'Kapital! Quem ganhará a luta de classes?' é um jogo de dois professores de sociologia, Michel Pinçon e Monique Pinçon-Charlot, que são diretores de pesquisa no CNRS (Centro Nacional da Pesquisa Científica) e trabalham no CSU (Culturas e Sociedades Urbanas) do IRESCO (Instituto de Pesquisa sobre as Sociedades Contemporâneas) em Paris, na França. O jogo foi concebido a partir da sociologia crítica e com a intenção de discutir as teorias de Marx e Bourdieu, especialmente, em relação aos conceitos de luta de classes, exploração, dominação, processo de acumulação e capitais financeiro, simbólico, social e cultural. 'Kapital!' foi um sucesso no país de origem, tendo sido impressas mais de 100 mil cópias.

No Brasil, quem lançou o jogo foram as editoras Boitempo e Autonomia Literária, em parceria, ambas voltadas ao meio editorial de livros acadêmicos e políticos. Apesar de não serem editoras de jogos de tabuleiro, as duas, além da tradução, fizeram um excelente trabalho de adaptação. Assim, o texto de todas as cartas do jogo foram adaptadas à realidade e conjuntura brasileiras.
'Kapital!' é um jogo de estrutura simples, tendo em vista que os professores não são designers e o objetivo principal é o de ensinar sobre a reprodução das desigualdades sociais que se dá por meio de ações políticas que favorecem a classe dominante. A mecânica principal é a clássica roll and move, em que os jogadores - um deles representa o dominante e os demais, os dominados - escolhem personagens com características diferentes entre si e andam por uma trilha com o objetivo de chegar primeiro ao final, o paraíso fiscal. Vence a partida aquele que acumular mais pontos, conforme cada tipo de capital que conseguiu reunir. Uma curiosidade é que a trilha da versão nacional possui 76 casas, refletindo a média de vida do brasileiro.
Cada classe possui o seu próprio baralho de cartas. Como na vida real, a classe dominante possui muitos privilégios, o que torna pequena a chance de vitória dos dominados, muito embora, quantos mais dominados na partida, mais difícil fica para o dominante manter a sua fortuna e o seu status quo. No manual e em todas as cartas que formam os dois baralhos, a relação de desigualdade é ressaltada por meio de situações, escolhas e informações diversas sobre conjuntura, política, economia, etc., que podem influir no ganho ou na perda de capital. Na trilha, ainda é possível terminar o movimento em casas especiais, que deflagram alguns processos sociais específicos, tais como: greve geral, prisão e revolução.

Além de apresentar uma ótima arte, o grande destaque de 'Kapital!', a partir do tema escolhido e das informações sociológicas inseridas nos componentes, é a reflexão que provoca sobre as relações de classe e as desigualdades sociais. Por esse motivo, o jogo é uma importante ferramenta tanto lúdica quanto pedagógica. Durante a partida, é impossível não perceber as diferenças impostas, compreendendo as suas origens, e não pensar em derrubar as relações de classe. Enfim, 'Kapital!' não é uma boa opção se você procura simplesmente por um lançamento de um jogo de tabuleiro moderno, por outro lado, se você procura por um jogo original do ponto de vista temático, muito bem adaptado à conjuntura político-econômica brasileira e com uma abordagem sociológica de primeira linha, vale muito a pena.
Por: Linauro. Apaixonado por literatura, música e jogos, desde sempre. Descobriu nos jogos de tabuleiro uma desculpa perfeita para passar mais tempo com amigos e pessoas amadas.
Imagens: acervo pessoal.