Três Mestres, Três Caminhos: Como Lacerda, Feld e Suchý Inspiram a Criação de Novos Jogos
Fiquei pensando um pouco sobre os jogos que são lançados, onde as mecânicas são copiadas, melhoradas ou pioradas pelos designers, e o que isso reflete na criação de um jogo novo. Vou focar mais naqueles autores que acompanho de perto ou nos jogos onde vejo essa referência de forma mais clara.
Vou começar pelo designer de quem sou fã:
Vital Lacerda. Um autor para quem o tema do jogo é essencial, e que realmente faz sentido explicar as regras sempre puxando para o tema, em vez de simplesmente dizer: "move aqui, pega isso".
O primeiro jogo que comprei dele foi o Vinhos, na versão Deluxe, lá em 2017 (o jogo é de 2010). Tenho até hoje e é um dos meus Top 3. O que temos nesse jogo? Basicamente, 9 espaços para alocar seu único peão — sendo que uma dessas ações é simplesmente passar, ou seja, sobram 8 ações efetivas.
Aí olhamos para o CO₂, um jogo que originalmente foi feito para ser competitivo, mas acabou quebrando um pouco no equilíbrio geral. Depois lançaram o CO₂: Second Chance, trazendo a proposta de semi-coop, que na minha opinião é onde o jogo realmente brilha. Nele, você também tem um peão e pode realizar uma das 3 ações principais, além de outras 3 secundárias.
Depois vem o Kanban (2014), onde você possui um peão e cinco locais para visitar, sendo que cada local oferece duas ações principais (você escolhe uma).
Em The Gallerist (2015), você tem novamente apenas um peão e alguns assistentes (que permitem ações extras se for expulso). São quatro locais específicos, cada um com duas ações — totalizando 8 principais.
O padrão continua em Lisboa (a mecânica muda, mas o princípio é semelhante com o uso de cartas), On Mars e Weather Machine.
Percebe-se que ele encontrou seu sweet spot: jogos altamente intrincados em que você deve resolver o caminho do seu jogo com apenas uma ação por rodada.
À primeira vista, é só mover o peão e executar a ação, mas há diversas "paredes invisíveis" de regras e consequências que tornam cada decisão densa. E isso, pra mim, é fantástico.
Conclusão:
Vital parece sempre pensar assim: "Vou usar um peão e vou colocar uns 4 ou 5 locais com ações bem entrelaçadas". E funciona.
Agora vamos ao
Stefan Feld.
– O que você quer usar nesse jogo? Dados, peões, cubos, tiles, meeples...?
– SIM!
Feld é uma verdadeira feira de pontos. Tudo dá ponto: sorrir durante a partida dá ponto, fazer piada ruim dá ponto, derrubar cubinho da mesa... 5 pontos!
Já tive os seguintes jogos dele: Jórvík (reimplementação do "Schwazzznãoseioquê"), Trajan (jogaço!), Bonfire, até chegar à minha última aquisição: Castles of Burgundy.
Basicamente, você rola dois dados e se vira com o que sair.
Feld é prolífico em criar jogos abstratos. Normalmente há um tema só para dar uma “roupagem bonita”, porque dificilmente você sente estar inserido em algum universo. Ele pega o que tem à disposição e faz a "vitamina" dele. E, nesse processo, entrega jogos excelentes.
Conclusão:
Feld aceita qualquer coisa que dê pontos. Hahaha!
Vladimir Suchý
Sou fissurado no Underwater Cities dele — tenho tudo. Adoro a combinação de escolher um local (dentre 15 ações possíveis usando três peões submarinos), associar com uma carta da mesma cor para potencializar a ação, além do quebra-cabeça individual no seu tabuleiro. O jogo evolui em três eras, com cartas ficando progressivamente mais poderosas.
Já tive também o Praga Caput Regni. Achei visualmente poluído. A mecânica de escolher uma peça de uma roda giratória e executar duas ações foi interessante, mas o tabuleiro central é esparso e confuso de analisar.
Joguei ainda o Pulsar 2849, que inicialmente me lembrou Grand Austria Hotel pela mecânica de escolha de dados em estilo bumerangue (vai e volta de acordo com a posição do jogador). Como se tem dois dados por rodada, geralmente dá pra fazer duas ações e seguir com o jogo. É simples de jogar, tem muita iconografia, mas é direto ao ponto. Gostei bastante.
Conclusão:
Vladimir sempre tenta fugir do óbvio, buscando mecânicas diferentes e experiências únicas a cada novo título.
Conclusão Final
A análise desses três grandes designers mostra como estilos tão distintos podem impactar profundamente a forma como jogamos — e como criamos.
Vital Lacerda aposta na profundidade estratégica com ações mínimas e consequências máximas.
Stefan Feld abraça a diversidade e transforma qualquer mecânica em pontos, promovendo acessibilidade e flexibilidade.
Vladimir Suchý busca inovação constante, propondo novas formas de pensar o design de jogos.
Essas abordagens, mesmo partindo de ideias já vistas, mostram que a originalidade no game design não está em criar tudo do zero, mas em como se reinventa o que já existe com intenção, propósito e identidade. Para quem deseja criar seus próprios jogos, estudar essas assinaturas de design é mais valioso do que tentar reinventar a roda.
E você??
Quais mecânicas ou designers você reconhece como tendo mecânicas interessantes em seus jogos?