Começando pelo fim outra vez? Já falei mil vezes - o começo é aqui: https://ludopedia.com.br/topico/75984/diario-de-um-design-1-conexao-aguas-de-lindoia-japao
Toda vez que iniciamos um projeto, seja ele pessoal ou profissional, temos algumas metas ou, pelo menos, algumas expectativas mínimas. Calculamos minimamente onde queremos chegar, o que esperamos que aconteça, independente dos critérios mais subjetivos de 'sucesso' ou 'fracasso' - pois estas questões são muito mais relacionados à expectativa/realidade do que aos resultados efetivamente ditos.
Quando eu resolvi partir para a aventura da publicação independente do Cheez-Tricks, eu precisava de uma ideia de valor de produção a fim de precificar o jogo. Mas quantas cópias eu deveria considerar?
Bom.. o pessoal do grupo de carteado com certeza ia comprar. Já dava umas 40. Mais uns amigos aqui e ali, 60/70 eram praticamente certas.
Como eu estava vendendo nos exterior, eu imaginava que os crackudos lá de fora iriam querer, somados, umas 30-40 copias.
Que vendesse mais umas 50 para desconhecidos, mais umas cortesias..
Orcei duas possibilidades: realistas 200 cópias e otimistas 300 cópias.

Durante a campanha fui acompanhando os números com certo interesse e vi que meus cálculos estavam errados. Bem errados.
No primeiro dia de campanha, aqui no Brasil, foram 120 cópias vendidas. 120! Era o que eu imaginava praticamente para a campanha toda.. E eu tive que refazer minhas projeções.
Algumas vezes.
Sempre tive a proposta aqui de ser completamente transparente, a fim de incentivar (ou desincentivar, se for o caso) outras pessoas a pensar se efetivamente querem e estão prontas para seguir esse caminho independente. Então, segue o que aconteceu com o Cheez-Tricks durante a campanha:
- Criei esse diário aqui na Ludopedia, falando sobre o desenvolvimento do jogo.
- Participei de um podcast do Gambiarra no qual falei brevemente sobre o jogo.
- O jogo apareceu numa live do Covil dos Jogos sobre carteados em 2024.
- Participei de uma live do Primo Coelho e tive a oportunidade de jogar um microcampeonato no BGA ao vivo, com os seguidores.
- O jogo também foi citado pelo Magana e Gambiarra na live do pessoal da RobotGeeks
- Internacionalmente, o Ryan e o Patrick do podcast Trick Talkers (talvez o mais importante podcast de jogos de vaza) discorreram por mais de 20 minutos sobre o jogo (eu apresentei o jogo para o Ryan em um dia e, nesse mesmo dia, ele jogou mais 2 partidas com os pais no BGA, o que pra mim é sinal de sucesso absoluto).
Muitos amigos (do nicho e fora dele) compartilharam o financiamento coletivo nas redes sociais e divulgaram (MUITO) o jogo. (Não vou citar ninguém aqui para não ser injusto).
Mais de 1100 partidas foram jogadas no BGA por mais de 1300 jogadores diferentes.
Tudo muito bonito não? Mas isso refletiu de alguma forma em vendas?
Vamos aos números:
- 305 unidades vendidas no Brasil (para mais de 250 pessoas diferentes)
- 220 unidades vendidas no Exterior
- 20 unidades que serão cortesias
- um certo estoque pro pessoal que atrasou e vai querer comprar depois (inclusive na CovilCon terei unidades à venda).
No fim, serão produzidas 700 (!!!!) cópias do Cheez-Tricks. Um número 2,33333.. vezes maior do que minha expectativa mais otimista. Foi muito, muito melhor do que eu pensava (mas ainda um pouco abaixo da venda histórica da franquia Catan).
Uma hora eu chego lá.
Não consigo identificar, dentre as diversas ações feitas, se uma foi mais ou menos eficaz do que a outra. Cada qual teve sua contribuição - os amigos ajudaram, os podcastas/lives ajudaram. Mas tem uma galera imensa - especialmente a do exterior - que não tem a menor ideia de quem eu seja e comprou um jogo obscuro de um autor estreante pagando 3x mais caro do que custa um similar lançado localmente. E esse resultado, acredito eu, me mostra um fator principal dentre todos.
O jogo em si.
As pessoas podem, se qusierem, jogar o jogo no BGA e ter uma ideia de como ele funciona. Óbvio que nem todo mundo vai gostar. Óbvio que o jogo não serve para todo mundo. Mas para quem gosta de jogo de vaza, para quem aprecia o desafio de gerenciar um punhado de cartas na mão de forma mais eficaz posssível e, o que é mais importante, mais eficaz do que seus adversários, considerando riscos e possibilidades que mudam a cada rodada..
O jogo é bacana. De verdade.
Tem gente que vai achar essa afirmação arrogante, e eu entendo perfeitamente esse ponto de vista. Mas acredite - a afirmação é completamente objetiva, de quem já jogou mais de 200 jogo de vaza diferentes (e mais de 1500 se considerar qualquer tipo de jogo). Eu não acho que meu jogo seja nota 10, definitivamente não é o melhor jogo de vaza que eu joguei na vida, e nem chega perto do Tichu.
Sugiro muito. Melhor que Cheez-Tricks. Mas tenho certeza que tem espaço pros dois na coleção.
Mas é um jogo muito decente, que entrega o que promete. Um jogo dinâmico, que oferece estratégias diferentes a cada rodada, que exige do jogador adaptabilidade frente às variadas situações. Você às vezes joga para ganhar, e às vezes para que os outros percam. Ou simplesmente para minimizar os dados de uma mão obviamente ruim.
Diversas lições podem ser tiradas dessa história toda. Faça contatos, tenha amigos, acredite no BGA, busque soluções alternativas (quando o caminho mais 'reto' não funcionar). Mas acho que a principal, se algum dia você pretende publicar um jogo, é: seja honesto com ele. Se ele for bom de verdade, acredite. Se não tiver bom, trabalhe em cima. Refaça. Descarte. Não se apegue a uma ideia ou conceito se não funcionar.
E com liçãozinha digna dos desenhos animados do He-Man e de coachs picaretas, chegamos ao fim da história de um jogo. Para vocês que me apoiaram nessa iniciativa, de qualquer forma que tenha sido, fica meu MUITO obrigado, de verdade - essa história não teria sentido sem você.
Para você que acompanhou esse diário, não comprou o jogo e agora se arrependeu, vai ter uma sobrinha - mas obviamente não pelo mesmo preço do pessoal que pegou no financiamento. Eu tinha avisado que na mão de cambista ia ser mais caro...
Ei. Não vai embora ainda não. Como todo bom filme que já tem uma sequência aprovada e em produção, aqui também tem cena pós crédito.
Em breve teremos novidades sobre o Cheez-Tricks. Boas novidades. Incríveis e inesperadas. Mas que, infelizmente, eu ainda não posso divulgar. Mas quando acontecer, podem ter certeza que vocês serão os primeiros a saber.
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