O Ano é 2018 e a gente começa a discutir a saturação de alguns euros no mercado. No
meu texto sobre Pulsar eu falei como PARA MIM, a interação mecânica por si só já não me animava mais. Logo depois, o Rodrigo Rego escreveu o texto
Os Eurogames estão em Declínio? no canal do Mansão das Peças e embora 2 textos na Ludopédia não caracterizarem um indício ou uma tendência, essa mera discussão, em outros momentos, pareceria extremamente infundada. Mas no meio desse meu pensamento, me aparece Brass, um jogo de mais de 10 anos atrás, para dar um tapa de luva na minha cara.
Não dá para dizer que há nada inovador no Brass, afinal, o jogo tem mais de 10 anos e as regras foram praticamente inalteradas para nova versão. O que dá para dizer é que há a elegância de regras ao mesmo tempo que há uma complexidade imensa de estratégia que é característico dos grandes clássicos.
Explicar Brass é muito simples. Na sua mão você tem 8 cartas. Em cada rodada você descarta 2 cartas para fazer 2 ações. As ações são de Construir Industrias, construir links, desenvolver indústria, vender algodão ou pegar empréstimo. Se você for construir indústrias, o que está na carta importa. Você tem de ter a carta da cidade onde quer construir, ou ter a carta da indústria que quer construir e ser capaz de chegar na cidade com teus links. Para todas as outras ações, o que está na carta é indiferente. Você precisa apenas descartá-las. E é só isso! E ao mesmo tempo não é! O grande diferencial em Brass está em como pontuar suas construções e como interagir com outros jogadores.

Veja bem, em Brass, você não pontua por CONSTRUIR coisas. Você pontua por UTILIZÁ-LAS. Isso significa que nada importa se você colocou uma Fábrica de Algodão no mapa se não há um PORTO construído para que você possa fazer a ação de venda. Nada importa se você colocou uma MINA DE CARVÃO se não está havendo demanda por CARVÃO na partida. Jogar bem Brass significa conseguir antecipar a demanda, não apenas sua, mas de toda a mesa e prover aquilo a eles.
Isso acontece por que em Brass, você não joga sozinho e vê quem tem mais ponto no final. O jogo tem muita interação, mas em geral é uma interação positiva. Se você precisa de carvão e há uma mina de outro jogador com carvão ainda nela, você é obrigado a pegar o carvão da Mina desta mina. Aliás, mesmo que você tenha sua PRÓPRIA MINA, você ainda é obrigado a pegar o carvão da Mina mais próxima, seja ela de quem for. E toda vez que, seja você mesmo, ou outro jogador, gastar todo carvão da sua MINA, você pode virar o token para então pontuar e ganhar receita por aquela construção.
É por isso que, se você verificar que toda mesa está investindo em algodão, você pode começar a construir Portos para que no futuro os jogadores sejam obrigados a vender para seus Portos, virando eles e lhe dando Pontos e Receita sem que você precise se esforçar para isso. E como o cara também ganha pontos e receita pela ação, por mais que ele preferisse não te ajudar, ele vai fazer, pois não ganha nada abrindo mão dos pontos para si.
Brass é então, um jogo de alta interação, e de interação que nem sempre é trivial perceber no início do primeiro jogo. Se você faz uma Mina de carvão meio longe e as pessoas fazem outras mais central, é provável que toda vez que alguém utilizar carvão, irá pegar da Mina Central e a sua ali no canto vá ficar sobrando. Até você mesmo vai querer utilizá-la, mas como a regra obriga a pegar da fonte mais próxima, você vai se frustar ao ser obrigado a usar carvão do adversário ao invés do seu.

Outra coisa muito bacana no jogo é marcação velada. O jogo é feito para que você aproveite da interação e cada jogador tem 2 ações (dá para fazer até 4 ações seguidas utilizando-se da mudança de 1o jogador) e por isso você não consegue montar seu império sozinho. Quando você construir uma ligação até um Porto para na próxima jogada vender algodão, um outro jogador vai lá e aproveita a sua ligação para vender na sua frente. Por isso, timing no jogo é muito importante. Como cada pessoa tem 2 ações por turno, ela pode sempre construir uma ligação ou uma indústria de algodão e vender para o Porto na mesma jogada. E por isso, o tempo todo fica um esperando o outro construir ligações entre a cidade para que você possa vender utilizando a ligação entre as cidades de outro jogador.
E já que eu falei de timing, vem aí a outra situação que o jogo me conquistou. Em Brass, o 1o jogador é definido pelo tanto de grana que cada jogador gastou na rodada. Quem gastou menos, joga primeiro na próxima rodada. E com isso, você pode também manipular a ordem das jogadas que pretende fazer para então dar um pulo na frente do adversário na próxima jogada e fazer antes, algo que ele pretendia fazer.
Obvio que se você não pegar bem o timing, ou se a mesa pegar melhor que você, o jogo será ALTAMENTE frustante. Você constrói uma conexão até o Porto para vender algodão e vai alguém lá e usa a sua conexão para vender na sua frente. Você constrói uma Mina de Carvão ali e vai alguém e constrói outra mais próxima da galera e nem mesmo você pode utilizar o carvão da sua Mina. Jogar bem Brass é saber ler a mesa e antecipar o timing das coisas. Ao mesmo tempo, ter um plano B pois a mesa inteira vai perceber que você está antecipando algo e fará o possível para mudar seus planos para que você não tenha sucesso na sua jornada. E é super bacana como um jogo, que deveria ter uma interação altamente positiva, vira um jogo tão marcado.
Nem todo mundo ama Brass. Apesar do jogo ter uma ótima posição nos rankings do BGG, há reviews bem válidos como o do canal inglês
Shut Up and Sit Down que explicam bem por que eles não curtiram o jogo. E é sempre bom ver e ouvir a opinião contrária né? Se você não tiver problema com inglês vale muito a pena ver, pois além de tudo, o vídeo é um dos mais engraçados do canal. Mas em geral, ele tem feito sucesso em quase todas as mesas que o apresentei.
Eu mesmo, amei! Conheci o jogo apenas esse ano e falo que, sem sombra de dúvida, foi o melhor jogo que conheci em 2018. Foi tanto que eu não me segurei e peguei a versão do Brass Birmingham. A princípio eu evitei comprar ela por achar muito parecida com a original e não ter sentido ter ambas. Mas hoje, todas opiniões e reviews que vejo do Brass Birmingham, é que é ainda melhor.
Além de tudo, a produção está linda! Maravilhosa na verdade! Ainda que tenha ficado escura e com a cara "suja" de uma industrialização do século 18, o jogo fica maravilhoso na mesa. E as moedas de ficha de poker são um esculacho. A maior parte das pessoas que me vêem jogando Brass nos eventos, sequer acredita que aquilo veio no jogo. Acham que eu comprei por fora para pimpar meu Brass. Elas só vem no jogo na versão Deluxe/KS, mas podem ser compradas por fora também.
E a Roxley divulgou um comunicado essa semana que estava com uma parceria com a Conclave para tentar resolver um entrave que teve no envio da versão Kickstarter para os backers brasileiros. Isso não tem nada a ver com uma versão nacional do jogo, mas fica a expectativa que o jogo chegue por aqui como resultado dessa parceria. Quem sabe?
Brass é um jogo lindo, com regras em geral simples e com uma interação maravilhosa que faz com que cada jogo seja um jogo diferente, ainda que, com características parecidas. Virou tão queridinho aqui em casa que, junto com o Root, ele já fica dentro do carro, todos os dias, apenas para ter a possibilidade de jogá-lo a qualquer hora caso surja a oportunidade.
Agora, estou na expectativa absurda de jogar o Brass Birmingham, que pelo que vi, só faz melhorar ainda mais alguns aspectos do jogo. E se isso for verdade, eu não vou precisar roubar e dar, para um jogo lançado em 2007, o título de jogo do Ano 2018.
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