Dos jogos que fizeram sucesso lá fora e nunca foram lançados no Brasil, um dos que mais me espantam é Dungeon Lords. O título é uma obra prima do nosso querido Vlaada Chvátil (provavelmente meu designer preferido, embora isso não pese neste quesito). Lá fora ele foi tão amado que ganhou uma baita edição de luxo. O tema medieval é daqueles que atraem muitos e a mecânica é simplesmente genial. E no que diz respeito à temática, uma banho de criatividade: se na “vida real” nós somos os heróis que invadem uma dungeon em busca de tesouros e glória, em Dungeon Lords interpretamos justamente o lado de lá: os donos de masmorras que precisam se preparar para os saques orquestrados por paladinos, guerreiros e ladinos. No universo do Vlaada, vilões são justamente esses caras de armaduras brilhantes, capa e espada.
Só consigo imaginar um único motivo para que Dungeon Lords nunca tenha vindo pra cá:
o brasileiro não gosta de jogo punitivo. E se o Brasil não gosta de punição, o Brasil não gosta (ou gostaria) de Dungeon Lords.
Ele é, de verdade, um jogo punitivo. Se você não prepara muito bem sua masmorra, os vilões (guerreiros, paladinos e etc) vão entrar arrasando tudo o que lhe dará ponto de vitória no fim do jogo. E recuperar-se no meio do caminho é complicado.
Dungeon Lords (2009) também é um pouco pesado, principalmente pela programação de ações (que ao mesmo tempo é a mecânica delícia desse jogo) e também talvez por isso Dungeon Petz (2011) tenha sido o escolhido por uma editora brasileira. Petz é do mesmo universo, de longe menos punitivo, com alocação de trabalhador mais simples e um tema mais “cute”, mas é outro jogo. Ouso dizer que Dungeon Lords é único, tem uma jogabilidade só dele e é genial em vários sentidos.
O que tenho percebido em todos esses anos é que jogos pesados e punitivos (daqueles que se você erra muito em uma rodada fica difícil de recuperar) passam longe da preferência das editoras – porque talvez eles já saibam que nosso público não se dá muito bem com eles, vai saber. Quem gosta desse tipo de jogo é um nicho dentro do nicho? Se for, esse segmento terá ainda menos títulos por aqui, já que nosso hobby já é um nicho por si só. A não ser que o público brasileiro amadureça, ao longo de 10, 20 anos e se encontre num momento em que hoje os europeus estão em relação à estratégia mais pesada.
Infelizmente achar um exemplar de Dungeon Lords aqui no Brasil é dose. Vais pagar uns 500 a 700 reais, se encontrar. Esse jogo foi um dos meus primeiros (e ao lado de Robinson Crusoé me fizeram entrar para o universo dos BGs). Tive a sorte de conseguir a edição de aniversário, linda de morrer – à época paguei cerca de R$ 500, o que hoje seria o equivalente a R$ 1 mil.
O título afirmando que o Brasil não gosta de Dungeon Lords é, obviamente, uma brincadeira. O jogo está na posição 263 do nosso rank (378 no BGG). Caso tenha a chance de jogar Dungeon Lords com um amigo, jogue! E não esmoreça na primeira partida (o próprio manual, engraçado pacas, o alerta que a estreia será uma surra). Jogue mais de uma vez e descubra o fino do board game.
Luciano Marques