(Análise) Above and Below
Título: Above and Below (2015)
Designer: Ryan Laukat
Arte: Ryan Laukat
Editora nacional: Conclave Editora
Nº de jogadores: 2 a 4
Todos jogos contam histórias, alguns colocam nessa narrativa boa parte do seu diferencial. Above and Below é um exemplo perfeito de um jogo que incorpora narrativa à mecânicas clássicas de gestão de recursos e alocação de trabalhadores.
Resumo de Como o Jogo Funciona
Em Above and Below os jogadores controlam aldeões que estão montando seu vilarejo do zero, tanto na superfície quando abaixo da terra. No turno do jogador ele irá escolher uma ação entre cinco disponíveis: Explorar (outro jogador irá ler um trecho de um livro de encontro e o jogador irá fazer escolhas e rolar os dados para ver se teve sucesso); Construir (o jogador paga moedas para comprar cartas disponíveis e trazer para sua área de jogo); Coletar (o jogador irá recolher itens disponíveis de cartas em sua área de jogo); Treinar (o jogador irá pagar e receber novos trabalhadores) ou Trabalhar (o jogador receberá moedas). Juntamente à ação escolhida, o jogador irá determinar quais de seus trabalhadores irão realizar a tarefa e, por fim, realiza-la. Quando os jogadores quiserem, ou não tiverem mais trabalhadores disponíveis, a rodada se encerra. Após um número pré-estipulado de rodadas a partida se encerra e são contabilizados os pontos. Quem tiver mais pontos, vence.
Mecânicas Principais: Alocação de Trabalhadores, Coleção de Componentes, Narração, Rolagem de Dados.
Critérios
Ø Qualidade dos Componentes
PRÓS: Todos componentes são de boa qualidade, com fichas, cartas e tabuleiro de ótima gramatura. O manual é cheio de ilustrações e bem escrito, feito com papel de boa qualidade; O livro de Encontros, apesar de ser preto e branco, é feito com um papel de boa qualidade e o fato de ser em espiral, não brochura, acaba sendo bem útil, facilitando o manuseio; Dados de boa qualidade.
CONTRAS: São muitos componentes diferentes e a caixa vem apenas com aquele papelão sem graça branco dentro, exigindo muitos saquinhos (ziplocks) ou organizadores, caso contrário, a preparação pode ser um tanto demorada.
(Todos componentes – O organizador plástico não é incluso)
Ø Arte
PRÓS: Antes de mais nada vale a pena reforçar que o artista é o próprio criador do jogo, e foi muito feliz em ambos aspectos. A arte cria uma identidade visual própria para o jogo, conseguindo criar um universo único e rico; Além da parte visual, com iconografias de fácil entendimento e uma boa imersão no mundo criado, existem os trechos de encontros que servem como uma forma de apresentar ainda mais o universo do jogo, além de seu uso mecânico durante a partida.
CONTRAS: Apesar da boa ilustração em todos elementos do jogo, as fichas de recursos poderiam ter o fundo de cada tipo de recurso de uma cor diferente, assim seria mais fácil de ver e separar as fichinhas (que são muitas) entre si.
(cartas em detalhe)
Ø Curva de Aprendizagem
Baixa. As regras são bem fáceis de se assimilar, com um ou outro detalhe que pode vir a ser esquecido, mas nada que prejudique o desenrolar da partida. Além disso, o próprio tabuleiro principal e o tabuleiro individual contam com lembretes da raridade dos recursos e ações possíveis. Estrategicamente o jogo também não requer nenhum tipo de mirabolância malabarística expert também, sendo bem direto no que as ações fazem e quais caminhos os jogadores conseguem traçar ao longo da partida.
Ø Presença de Tema
Alta. Diria até Muito Alta. Se tem uma coisa que Ryan Laukat conseguiu fazer com muito sucesso (além do visual) foi a quantidade de tema entregue durante a partida. Temos uma página inteira dedicada do manual para contar o enredo central, com estilo história em quadrinhos, e depois sentimos que cada escolha do jogador é como completar um pedacinho da história pessoal daquela vila que ele controla. Além disso, obviamente, temos o Livro de Encontros, que não apenas mostra um pedacinho do universo do jogo, mas deixa o jogador fazer escolhas que levam a diferentes desfechos, mesmo que breves, desses encontros.
(Área individual do jogador)
Ø Rejogabilidade
Média. Antes de jogar Above and Below, apenas lendo sobre o jogo e a ideia do Livro de Encontros, fiquei com sincero receio do jogo ter uma Rejogabilidade Baixa devido ao fato de eventos se repetirem com certa frequência, porém eu estava bem enganado (ainda bem). Existem exatos 150 encontros ‘iniciais’ disponíveis nas Cartas de Cavernas e um número bem superior no livro, uma vez que alguns encontros levam para novos trechos. Além desse número de encontros, a forma com que eles surgem é bem aleatória e criativa: Cada Carta de Caverna possui 6 possíveis encontros e no momento que o jogador pega a carta rola um dado e o valor do dado é o encontro, logo, pegar uma mesma carta de uma partida para outra ainda terá o elemento de aleatoriedade do dado para definir qual encontro (e nada impede de pegar um diferente caso tenha realmente decorado um específico). Some a isso o fato do jogo ser relativamente curto (7 rodadas) e não terá como usufruir do Livro de Encontros todo antes de muitas partidas. Além disso, os encontros são apenas parte do jogo (apesar de ser a mais divertida), temos ainda diversas cartas em diferentes montes com finalidades diferentes e pontuações diferentes e uma gama de diferentes trabalhadores com diferentes habilidades (por mais que sejam bem parecidos) que sozinhos já trazem elementos táticos que criam Rejogabilidade de uma partida para outra, independentemente dos encontros.
Ø Interação
Baixa. Existem poucos bloqueios entre os jogadores, salvo nas compras das cartas e por mais que o jogo tente colocar uma espécie de ação extra livre de comércio, ela não faz muito sentido ser explorada, pois claramente pode levar mais vantagens do que desvantagens para rivais. Onde podemos sentir uma interação na galera na mesa é no momento de alguém ler os encontros, porém isso é bem relativo, podendo ser um porre para uma mesa onde a galera não entrou na onda do jogo ou muito divertido, com galera fazendo vozes e se engajando na narrativa. Algo que realmente senti falta foi alguma espécie de interação maior entre os jogadores, pois parece que cada um está criando seu vilarejo em uma parte do mundo do jogo (Opinião Pessoal: Seria bem legal ver a galera se esbarrando pelas cavernas ou fazendo um comércio, mesmo que forçado, por questão financeira).

(Livro de histórias [sem spoilers!])
Ø Fator Sorte
Relevância na partida: Média. Above and Below, pessoalmente, achei bem gostoso de se jogar, dinâmico e divertido, porém ele não é aquele tipo de jogo onde experts irão conseguir traçar muitos planos sem que se frustrem em rolagens de dados. Temos rolagens como determinísticas em Encontros e com poucas formas de mitigar a sorte ou rerolar dados, além dos próprios Encontros narrativamente não deixar muito evidente quais riscos e recompensas para os jogadores. Contudo, ainda é possível traçar estratégias um tanto vitoriosas com base na compra de cartas e tentando jogar de forma mais segura, basta um pouquinho de sorte no que receber nos Encontros.
Ø Fator Estratégia
Relevância na partida: Média. Como dito anteriormente, o jogo tem seus altos e baixos. O Fator Estratégia está bem no meio do caminho. Por um lado, temos o impacto da sorte nos Encontros, por outro existe a possibilidade de comprar cartas abertas, logo – sabendo o que se está fazendo e para onde se quer levar o caminho estratégico. O jogo peca em alguns aspectos Estratégicos, porém, que não posso deixar de mencionar: O jogo é curto, então não dá muito tempo para se readaptar durante a partida; Os Encontros fornecem recursos de forma aparentemente meio aleatória, sem que a dificuldade da rolagem de dados realmente seja perceptível; Os Encontros, apesar de bem escritos, tendem a ter desfechos abruptos, recompensas simples e sem graça e que depois de acontecerem não tem nenhuma real influência no resto da partida, com raras exceções. Em geral, Above and Below é um jogo divertido e criativo, mas não espere uma experiência muito profunda (trocadilho não intencional).
(Área central do jogo)
Ø BÔNUS: Algumas dúvidas corriqueiras:
- Dá para jogar com crianças? Sim, se elas souberem ler. Inclusive, acredito que Above and Below seja um ótimo jogo de entrada com esse apelo narrativo, um diferencial para jovens e crianças.
- Funciona bem em qualquer número de jogadores? Funciona, pois mecanicamente não muda quase nada (salvo na preparação). O tempo ocioso de espera (do inglês ‘downtime’) é bem curto e durante as narrações dos encontros a tendência é a galera prestar atenção devido a curiosidade. Quase daria para jogar inclusive solo (1 jogador), faltou só algum tipo de recurso, como um app, para que as leituras dos Encontros não revelassem para quem está lendo as recompensas e penalidades.
- Então Above and Below é um jogo de entrada? Posso dizer que sim. Ele não apresenta elementos muito complexos, tem um visual atrativo, um tema bem presente e uma arte cativante, além de ser um jogo bem acessível para quem está começando a jogar.
Opinião Pessoal
“Above and Below vai além de ser um jogo leve de alocação de trabalhadores (apesar de não ter uma alocação no sentido mais clássico da palavra) e coleção de componentes. Ele é aquele tipo de jogo que entrega uma experiência social através de sua mecânica narrativa presente. Apesar de não ser um jogo perfeito em todos aspectos possíveis, ele cumpre bem todas coisas que se propõe a fazer e de forma bem honesta e direta. Para quem está começando e que um jogo onde a narrativa esteja presente e não curte jogos longos ou temas de terror, como zumbis (Dead of Winter: Um Jogo de Encruzilhadas (Gilmour, Vega. 2014)) ou baseados em obras de H. P. Lovecraft (como Eldritch Horror (Konieczka, Valens. 2013)) e buscam mecânicas que a narrativa coloque o jogador em uma posição de fazer escolhas, Above and Below é uma ótima escolha.” (Raphael Gurian, O minerador de capacete amarelo)
“Above and Below é um ótimo jogo competitivo, para jogadores que curtem o estilo narrativo que poucos boardgames apresentam, os transportando para uma história na qual se fazem escolhas com base nos personagens reunidos para desbravar uma aventura, arriscando a sorte para obter o melhor resultado nos dados, conforme a ação escolhida. Além disto, o jogador deve administrar seus recursos para comprar novas construções e obter recompensas e pontos, levando-o à vitória. Sua arte, apesar de caricata e muito bem feita, não transmite totalmente a ideia divertida que é passada nas histórias das missões. Ainda assim, é uma excelente escolha para jogar a dois, deixando as partidas mais dinâmicas e menos demoradas.” (Heloisa Fernandes, @lola_Fernandes, A exploradora de mochila vermelha)
Um texto de
Raphael Gurian
A ideia deste formato de análise não é explicar um jogo, para isso existem muitos outros textos, vídeos e etc. A finalidade do texto é fazer uma análise crítica acerca de critérios que acho importante e que muitas vezes acabam não sendo explorados em análises de uma forma mais detalhada. Os jogos analisados não seguem qualquer critério comercial, incentivo ou pagamento, sendo escolhidos com base em fontes de vozes da minha cabeça, aliado ao fato de ter já jogado o jogo em questão muitas vezes, a ponto de me sentir confortável em opinar sobre o mesmo.
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