” de Darwin soa melhor para fazer a analogia. Se eu gosto de euros e o mercado me apresenta, naquele ano, 50 novos títulos, fatalmente vou escolher três deles para a minha estante. E vou filtrar bem o que quero, pelo tema, pelas mecânicas, pelas opiniões na internet, indicação de amigos. Isso quer dizer que bons jogos vão sair da minha mira – perder a corrida no meu universo (estante), vão “morrer” em prol dos 3 escolhidos que vão evoluir minha coleção.
Ark Nova, que acho fantástico, saiu da mira de um amigo meu, que gasta muito com jogo, porque o tema não o agradou.
Só isso já diz bastante sobre o mercado, e é por isso que jogos que foram lançados a R$ 400 há pouquíssimo tempo estão custando hoje R$ 200 nas lojas. Muitos usuários pensam como primeira causa dessa queda de preço o
mofo (pode ser uma delas, mas são diversos os problemas que as editoras enfrentam). A segunda causa mais “usada” é
“flopou, então é ruim, por isso despencou o preço”. Conheço muita gente que adora
Tekhenu,
Corrosion e
Golem. Todos eles chegaram ao mercado recentemente, na casa dos R$ 400 ou mais, e hoje estão em torno de R$ 200. Baita jogos, produções lindas, mecânicas legais... Mas o preço caiu. Mofo? Floparam? Não aposto em nenhum dos dois. Aposto em:
O mercado está se regulando sozinho. Seja pela grande quantidade de lançamentos, seja pelo pouco dinheiro que temos para investir, o mercado de board game brasileiro está se auto regulando. Jogos de R$ 400, R$ 500 e R$ 600 não conseguem sobreviver a este novo status quo. Será um trabalho ingrato das editoras (explicar lá fora que, aqui, jogo não pode passar de R$ 300 – ou US$ 60). Ou se acorda isso lá ou melhora a fábrica aqui (definitivamente não sei, pois essa não é minha área).
Aos poucos o usuário está percebendo (mesmo que de forma inconsciente) que um jogo, aqui no Brasil, não pode custar tanto. Isso também reflete o mercado de usados. Os colecionadores estão aprendendo a duras penas que o board game, assim como qualquer outro produto, se desvaloriza assim que deixa a loja. Questão de 20% a 30%, pelo menos. O tal do “aberto para conferência” não cola mais.
Eita, Giovana! Quer dizer que o mercado do board game está em queda? Na minha opinião, nem perto disso. O mercado de jogos de tabuleiro valerá US$ 21,5 bilhões até 2025. Temos mais de 30 editoras apenas aqui no Brasil e muitas delas conseguem fechar o ano com lucro acima de R$ 1,5 milhão – não é muito, se parar para pensar, mas lembrem-se: todo esse mercado está em evolução ainda. O mercado mundial de perfumes hoje é de US$ 60 bilhões. Supérfluo igual. Tão caro quanto. Demorou a chegar onde está, mas chegou. Quando os perfumistas perceberam que fragrâncias não eram só para os nobres, o mercado se regulou, abriram as “avons” e “boticários” da vida e chegamos aos 60 bi. É ter calma, paciência. Porque o mercado sempre se regula.
Luciano Marques