E vamos seguindo nessa saga de recapitular 10 anos de hobby! Já falamos de 2014 a 2018 então bora vislumbrar como estava o exercício do hobby em 2019 para este kina que vos fala! Esse foi o ano do jogo um pouco mais pesado pra mim(majoritariamente euros), e como tal, foi um ano pra se debruçar sobre matemática mais elaborada, consequências de planejamento e combos, e influência do tema em jogos onde no fim do dia, o principal é triturar pontos e mais pontos... O insight lúdico seria “Até onde vai a curva de aprendizado que modifica seu perfil de jogador, quando você se propõe e se apoia em um tema que gosta”? Além disso, da mesma forma que em postagens anteriores seguiremos a seguinte estrutura:
-Como estava minha “mente jogadora” na época, pelo menos até onde consigo lembrar no feeling de retrospectiva, e como essa mentalidade/perfil de jogador seguiu se moldando com os anos avançando.
-Qual o melhor jogo que conheci e adquiri naquele ano, e que está na coleção até hoje! Remetendo ao porquê de possuir uma cópia, seja pelas mecânicas, seja pela abordagem/tema ou outros motivos.
-Qual o jogo que disse adeus, e merece destaque por fazer falta em algum nível ou que não faz falta nenhuma e "já foi tarde".
-Uma amarração mais ou menos conclusiva, dando alguma deixa para o ano seguinte, 2020.
Vamo que vamo!
-Sobre meu panorama de jogador em 2019:
Se você não ficar alojado no slot de jogador casual, o hobby vai sempre te impelir a buscar mais, querer mais e mais. Pode ser sobre mais partidas, mais jogos em termos gerais, mais imersão e participação numa comunidade de jogadores… Salvo algumas questões de perfil de jogador, o normal é que vá tudo escalonando, tudo aumentando sendo os preços a única coisa que você deseja fortemente que não aumente
. Mesmo vindo de um contexto mais ameri e de cardgames (como já citei em várias postagens de flashback: Hero quest e magic the gathering) eu sempre me interessei por regras mais elaboradas, menos sorte de entrada ou de saída na resolução das mecânicas, e por aí vai. Foi em 2019 que eu conheci o que pra mim foi o zombicide dos euros… Wingspan! A comparação (que deve soar desajeitada pra alguns) é devido a ter sido um jogo que impulsiona a querer conhecer outros, nesse caso no certame da “eurolândia” bem como outros não necessariamente euros, mas que eram de alta complexidade. A baixa dependência de sorte (embora isso seja discutível) e as possibilidades matemáticas que vão desde continhas rápidas até quase que equações de uma disciplina de cálculo de ensino superior, me encantaram, na verdade me encantam ainda, mas era diferente 5 anos atrás.
Eu fui desenvolvendo fortemente um perfil mais de amante dos números, mais de "solucionador de problemas", decifrador de códigos. O feeling de sentir o aspecto desafiador pelo gerenciamento e as mecânicas do jogo pra mim é o mesmo dos jogos menos pesados, porém com camadas e mais camadas adicionais. Vale comentar que o que pra uns ativa paralisia de análise das formas mais absurdas (a demora pra conduzir o turno fazendo as jogadas), pra outros é o "café da manhã". Eu sou propenso a ter AP, mas tento manter num nível saudável que não detone com a experiência dos demais jogadores. Embora jogos em tempo real discordem, a luta não tem que ser contra o relógio hehe. Esses euros mais maciços e elaborados podem transportar facilmente para o meme da confused lady/ Nazaré, especialmente se você está adentrando recentemente essa seara, sendo esse o meu caso nesse ano. Por um tempo (acho que um trimestre, ou semestre) fiquei deslumbrado, e embora entendesse a relatividade(votação aberta) da escala de complexidade do bgg eu queria prioritariamente jogar os de complexidade 4 e acima. Nesse menu eu queria almoçar um lisboa, com um feudum pra acompanhar e twilight imperium 4 na janta. Se eu tivesse apenas seguido, provavelmente Mage knight, on mars e high frontier estariam engrossando as fileiras da minha coleção agora.

Devo admitir que rolou um misto de fascínio somado com a vontade de querer explorar minha capacidade nas malhas de tomada de decisão nesses títulos que enveredam suas engrenagens (como na imagem acima) nas regras por dentro de regras. São camadas de exceções e condições a serem atendidas para poder pontuar tanto miseravelmente quanto de forma brilhante. Depois de um tempo veio a sobriedade. (Quase sempre tem que haver uma embriaguez primeiro). Você não precisa acelerar nessa direção, e se o faz, dependendo do que busca dentro do hobby, do que te apraz, e do que você entende como diversão, pode ser necessário frear antes de cair num precipício cartunesco (ou não) no fim da estrada. Com o tempo se nota (pelo menos eu notei) que na apreciação mais rebuscada, não precisa virar um sommelier. Sem ofensa a quem se abraça com essa vibe (escalada de complexidade) mas combinar a complexidade estimada (digamos 4+ na escala de 5) e ficar vendo o ranqueamento do jogo, como também focar se é do autor mais ou menos renomado, na minha modesta opinião, é como dizer que esse ou aquele filme é necessariamente bom apenas por ser premiado (Oscar e outros títulos), ou por ser de determinado diretor. Embora busquemos referências, e rótulos para entender melhor o que esperar, isso pode virar um filtro determinista e tediosamente excludente.
É pra ser sobre se divertir afinal (um belo ataque do capitão óbvio) mas parece que alguns se esquecem disso ou deixam em segundo plano. Parte da comunidade e nós mesmos podemos padecer de algum grau de vaidade intelectual. Não precisa concordar 100%, mas ao invés de ligar o volume no máximo, muitas vezes é melhor simplesmente ligar esse volume o suficiente para ouvir sem ruído. A "medida" correta varia com sua "audição" que seria seu perfil de jogador. Em termos de camadas, nem sempre você quer uma orquestra, mas a substituição não precisa ser apenas um dos instrumentos isolado, pode ser um quarteto de cordas, um violino+piano ou coisa assim. Eu mesmo me descobri um apreciador dos jogos médios, na complexidade ali por volta de 2,7 a 3,3, e que tendem a ter uma partida menos demorada também, algo como 25 a 30 minutos por cabeça.
A ideia seria não morder mais do que consegue mastigar, o que vai obviamente variar de um grupo de jogadores pra outro. Aquele pessoal ali batendo um splendor, um 7 Wonders, bem como aqueles outros falando fino numa partida de vodu, ou ainda correndo em torno da mesa com um Happy Salmon não são piores/inferiores do que outro grupo jogando essa ou aquela trilogia dos pontos cardeais, ou um Lacerdão da vida, você que é chato. Isso se torna simples de perceber e depois de um tempo fica orgânico, mas em 2019 eu fui pelo caminho do “quanto mais complexo melhor”. Até que consegui perceber que (pra mim) isso gerava certo nível de esforço e expectativas exageradas pras entregas de um jogo. Meu pós 2019 foi mostrando que menos pode realmente ser mais. O termo curva de aprendizado normalmente serve pra um motorista aprendendo a dirigir indicar as melhoras após várias partidas de um mesmo jogo, mas pra mim também se aplica ao que aprendemos no exercício do hobby. 
-Qual jogo marcou em 2019 e marca até hoje? (e os motivos em torno disso)
Teotihuacan e toda sua “eurice” com tema asteca dominou meu 2019, sem sombra de dúvida. Ora vejam, eu fiquei maravilhado com os pequenos grandes cálculos do wingspan (que é um 2,46 na escala de complexidade). Eu simplesmente queria mais das tomadas de decisão matemáticas, e dos planos a médio e longo prazo, fora ter ficado maravilhado com o conceito de dice workers! Essa belezinha é um 3,78 de complexity.
O que depois de mais experiência se torna apenas um “vou sentar e ler o manual” e é visto como algo tão tranquilo quanto sleevar cartas, na época era um evento… Como assim 6 páginas só pra ensinar a organizar o jogo(leia-se fazer o setup)? Parecia muita carga ou preocupação apenas para preparar de forma apropriada o jogo e a área do jogador. Fora que depois havia mais 9 páginas explicando as regras gerais, as possibilidades e como as ações resolvem. Hoje vem como flashback num feeling de rir dessa primeira impressão de que eu teria que “estudar” o jogo para jogá-lo VS lembrar com carinho o prazer das descobertas numa jornada de busca por entendimento em jogos de maior calibre.

Falando do jogo em si, é um rondel de dice workers nada menos que sensacional. O jogo promove um movimento circular em suas 8 áreas (3 superiores, 3 inferiores e 2 centrais + a pirâmide que entrega um puzzle 3d) onde você simplesmente vai orquestrar tanto o levantamento de recursos quanto o gasto para avanços e obtenções de pontos. Em essência só há 2 ações, que são mover os dados no sentido horário seja para fazer uma ação(e seus desdobramentos), seja para angariar cacau, ou gastar a vez pra destravar os dados gastos anteriormente. Nisso a força dos trabalhadores determina quão bem a ação resolve, onde 1 representa uma força iniciante, 2 e 3 um trabalhador experiente e 4 e 5 um veterano. Resolver as ações com 1, 2 ou 3 dados de sua cor presentes na áreas, também vai fortalecer bastante, e é uma das vibes principais do jogo, como se você desse “hold” e depois pipocasse tudo de uma vez. Não fosse um polêmico set collection das máscaras que (sem hate), é simplesmente desencontrado e muitas e muitas vezes se apresenta matematicamente desinteressante pro jogador, este jogo seria impecável (e não adianta dizer que o sacerdote de quetzalcoatl ou as máscaras adicinais ajeitaram isso, são de expansão e é específico d+
) .
Evidentemente a fruição do jogo era(e é até hoje) sobre a matemática mas também era sobre o tema sabem? Hoje transparece que há muitos pontos apenas tematizados e não necessariamente temáticos (a gente vai ficando experiente, afinal). Se você procurar direitinho, encontra em fórum internacional relatos de abordagens e representações errôneas de aspectos culturais específicos astecas. Isso também ocorre em relação aos Maias no tzolkin (salvo engano até mais do que no teoti) e não estranharia se tiver algo “melado” em relação aos Incas do Tawantinsuyu também, mas não posso afirmar sobre este último. Não é nada no nível episódio antigo dos simpsons mostrando o Brasil, mas uma curadoria aprimorada já sanaria, já evitaria erros dessa estirpe. O que quero dizer é que ainda assim foi o tema que me guiou nessa jornada pela busca desse jogo mais encorpado.
Ele se tornou uma baita paixão avassaladora pra mim, contribuiu com meu lado solo player (pois meu grupo não aguentava mais partidas seguidas hehe) e me ensinou como o tema influencia nossa alegria de jogar cada vez mais um determinado título. Vamos ser um pouco frios… podia ser qualquer coisa no tema? Quem sabe né? Tá aí o skymines revisando o mombasa. Tem uma vastidão de euros com trilhas, mas no teoti as trilhas são escadarias de templo, o topo do templo será apenas daquele mais benquisto pelo determinado deus, o clock que avança com a ascensão/morte/reset (quando ele vai de “nível” 5 pra 6) de um dice worker simboliza o fim de um era, remetendo ao avanço e aproximação de uma transição/passagem: O ECLIPSE (que marca o clock de endgame). Acontecem 3 eras que embora sejam só um nome bonito pra marcar o tempo, a pirâmide vai avançando em sua construção, há mais mortos para serem honrados, as tecnologias mais interessantes/proveitosas já foram descobertas e os deuses já podem ter sido adorados até o máximo em seus templos. Bonito de se ver e entender, em minha singela percepção. 
Quais jogos marcaram em 2019, mas não permanecem na coleção? (e os motivos em torno disso)
Já mostrando quem foram os meliantes desse ano, antes de qualquer coisa haha 
Ex Libris tinha tudo pra ser um jogo bonito na mesa, com alocação de trabalhadores e principalmente um set collection dentro de uma construção a partir de modelo interessante (nesse caso a estante dos livros). A pontuação quis entregar variabilidade em suas categorias, e embora não tenha particularmente me incomodado. Já meu grupo sempre reclamava que a cada nova carta alocada, tinha que fazer uma catação de milho, ou um esquema de separar feijões (visualmente falando) para entender como estava indo nas categorias (há livros proibidos + seu tipo favorito + o tipo mais raro dentre os que você tem).
O que bota ele muuuuuuito por terra é a assimetria. Os locais onde você vai alocar o trabalhador, as vezes fazem feio, com alguns absurdamente mais interessantes ou fortes do que outros… mas na dinâmica das rodadas, eles vão saindo e entrando novos, então vá lá que seja, incomoda mas não detona o jogo. Já os auxliares de biblioteca, que são os meeples personalizados, de golem, múmia, elemental, goblin etc dão uma aula de como não deve ser uma assimetria. Falou nela, é normal se distanciar um pouco do balanceamento, mas não precisa ser um verdadeiro festival de desequilíbrio. Com pouca observação e entendimento das regras (tipo primeira ou segunda partida) você já vai se deparar com falas do tipo: “pera, o meu é pior do que o do resto da mesa?”, “esse outro só roda direito se forem 4 jogadores?”, “caraca, esse outro faz isso tudo mesmo?”e por aí vai. Uma pena mesmo pro Ex libris, fico curioso com Ex Libris: Revised Edition de 2023. Só pra constar reduziram os mais de 10 assistentes(creio que 12 ou 13, se bem recordo) para 4. Suponho que deva ter ficado só os que não promoviam esse feeling zoado no equilíbrio da jogabilidade, e me pergunto se alguns locais também tomaram um fix ou não?
Sobre o Dinosaur Island, infelizmente ele é um jogo bonitinho porém ordinário. Os problemas começam na duração que é determinada pelo jogador pra ser curta média ou longa… Em uma partida curta disparou o endgame em 3 rodadas, ficando aquele clima de“ok, era pra ser curto mesmo né? esquisito, mas então tá”. Bem pior foi ver partida curta de 5 rodadas, ao passo que resolvemos uma partida média (pasmem) em 4 rodadas. A questão é que você terá objetivos = a jogadores+1 e quando restar só um ativa o final do jogo. Por vezes parece até que tem que ter um semicoop combinado no começo da partida: “E aí galera, se quiserem jogar mais, é melhor não olharmos cada um pra um objetivo diferente, beleza?” Fala sério! Piora quando você nota que o parque é um amontoado de slots únicos ou duplos, estilo “cabe ou não cabe” e pronto. Parece que isso foi percebido como defasado em algum grau, pois na expansão tem blueprints com metas de construção, mas e pra quem joga só com o jogo base? Criou-se quase um consenso que pra te entregar a experiência apropriada você tem que correr atrás dos dinomeeples personalizados, que tinham versão adesivada ou não. Apesar de não ser nenhum crime capital representar tudo com os que vêm na caixa, ficando todos triceratops ou algo assim.
Os caras foram simplesmente ambiciosos até o talo, não dá pra deixar de notar que o Tiny Epic dinosaurs ou mesmo o Draftosaurus, ambos produções beeeem menores (em relação a um eurão de caixa grandona) fazem por onde, pra entregar melhor representação no que tange meeples diferenciados/vários tipos de meeples. Ainda sobre os dinos, é notável como ficaram sem personalidade... No jogo dispomos de 3 dnas básicos e 3 avançados, as builds deles são apenas uma miscelânea de usar essa ou aquela cor de DNA. Existem 4 tipos: O teu básico você faz de qualquer mistura de 2 dnas simples, os herbívoros serão 2 simples e 1 avançado, os carnívoros pequenos 2 simples e 2 avançados, os carnívoros grandes (quarta e última categoria) custam 2 simples e 3 avançados. Aí temos por exemplo o velociraptor que é um carnívoro pequeno e quebra a regra pois não demanda os 2 simples e 2 avançados, mas 4 simples e 1 avançado... uau hein? Ok, é apenas mais um euro trabalhando possíveis combinações de entrada de recurso e saída na forma de algo que pontua, mas pelos deuses… Vale dizer que o Dinosaur World é praticamente o Dino Island REALMENTE 2.0, ajeitando cada partezinha que foi apontada como errada e/ou incomoda, mas essa belezinha do "world" saiu em 2021 (versão BR 2023) e estamos falando do Island mesmo, em 2019.
-Não sei, só sei que foi assim…
Esse foi o ano em que andei de mãos dadas com a escalada de complexidade, ou, pelo menos, me enveredei na busca pelo "cada vez mais elaborado”. Até que as percepções de que mais informação e possibilidades não necessariamente resultam em “mais jogo”, A constatação de que existem vários humores e vontades diferentes a satisfazer numa sessão de boardgame, e de que muitas camadas podem ser vastas engrenagens de um interessantíssimo relógio, ou burocracia por dentro de burocracia. Precisa de um misto de movimento natural (porque você quer, porque te atrai) com um certo “esforço para se desafiar”, para que possa entender “Até onde vai a curva de aprendizado que modifica seu perfil de jogador, quando você se propõe e se apoia em um tema que gosta”?
A tendência é ser válido apenas enquanto o que prevalece não é o esforço pra ir nessa direção. Pode ser simplista, mas não é nem um pouco simplório lembrar que o importante é se divertir. Eu não teria curtido tanto o teotihuacan se não fosse pelo tema asteca (já explanado acima), bem como se não fosse pela complexidade um tanto quanto mais alta do que eu estava acostumado… Nem só um fator, nem só o outro, uma bela somatória de ambos!!! Para falar de forma sólida sobre o meu perfil de jogador, os 2 últimos jogos que eu brilhei os olhos conhecendo foram Animix(1,60) e Nucleum(4,09) com disparidade magnânima de complexidade entre eles. Este kina que vos fala pode afirmar que a lição aprendida em 2019, ficou escrita no meu código mais interno, no âmago mesmo. Sendo assim, pra mim sempre vai ser sobre o mosaico (não confudir com a editora hehe
) de entregas encontradas tanto nos jogos simples quanto nos complexos. Isso me faz refletir sobre nossas necessidades, que inclusive foram todas redesenhadas em 2020 devido a um grande evento pandêmico, todos sabemos do que estou falando, mas isso fica pra próxima recapitulada desses meus anos no hobby, sem esquecer das postagens normais, de análise.
Até a próxima caros(as) companheiros(as) de cavalaria! Inscrevam-se, acompanhem!