Post Especial
Tema: Regras da Casa
Olá, amantes de jogos de tabuleiro!
Hoje é um dia de texto de assunto aleatório, não análise, como acontece às vezes. Penso nesses textos na tentativa de abraçar mais o hobby, não ficando preso só em falar de um ou outro jogo específico e o tema da vez, selecionado meticulosamente pelo critério de vozes na minha cabeça, foi Regras da Casa!
Nota: Não vou citar o jogo Uno nessa postagem, se não é apelação! haha
Para me ajudar a decorrer sobre este assunto e ajudar a consolidar minha opinião, tomei duas atitudes: a primeira foi fazer um questionário sobre o tema e dividir com a galera geral do hobby para ver qual o consenso no assunto; a segunda foi ir direto na fonte, perguntando para designers o que eles pensavam sobre o uso de regras da casa.
Antes de apresentar as respostas da galera e dos designers, porém, acho importante definir o que entendo por Regra da Casa.
O que É Regra da Casa
(segundo a minha definição e a que apresentei para quem respondeu o questionário)
A definição utilizada foi:
“Modificação não oficial ou autorizada de uma ou mais regras de determinado jogo, que visem algum tipo de melhoria na experiência do usuário, em qualquer nível.”
Em outras palavras, qualquer regra que os jogadores, por conta própria, decidam adicionar, excluir ou alterar e não esteja contida no manual ou foi autorizada pelo designer do jogo, consideramos Regra da Casa.
De acordo, galera? Show. Sendo assim, nós percebemos que...
O que NÃO É Regra da Casa
(segundo a minha definição, a que apresentei para quem respondeu o questionário e também alguns exemplos citados no próprio questionário por colaboradores)
O que podemos considerar como alteração na obra original, mas que não é uma Regra da Casa:
- A adição, modificação ou personalização de componentes (como marcadores e miniaturas) por questão estética;
- Má interpretação de regras, independente de quem seja a culpa, o leitor desatento ou o redator apressado (nesses casos é vacilo só mesmo).
- A criação de conteúdo extra (como missões em jogos de aventura, por exemplo) quando se esgotem as possibilidades apresentadas por um jogo. Este novo conteúdo, contudo, deve utilizar o sistema de regras original, sem modificações, caso contrário pode ser considerada Regra da Casa a alteração à mecânica original.
Até aqui, tudo certo? Maravilha.
Agora que estamos em harmonia com o termo, é importante colocar em pauta algumas reflexões sobre o uso das Regras da Casa, até mesmo para observarmos como ela está presente em muitas mesas de jogatina hobby a fora:
Pontos a serem considerados
Ponto #1: “Jogo QUEBRADO”

“Quebrado” é um termo forte. Já vi gente por aí usando ele de forma leviana, mas confesso que já joguei jogos que pareciam que realmente tinha algo ali que não deveria ser como é. Aos que não estão familiarizados com o termo, ele quer designar um jogo com alguma coisa que NÃO funciona, que por algum motivo suas engrenagens não rodam como deveriam. Para nossa conversa aqui, o que importa é salientar o extremo cuidado que se deve ter ao usar o termo “Quebrado” (ou qualquer outro de similar significado), uma vez que, de fato, um jogo quebrado não veria mesa até mesmo pelo fato de que editora nenhuma o colocaria nas prateleiras das lojas. Temos que observar se não estamos diante do caso de má interpretação de regras ou então, infelizmente, na presença de um jogo que na nossa opinião é ruim mesmo.
Um exemplo prático disso, usando minha bússola de gosto como exemplo, é Munchkin (Jackson. 2001), um jogo famoso e cheio de fãs pelo mundo, mas que para mim a existência de mecânicas que abrem a possibilidade do jogo se tornar longuiiiisiiiimoooo me passa uma forte sensação de “esse jogo não está funcionando como acho que deveria”. A culpa disso é de quem? Pode ser minha, pode ser do jogo, não importa. O que importa é que, se tem gente que gosta dele como é e não vê problemas com 5 horas repetitivas abrindo cartinha, matando monstro e zoando o amiguinho, ele não é quebrado, só não é um jogo adequado para o meu gosto. Por outro lado, já joguei protótipos que realmente estavam (ainda) quebrados, com combos e ações que se anulavam ou simplesmente não faziam sentido estarem ali. Isso acontece e é normal durante o processo de criação mesmo.
Observação: O Sr. Stegmeier, designer de jogos como Tapestry, adora lançar jogos com cara de “testaram essa parada o suficiente mesmo?”, em casos como esse não acho ruim quando alguém manda um “Issaqui tá meio bugado”!
Ponto #2: “Quando o manual não diz (ou diz na brincadeira)”

Esse ponto é importante, pois existem dois tipos de pessoas: aquelas que mediante a ausência de informação diz que “se o designer ignorou, então tudo posso”; e as que dizem o oposto “se não tá escrito, então não pode”. Aqui vemos um meio termo dentro do uso de Regras da Casa, pois nem sempre o designer emite uma opinião ao público, ficando a cargo dos jogadores lerem o fluxo da partida e tomarem a decisão por conta própria do que faz mais sentido.
Na minha opinião neste ponto, diferente lá do ponto sobre má interpretação de regras, a culpa é integral do designer, redator e/ou galerinha da produção. É papel desse povo cobrir todos pontos da obra antes de oloca-la no mercado. Sei que é difícil, mas se deem um jeito!
Ainda nisso, existem também os designers fanfarrões que assumem não ter uma solução satisfatória e usam do bom humor para lançar um “não tem solução”, o que não acho ruim, afinal fica registrado de alguma forma que ele pensou naquele ponto em questão. Esse tipo de coisa geralmente é mais presente no momento de escolher o jogador inicial ou critérios de desempate, na maioria das vezes com algo bem humorado relacionando ao tema. Um exemplo prático disso está no jogo Arboretum (Cassar. 2015), que é um jogo fantástico, relativamente simples de regras, mas muito cabeça, no qual o segundo critério de desempate ao final da partida é simplesmente mandar que os empatados plantem uma árvore e depois de cinco anos comparem qual ficou mais alta ...e só aí, quem tiver a mais alta, foi o vencedor daquela partida meia década atrás. Simplão, né?
Ponto #3: “Conhecimento e gosto são coisas diferentes”

Eu amo os jogos do Stefan Feld, mas tem um jogo em particular que eu teria feito uma única coisa diferente. Isso torna o jogo ruim? Não. O que eu mudaria seria para adaptar ao meu gosto? Sim. Isso mudaria um pouco o sentimento do jogo na mesa? Sim também. Eu manjo mais que Feld em gamedesign para querer dar tal pitaco? JAMAIS (em caixa alta, pois apesar de conhecer meu potencial, não sou maluco!).
O que quero ilustrar com o exemplo acima, se não ficou claro, é que por mais que eu tenha conhecimento técnico em determinada área, nunca vou conseguir saber exatamente o que se passava na mente do criador quando ele criou a obra, com todo o universo que o rodeia e o que ele queria que nós sentíssemos, portanto, o que eu gosto não precisa necessariamente coincidir com o que o autor me apresentou. No parágrafo acima, por exemplo, eu falo do jogo Jórvik (Feld. 2016), no qual os jogadores participam de leilões de cartas que não possuem um valor fixo, sendo o custo relacionado com a quantidade de meeples que a galera na mesa usa para tentar adquirir a carta. Originalmente o dinheiro dos jogadores, que é bem apertado, fica visível para todos na mesa, o que pode gerar uma leitura bem pontual de quando dar um bloqueio intencional em alguém e, no meu gosto e na minha mesa, jogo com essa grana escondida, ou seja, jogadores não revelam para os demais quanto eles possuem em caixa, de tal forma que o jogo fica menos agressivo e ainda adiciona um elemento de memória. Eu entendo o que Feld fez e o motivo, mas como o jogo no geral é bom, eu não abro mão dele por uma questão que posso facilmente adaptar para minha realidade e gosto.
O importa deste ponto é, reforçando, eu não me achar mais conhecedor de Jórvik do que o próprio criador, Sr. Feld, e, acima de tudo, respeitar suas escolhas para a obra, por mais que eu venha a não querer jogar mais o jogo ou até alterar alguma coisa para o meu gosto.
Momento desabafo: Já vi muita gente com nenhuma experiência em gamedesign, artes gráficas e afins, sequer com mais de algumas semanas de hobby, querer dar pitaco em jogo famoso. Ai não dá, galera.
Ponto #4: “Em algum nível, a maioria de nós usa ou já usou Regras da Casa de alguma forma”
“Quem começa?” é uma questão comum nas mesas tabuleirísticas. O primeiro jogador é o que venceu a última partida? O que ficou na pior colocação na última partida? O mais novo? O mais velho? O dono do jogo? A visita? Usamos um aplicativo de sorteio? Vai na base do dois-ou-um?
Este é um exemplo simples de como não seguimos exatamente as regras, afinal, nem todas regras precisam ser meticulosamente seguidas, pois elas não impactam a experiência geral do jogo. Coisas como ‘o primeiro jogador’, ‘escolher ou sortear personagem/facção’, dar um ‘control Z’, voltando e refazendo uma jogada antes que o próximo jogador tenha jogado, em jogos cooperativos ‘dar uma facilitada e voltar um vacilozinho’, são exemplos de regras que são instauradas pelos jogadores na mesa, quase hábitos característicos de cada grupo, mas que não deixam de esbarrar de alguma forma nas regras originais do jogo, de tal forma que entender que não se pode ser tão rígido com as coisas é algo necessário para a boa convivência. Enfim, uma pergunta aos mais puristas em regrologia (inventei o termo agora): vocês vão me dizer que sempre obedecem a forma de seleção de primeiro jogador como o manual manda?
Ponto #5: “O exercício de fazer regras da casa PODE ajudar a comunidade”

Designers não são impecáveis. Por mais que usem de técnicas aprimoradas, documentações sistemáticas e tenham levado seu jogo para incontáveis partidas de testes, ainda assim alguma coisa pode ter escapado de sua panorâmica visão progenitora. Não existe teste de fogo melhor do que toda comunidade, mundo a fora, colocando o jogo na mesa. Nesse momento muita coisa pode acontecer, seja por uma questão sociocultural dos jogadores de diferentes lugares do mundo como o simples fato de agora terem dezenas de centenas de pessoas críticas entrando em contato com aquele jogo, logo, o olhar crítico da comunidade é capaz de fazer o próprio designer rever alguma coisa e até se manifestar com alterações que se tornam oficiais, tudo graças aquela pessoinha que criou, em algum momento, uma regra devido a um estranhamento das regras originais ou simplesmente teve uma sacada criativa, além de ser um bom exercício de design observar o jogo do ponto deste ponto de vista criativo.
Um exemplo real (gosto de trabalhar com exemplos, já perceberam, ne?) aconteceu com o jogo Oh My Goods! (Pfister. 2015), o qual originalmente são utilizadas as próprias cartas como recurso, escolha feita pelo designer pelo fato de o jogo ter sido fruto de um concurso de design que poderiam ser utilizadas apenas cartas, mas que após o lançamento oficial do jogo, jogadores perceberam que utilizar marcadores (cubos, discos, feijões, o que a criatividade e acessibilidade permite) no lugar de cartas deixava o jogo mais fluído, por não travar cartas e impossibilitar combos. Quando o autor foi indagado sobre isso, no portal BGG (Boardgame Geek), ele mesmo falou: “Pode”. Dessa forma, não se tornou uma regra oficial, por não ser inclusa em manuais de novas edições, contudo a galera passou a adotar a regra de forma mais segura, afinal, quem mais manja do jogo permitiu.

(olha o depoimento do Sr. Pfister, dado no BGG)
Pílula de curiosidade: A imagem no fundo das cartas de Oh My Goods! não é um barril, mas um caixote cúbico em ângulo de 45º. Viva com essa informação agora.
Resultados das Pesquisas
Pesquisa com Jogadores
Depois do (quase) ensaio sobre Regras da Casa, vamos (finalmente) ver o que a galera pensa a respeito, lembrando que a resposta dissertativa me ajudou a desenvolver todo o texto acima, os prós e os contras.
Foram 71 (setenta e um) respostas válidas enviadas. Muito obrigado a cada um de vocês, povo lindo.

(obs: nos comentários coloquei as imagens em tamanho maior)
Como podemos observar nos gráficos, a maioria das pessoas (aproximadamente 76,5%) já utilizou alguma regra da casa, seja criado por si próprio ou que encontrou pela comunidade, demonstrando que o uso é relativamente comum entre a galera do hobby.
A parcela que alega não ter gostado de todas experiências que teve representa apenas 14,1% da amostra, o que se aproxima dos 18,3% das pessoas questionadas que afirmam serem contra o uso de Regras da Casa. Acessando os dados individuais de resposta e criando um comparativo das pessoas que compõe o grupo que não gostaram das experiências (14,1%) com as que são contra (18,3%), percebi que quase 80% das pessoas que responderam serem contra regras da casa não tiveram boas experiências com elas, o que me leva a refletir se é uma questão de perspectiva do ponto de vista de diversão ou algo relacionado à pureza das regras mesmo.
Dentre as respostas qualitativas, selecionei algumas que sintetizam a ideia geral de cada lado opositor neste conflito:
Defendendo a liberdade de mexer na regra dos outros, temos:
“Se precisar seguir uma regra, que vc(s) tenha(m) dificuldade, e acabe por frustrar a experiência, então adapte a regra, desde que não comprometa a mecânica. “
“O que vale é a diversão!”
“Considero válida a criação de regras da casa, se for de acordo de todos e para fazer com que o jogo ocorra de forma agradável para os jogadores”
Aquela galera um pouco mais em cima do muro disse:
“Acho importante é que os participantes saibam quais são as regras da casa e quais as regras oficiais de um jogo. Se você for ensinar para alguém de fora do seu grupo eu acho que isso sempre tem que estar claro e que todos os participantes tem que concordar em jogar uma versão não padronizada.”
“Com uma ou duas partidas não dá para dar um veredito se uma regra da casa ajuda porque não há experiência suficiente no jogo”
“Não podemos generalizar. Cada regra deve ser analisada caso a caso.”
“Sou a favor quando este tipo de regra é aprovada pelo autor do jogo. Caso contrário eu não utilizo.“
E, por fim, os puristas, que gostam das coisas como são:
“Não concordo em alteração de regras principais do jogo ou qualquer outra regra que modifique a experiência prevista”
“Regras da casa devem ser evitadas ao máximo, mas ao mesmo tempo servem de termômetro para medir o quão bem aceito um jogo está sendo pela comunidade.“
“Penso que num mercado que jorra milhares de jogos novos ao ano, precisar usar House Rules para melhorar a experiencia ou corrigir alguma falha de um jogo se torna um exercício muito chato no qual prefiro simplesmente ir jogar outra coisa.”
“Sempre que eu joguei uma versão modificada do jogo a experiência ficou pior!”
“Quem desejar criar regras, melhor criar seu próprio jogo, e deixar as regras dos outros em paz.”
Meus colegas, treta pesada! Não à toa o uso de Regras da Casa é um dos tabus do hobby. Como eu esperava, a galera ficou dividida, por mais que numericamente o lado a favor prevaleça, os argumentos do lado contra são lúcidos e possuem uma lógica, então para complementar temos as respostas de designers. Vamos ver o que eles disseram:
Pesquisa com Designers
Aos designers que colaboraram, muitíssimo obrigado! Acho engrandecer ao hobby serem acessíveis e estarem dispostos a dar a cara a tapa, aproximando cada vez mais os agentes dentro da comunidade e ajudando a desmistificar tabus que nos assombram.
As perguntas que fiz para os designers foram as mesmas, sendo elas:
1. Você é a favor ou contra do uso de regras da casa? Caso seja a favor, já usou antes? Comente.
2. O que você pensa sobre pessoas adotarem regras da casa em jogos de sua autoria? Comente.
As respostas foram:
Sergio Halaban
Designer de “Quartz”, “Sheriff of Nottingham”, “War Batalhas Mitológicas”, entre muitos outros
1. Sou a favor do uso de regras da casa. Inclusive já usei algumas vezes. Lembro que no meu grupo de jogos, na época em que nos viciamos no Tzolkin, depois de muitas partidas concluímos que uma das tracks era uma estratégia dominate. Então discutimos algumas possibilidades de ajuste e escolhemos uma que nos permitiu continuar aproveitando o jogo por mais algum tempo.
2. Não vejo nenhum problema se os jogadores alterarem ou adicionarem regras aos meus jogos. O importante é que fique bom para eles. Que se divirtam. Lembro que minha sobrinha veio tirar uma dúvida sobre o Quartz. Pela dúvida eu percebi que estavam jogando errado. Expliquei para ele como o jogo era de fato. Ao final da explicação ela me disse que entendeu mas preferia continuar jogando daquele jeito mesmo, rsrs. Se ela se diverte mais assim, porque não?!
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Marcos Macri
Designer de “Dogs”, “Jester”, “Xingu”, “Chaparral”, entre muitos outros
1. Bem, perguntar a um designer profissional de jogos, se ele é a favor de que o público modifique as regras que ele criou, desenvolveu com esforço e validou com muitos jogadores em dezenas de sessões de playtest, durante um longo processo de trabalho, que pode se estender de meses a alguns anos, seria como perguntar a um ambientalista se ele é a favor do desmatamento indiscriminado da Amazônia. E sobre ter usado, cheguei a ter cerca de 200 títulos de jogos modernos em minha coleção no final de 2018. Joguei todos eles, mas nunca utilizei regras da casa. Os títulos que não me agradaram, passei adiante, ou troquei por outros jogos.
2. É um direito delas. A partir do momento que os jogos são impressos, publicados e distribuídos, a editora e o autor não possuem mais nenhum controle sobre eles. Ou seja, quem compra um jogo moderno e põe na mesa, depois de jogar a primeira vez, pode: amar, odiar, avaliar de forma positiva, negativa, modificar regras, criar outras, colocar o jogo no top 10, vender, trocar, enfim... o jogo de mesa, de certa forma, é uma obra aberta, porque ao contrário de outras obras, com os jogos as pessoas interagem, e ao interagirem, elas obtêm experiências e resultados diferentes.
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Diego de Moraes
Designer de “Os Incríveis Parques de Miss Liz”, “Cosmos”, entre outros que atuou como editor e desenvolvedor
1. Sou a favor. Jogos são feitos para divertir. Se uma ou outra regra impedem ou diminuem essa diversão para o seu grupo, mude-a. Eu uso algumas regras da casa com o meu grupo. Por exemplo, no Ilha dos Dinossauros, a cada rodada eu descarto todos os dinossauros do mercado e abro novos. Na regra original não deveria descartar, mantendo o mesmo dinossauro disponível para compra por muito tempo, mas meu grupo prefere o dinamismo e a urgência que o descarte traz.
2. Podem mudar à vontade. A partir do momento que o jogo saiu deixou de ser uma exclusividade da minha caixinha de protótipos e foi para a casa dos jogadores em sua versão final, este jogo não é mais meu, mas sim de cada pessoa que o comprou. Quem manda nas regras agora são os novos donos e seus grupos. Já vi mudanças pequenas como remover uma ou outra carta que não agradam os jogadores, como também já vi jogarem o Cosmos sem nenhuma regra para incluir crianças pequenas, tornando-o um brinquedo de mover pecinha de um lado para o outro. Tudo é válido. Apenas divirtam-se.
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Fábio Arraes
Designer de “Os Desejos do Sultão”, “Zurvivors” e “Alieninjas”
1. Não digo que sou contra, apenas que não gosto e não uso. Gosto de seguir nos mínimos detalhes o que o autor propôs para mim.
2. Acredito que o objetivo de um jogo é acima de tudo divertir. Então, se mexer em alguma regra vai divertir mais um determinado grupo, acho válido. Porém, se isso acarretar em praticamente criar um novo jogo, acho mais simples entender que aquele jogo não é pra você e tentar outro.
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Fernando A. C. Prado
Designer de “Vossa Excelência: O jogo Político”
1. Sou a favor do uso de regras da casa, desde que estejam bem claras e aceitas por todos os participantes. Game designers não são deuses nem seus jogos são obras sagradas, perfeitas. Regras da casa podem melhorar muito a experiência de jogo, corrigindo algumas falhas de design (elas existem!) ou mesmo adaptando o jogo ao gosto dos jogadores.
2. Para quem faz isso só posso dizer: "o jogo é seu, faça o que achar melhor com ele!" Agora, fico curioso. Gostaria que esse jogador me enviasse uma mensagem explicando as regras que mudou (quem sabe isso não é revisado em versões futuras do produto?).
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Moises Pacheco
Designer de “Overdrive”, “Grasse: Mestres Perfumistas” e “Hokusai”
1. Totalmente a favor, não consigo imaginar o motivo de alguém levantar bandeira contra. Se o jogo é seu, você tem todo o direito de fazer o que quiser com ele. Uma regra que não funcione direito para você ou para seu grupo acredito ser passível de uma sugestão que se encaixe melhor. Eu mesmo uso regras da casa para alguns jogos, no Orléans por exemplo eu abro 5 tiles de construções de nível 1 e 5 de nível 2. Quando um jogador compra uma peça ela é reposta na hora. Não gosto da regra original que você pode comprar qualquer tile, acho que ela gera muito downtime e caminhos pré-definidos de vitória. Claro que já teve regras da casa que fiz para alguns jogos que eu não tinha entendido a proposta do designer, e acabei notando que virava outro jogo (normalmente pior). Se pararmos para pensar em jogos clássicos de baralho, por exemplo, é até difícil de saber qual a regra oficial, essa coisa de que as regras não podem ser modificadas (caso sejam um problema) é uma preocupação que assola muito mais os jogadores dos jogos dito modernos.
2. Eu acho interessantíssimo, e até gosto quando as pessoas criam e comentam comigo. Muitas vezes as regras da casa até ajudam numa eventual revisão de um jogo, se forem melhores que as originais por que não utilizar?
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Bianca Melina
Designer de “Overdrive”, “Grasse: Mestres Perfumistas” e “Hokusai”
1. Sou a favor sempre de ter experiências divertidas. Se para isso os jogadores entenderem que precisam adaptar alguma regra, não vejo problema algum. Já usei regras da casa sim.
2. Quando crio um jogo, meu objetivo é levar diversão para as pessoas. Se criando alguma regra da casa elas tiverem uma experiência melhor, que assim seja. Jogos não são perfeitos, e às vezes os autores têm que tomar algumas decisões inserindo regras para minimizar ou eliminar outros problemas que seriam ocasionados pela falta de determinada regra, porém, somos conscientes de que nem sempre as regras são palatáveis, por isso um jogador ou outro pode não se sentir confortável com algum aspecto e querer criar sua própria regra. Embora os jogos sejam testados exaustivamente para funcionarem bem, nem sempre o funcional é o caminho mais divertido, então não vejo problema em adaptações.
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Samanta Geraldini
Designer de “Cartas a Vapor”, “Café Express” e “New Eden Project”
1. Sou a favor. Adaptar regras é natural pra adaptar também a experiência de jogo. Por mais que o designer desenhe uma determinada experiência, tanto o jogo pode ter alguma regra que não funcione muito bem, quanto o próprio grupo de jogadores se sinta mais interessado em jogar de um jeito b em vez do jeito a. Já mudei regras de vários jogos e várias vezes
2. Acho que tudo bem adotarem regras. Isso significa que as pessoas não estão totalmente satisfeitas com alguma regra que defini, mas que o jogo permite essa mudança sem ser descartado. Essa possibilidade de alteração (tipo um mod de um jogo digital) dá mais vida ao jogo e em nenhum momento significa que ele "é ruim". Uma coisa que eu gostaria é de saber quais são essas regras, pois isso diz muito como posso melhorar em jogos futuros, criando experiências mais próximas do que os jogadores estão buscando.
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Emivaldo ‘Zinho’ Souza
Designer de “Meeple Heist”
1. Sou a favor. Uso sempre. Um exemplo bom é o Zombicide, que é um jogo que curto muito a produção, mas que sempre tem uma regrinha ou outra que não funciona. Algumas das regras da casa mais utilizadas foram inclusive incorporadas ao jogo com o tempo (como a de que tiros à distância primeiro acertam os zumbis – e não os sobreviventes)
2. Acho ótimo e não vejo problema algum. Claro, se quem adotou a regra não tem muita experiência com o jogo (ou em mudar regras), pode alterar a experiência e talvez “estragar” o jogo pra quem está conhecendo. Mas é um risco pequeno. O importante é a pessoa se divertir. Muitas vezes no design, uma regra não é vital para o andamento do jogo, ela apenas molda o jogo – encurta o tempo, deixa mais fácil, mais difícil, com mais sorte, menos sorte. São decisões que o designer toma pra moldar o jogo, mas que não são estruturais. Se a pessoa preferir uma experiência mais fácil, por exemplo, por que não mudar?
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Fel Barros
Designer de “Space Cantina”, “Encantados”, “Dobro”, “God of War Card Game”, entre muitos outros
1. Eu sou super a favor. Depois do jogo criado, cabe a cada um achar o que é melhor para sua própria experiência. Só recomendo familiaridade com o jogo antes de fazer isso.
2. Acho maior barato. Desde que não seja xingando /falando que foi quebrado /sendo desrespeitoso comigo, dou o maior apoio.
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Luis Brueh
Designer de “Dwar7s”, “Night Parade”, “Keep the Heroes Out”, entre muitos outros
1. Sou a favor, desde que todos estejam avisados desde o início e que estejam de acordo. É importante notar que regras da casa podem estragar ou desbalancear um jogo, haja vista que se criam situações que não estavam previstas nas regras originais. Uso/crio regras da casa com certa frequência, em geral pra tornar alguns jogos mais curtos, ou acelerar o início.
2. Acho justo. Muita gente cria regras da casa para jogar meus jogos com os filhos, ou crianças. Em geral sempre que postam algo sobre isso no BGG eu ajudo as pessoas a recalibrar o jogo com a regra da casa mantendo o equilíbrio.
Essas foram as respostas dos designers que consegui contatar e me responderam a tempo de publicar o texto. Galera de peso do cenário nacional! Novamente, obrigado por terem disponibilizado um tempinho para me responder.
Como vimos, não existe um consenso único sobre o uso sequer entre a designeraiada, contudo, no geral, a diversão sendo o foco e a galera tendo conhecimento de onde está mexendo, tudo é válido!
Para finalizar o texto, vou dar minha opinião (que ninguém pediu), apesar que acredito ter ficado claro ao longo da postagem qual lado eu defendo, mas para quem tem dúvidas, lá vai:
- Sou completamente a favor. Eu mesmo tenho minhas regrinhas caseiras e diversos arquivos de tradução de coisa gringa postados internet a fora. Contudo, sou a favor contanto que a pessoa que fez a regra da casa obedeça a dois critérios: 1. Que ao jogar com a alteração deixe claro para os outros jogadores o que foi modificado e o motivo da modificação; 2. Que essa pessoa que criou a regra estude! Que leia, pesquise, reflita e teste. Se você quer fazer algo, faça o mais bem feito a seu alcance possível.
É isso, galera. Este foi o texto da vez! Sei que foi longo (me deu um baita trabalhão, foi sem dúvidas o que mais investi tempo), então agradeço a quem chegou até aqui. Espero que tenha ficado claro que isso tudo foi uma grande homenagem à estes brinquedos de gente grande, à atividade de criação de jogos e também aos designers, povo que se desdobra por um jogo pra gente ir lá e dar pitaco.
Não levem as coisas a ferro e fogo, até pelo fato de a pesquisa ser com uma amostra pequenininha, servindo mais como uma exposição bem humorada do tema do que qualquer outra coisa.
Abraços digitais!
Um texto de
Raphael Gurian
Sociedade dos Boards
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