Por: Linauro. Apaixonado por literatura, música e jogos, desde sempre. Descobriu nos jogos de tabuleiro uma desculpa perfeita para passar mais tempo com amigos e pessoas amadas.
Após o fim da 2ª Guerra Mundial, que nos legara uma hecatombe de cerca de 80 milhões de pessoas, quando uma aliança improvável entre URSS e EUA derrotaram os nazifascistas no ano de 1945, o mundo mergulhou imediatamente num novo conflito de escala mundial, a Guerra Fria, que perdurou por décadas, polarizando o globo até a queda da URSS, em 1991. Segundo o célebre historiador inglês Eric Hobsbawm, um tempo peculiar da situação internacional em que as duas potências nucleares se envolveram em três grandes guerras (Coreia, Vietnã e Afeganistão), embora não diretamente uma contra a outra, e que poderia-se, razoavelmente, chamar-se de Terceira Guerra Mundial, na qual gerações inteiras viveram sob a ameaça constante de batalhas nucleares e que acreditavam, fielmente, que tal conflito poderia irromper a qualquer momento, e devastar a humanidade (1995).
Twilight Struggle, um excelente war game, assinado por Jason Matthews e Ananda Gupta, lançado no ano de 2005 e exclusivo para 2 jogadores, busca retratar a Guerra Fria num recorte entre os anos 1945-1989: um período de 45 anos de alinhamentos políticos, disputas de influência e golpes de estado no mundo, a partir das ações das duas grandes potências: EUA x URSS. No jogo, as disputas e conflitos ocorrem diretamente no mapa-múndi, retratado por meio de um enorme tabuleiro. O jogo conta ainda com um livro de regras que é excelente por si só, repleto de informações históricas sobre o período, cuja versão nacional fora revisada pelos ilustres Jack e Lukita (Meeple Maniacs). Os eventos retratados nas cartas, por sua vez, são tão interessantes que, na primeira vez que eu joguei, cuidava de ler o significado histórico de cada uma delas, através dos pequenos textos explicativos que foram incluídos no manual.

A estrutura de Twilight Struggle é bem ajustada, fluida, com turnos rápidos e ações simples. Trata-se de um card driven em que os jogadores revezam-se jogando cartas. As cartas, por sua vez, podem ser utilizadas como eventos ou operações, nas quais os jogadores precisam decidir em qual das alternativas usará os seus pontos: posicionamento de influência; testes de realinhamento; aplicação de golpes de estado; ou tentativa de progredir na corrida espacial. São diversas as formas de se chegar à vitória: vence-se automaticamente alcançando-se 20 pontos de vitória (PVs); controlando a Europa, quando uma carta de Pontuação da Europa for baixada; ou quando o oponente rebaixar o nível DEFCON - de ameaça nuclear - a 1, o mais alto. Se não ocorrer uma vitória automática, ao final da partida, contabiliza-se todos os PVs para determinar qual das duas potências nucleares conseguiu a supremacia sobre a rival.

Acredito que Twilight Struggle merece a posição de passagem obrigatória dentre os jogos de tabuleiro modernos. O jogo retrata com competência os diversos eventos ocorridos na época: a tensão nuclear, as disputas de influência, a corrida especial, os golpes, guerras e (re)alinhamentos políticos vivenciados. Nas minhas partidas, o jogo se mostrou equilibrado, ainda que seja para apenas 2 jogadores e represente, através do decorrer das suas três fases e dos eventos que se desenrolam em cada uma delas, as flutuações de poder que historicamente marcaram a disputa entre as duas superpotências. Enfim, um jogo que eu recomendo não apenas aos entusiastas dos jogos de tabuleiro, mas também aos interessados na história do período. O único detalhe é que as partidas podem demorar significativamente, porém, deixo a dica que existe um modo de jogo, incluído no manual, de apenas três rodadas, que se chama "Cenário de Fim de Guerra", que pode ajudar bastante, nesse sentido.
Referência
HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 178-187.
Imagens
Acervo pessoal.