Vladimir Suchy é um desenvolvedor de jogos muito prolífico. Desde 2017, ao menos todos os anos (ou a cada dois), ele lança algum jogo.
Todos são bem diferentes entre si, talvez com este ou aquele elemento que nos faz pensar nele, principalmente se falarmos de rondéis.
Não há um jogador que não ache interessante o rondel de seleção de ação de Praga e dos Marceneiros.
Mas se você os achava interessantes, em Shipyard eles são aos montes.
Lançado originalmente em 2009, no auge da transição dos euros clássicos de regras rápidas e alta interação para o que se convencionou chamar de euro moderno, com suas regras densas e seus tabuleiros individuais de jogadores onde o jogo acaba se desenrolando.
Shipyard tem tudo que se espera de um Multiplayer Solitaire como se seguisse um checklist:
seleção de ação/alocação de trabalhador
upgrades (os tiles de trabalhadores)
dinheiro para adquirir recursos (partes de navio, commodities, canais)
aquisição de recursos (estruturas, tripulantes, capitão)
construção de tableau (onde construímos nossos barcos)
fase de pontuação (quando colocamos um barco recém-construído e um canal)
contratos de fim de jogo (pontuação fechada sorteada no início da partida)
Sendo assim, não seria Shipyard mais do mesmo? Será que ainda é relevante nos dias atuais? E a resposta é um sonoro e retumbante SIM.
Primeiro, tenho que confessar que nunca fui muito fã do designer. Eu já joguei todos os jogos dele lançados entre Pulsar e Marceneiros. E todos eles sempre pareceram que o designer estava tryhardando demais.
Eu adoro um jogo intrincado, denso e cheio de regras, desde que elas façam sentido e não apenas porque o designer pensou que seria legal colocar 4 ou 5 mecanismos no jogo só porque lhe deu vontade.
Também sempre acho que alguma coisa nos jogos dele não foi exaustivamente testada. Não que eu não goste dos jogos dele, mas quando eu terminava uma partida, eu ficava pensando: “Nossa, se não tivesse tal coisa, o jogo ficaria mais enxuto”, ou “Nossa, tal coisa ficou um pouco desbalanceada”.
Mas felizmente esse excesso de gordura é algo que Shipyard não tem. Ele é enxuto e direto: você tem que construir barcos. É como pontuar, é o que vale para os contratos. Simples.
Não é uma salada de pontos.
Não me levem a mal, ele tem um contrato amplamente conhecido por ser desbalanceado, rendendo até algumas variantes criadas pela comunidade para melhorar isso. Mas mesmo com esse contrato desbalanceado, Shipyard tem um gameplay que eu adorei.
Além do rondel de seleção/alocação de ações, nós ainda temos quatro rondéis para podermos adquirir recursos, dinheiro ou upgrades. E esse Inception de rondel (rondeption?) torna a dinâmica e iteração entre os jogadores algo além do “simples” draft/seleção/alocação de trabalhadores.
Pois deixar de fazer uma determinada ação num determinado momento porque o rondel não está na posição que você queria pode te atrasar por algumas rodadas até que as coisas funcionem do jeito que você precisa.
Ter me apaixonado por Shipyard (que já figura como um dos meus jogos favoritos da minha coleção) me fez até ver com outros olhos o que eu antes via como falha. E isso me incentivou a rejogar cada um deles (e ainda fazer gameplay e review, fiquem de olho no canal).
Shipyard continua tão relevante que recebeu uma belíssima 2ª edição em 2023 após alguns problemas que o designer tinha com a editora original. Essa segunda edição não alterou nada na mecânica do jogo (e nem precisava alterar), mantendo inclusive o malfalado contrato desbalanceado e adicionando dois novos.
A principal mudança entre a 1ª e a 2ª edição é estética, deixando inclusive o rondel de seleção de ações mais “temático”.
Se e quando esse jogo vier em versão nacional, não deixem passar a oportunidade de experimentá-lo, numa ludoteca, ou a do amiguinho. Ou experimentem até mesmo a versão “não tão bonita mas com seu charme” da 1ª edição. Tenho certeza que não vai decepcionar o apreciador de um bom euro.