Cooperativo
Situação cotidiana de um jogador: é sábado a noite, você finalmente consegue, após semanas de remarcações, juntar 3 ou 4 conhecidos para um noite de jogos. Você prepara o ambiente, enche a geladeira de bebidas e compra os melhores petiscos, aqueles que não correm o risco de sujar suas cartas com resíduo laranja.
Os convidados chegam, um carteado geralmente começa a noite com boas risadas e descompromisso, afinal, várias partidas podem ser seguidas e nos permitimos não jogar aquilo a sério, como se precisássemos dessa permissão pessoal. Depois de algumas partidas, suficiente para ter vários ganhadores, mas não o mesmo, passando uma sensação geral de vitória a quase todos, você resolve sacar um jogo apaziguador antes de ir para a estrela da noite, que provavelmente tomará ao menos duas horas das suas noites.
E o momento de calmaria que deveria se instaurar torna-se o puro caos. O motivo? Na sua inocência de querer colocar um jogo cooperativo na mesa e trazer ao grupo momentos de realização mútua e camaradagem, apenas bons amigos se ajudando para realizar tarefas, você recebe cenários diferentes do imaginado, mas com causas muito semelhantes.
Primeiramente, existe uma grande chance de alguém torcer o nariz e negar a partida. Ele vai dizer que não é o seu estilo de jogo, que não vê graça ou propósito em passar seu tempo num jogo cooperativo, como se todo o jogo cooperativo fosse igual. Pode acontecer ainda pior, esse mesmo jogador se colocar a mesa e participar da joga, mas não dar à mínima atenção ao que está acontecendo ou o que é deve ser feito por ele, funcionando quase como um NPC durante todo o desafio apresentado.
É claro, não poderíamos esquecer-nos do conhecido alpha player, espírito obscuro que se manifesta em cada mesa cooperativa e toma as glórias, e a diversão, exclusivamente para si, fazendo de seus parceiros meros espectadores de rodadas que demoram a passar.
Diversas possibilidades, uma mesma causa. Não somos ensinados a cooperar. Desde a infância somos moldados num ambiente de excessiva competição. Na escola já somos dirigidos a lutar por lugares, notas, materiais, atenção. Aprendemos que sempre existe um perdedor, mas esperamos que esse perdedor não seja nós mesmos. Impelem em cada ser um protagonismo distorcido, que te leva a crer com lógica e coração que todo e qualquer ato da sua vida é conseqüência direta de suas ações.
Uma meritocracia simplista, sem parâmetros determinados, para dizer que você precisa se esforçar, e se não for o suficiente, se esforce mais, queria mais, lute mais. A vida é assim mesmo, nem todos podem chegar até onde você chegou, pois nem todos se esforçaram pra isso como você. Temos o mesmo tempo, as mesmas condições, os mesmos auxílios. Vença, vença e vença.
Jogos em equipe já são muito complexos, podem mostram nossas piores faces. Se você ganha, é mérito seu, carregou a equipe nas costas e mostrou que mereceu ganhar. Se sua equipe sai derrotada, incompetência dos outros, alguém estava desconcentrado, alguém deixou a vitória escapar. Você é um vencedor.
Por isso é melhor nem se arriscar num jogo cooperativo. Qual o objetivo? Nenhuma vitória é tão saborosa quando é divida, assim querem que acreditemos. Numa sociedade da produtividade exagerada, é preciso nos fazer acreditar que o trabalho individual é mais recompensador que o resultado em grupo.
Por quê? Se entendermos a lógica do sistema e percebermos que juntos conseguiremos resultados maiores e melhores, uma sociedade de exclusão e acúmulo não funcionará, precisam que acreditemos que sozinhos podemos chegar mais longe. A beleza do trabalho em equipe só é oferecida se for para atingir interesses individuais.
"O habitus é um sistema de disposições duráveis e transferíveis, que funciona como princípio gerador e estruturador de práticas e representações." (Pierre Bourdieu, 1980). Assim, acostumados à competição, associamos facilmente tal espírito em todos os meios da nossa vida, profissional e social, e negamos a cooperação até mesmo num simples jogo de tabuleiro. Basta pensar em quantos jogos competitivos/cooperativos estão nas melhores colocações dos rankings mundiais, ou verificar se os exemplos iniciais dados neste texto acontecem com mais frequência em que tipo de jogo. Somos sempre levados a competir.
Que fique então o convite a tomarmos a consciência da nossa existência e abrirmos a mente para novas possibilidades. Se você também já teve esse sentimento negativo pelos jogos cooperativos, talvez seja o momento de dar mais uma chance e mergulhar nesse ambiente de diversão conjunta. Perder ou ganhar deixam de ser o grande propósito quando existe cooperação. São vários jogos a serem explorados, muito a se aprender para além da mesa.
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Meeples do mundo, uni-vos!