Nunca fui fã de Stephan Feld e confesso que tampouco sou um profundo conhecedor do Designer, porém basta imergir um pouco no universo de Boardgames que você terá bastante contato com os jogos desse alemão. Caso eles não pipoquem na sua mesa, uma a cada três pessoas falará incansavelmente sobre a sua genialidade e a necessidade de conhecê-lo. No mínimo, após um tempo, você saberá que seus jogos são sempre secos de temas, repleto de mecânicas inteligentes e meios de pontuação, com baixa interação e uma arte não muito caprichada.
No final das contas, os jogos do Feld para mim sempre foram como música clássica. Refinados, eruditos, com requinte, flertam sempre com genialidade, porém, a diversão não é o seu forte. Mas parece que o designer tem seus lapsos de bom humor e Carpe Diem é a prova disso.
As exceções no entanto não se fazem presentes em todos os aspectos. Como de costume, nem tente achar um tema para este jogo, será um exercício inútil, como a própria frase na caixa diz
“Seize the Day be Victorious” (ou algo como: faz seus pontos aí e não me encha o saco) a boa notícia é que essa ausência não faz a menor falta. As mecânicas não trazem nada de inovador ou refinado dessa vez, porém a maneira de implementação e junção delas formam um conjunto bem divertido e agradável.
As regras no geral são muito simples e podem ser resumidas em 3 mecânicas principais: A primeira representada num round de 7 rodadas para o
draft de tiles, que é exercido num sistema bastante divertido. Em um círculo de 7 distritos conectados por linhas, contendo 4 tiles cada um, os jogadores posicionam seu meeple e os deslocam através dos dois caminhos possíveis de cada distrito de origem, selecionando um tile no distrito de destino.
Simultaneamente ao draft, o bom e velho
tile placement se faz presente. As peças são imediatamente alocadas num board individual, contendo pedaços de campos, habitações e construções que ao se completarem geram benefícios imediatos, fundamentais para obter os recursos necessários para a fase de pontuação. Os diferentes objetivos, cartas de fontes e até mesmo os bônus dos frames nos tabuleiros individuais (que sugerem locais para construções específicas em troca de pontos), geram escolhas suficientes para que cada jogador defina seus caminhos e estratégias em ações planejadas na construção de seus mapas.
Por fim a
fase de score, ao término de cada round (e o draft dos 7 tiles) os jogadores devem selecionar um espaço no grid de pontuação ativando duas cartas de objetivos. Sendo necessário que preencham as condições dessas cartas, perdendo 4 pontos sempre que não forem bem sucedidos. Um elemento que é importante estacar, é a ordem dessa escolha, que se dá através da posição dos jogadores em uma trilha de bandeirolas, recurso comumente utilizado pelo designer. Para avançar nessa trilha os jogadores precisam de construções específicas ou ocupação de determinados espaçoes em seus tabuleiros.
Interação x Tensão
A já conhecida ausência de interação dos jogos de Feld, aqui é amenizada por uma maravilhosa tensão que permeia as escolhas dos jogadores em uma partida. Desde o draft dos tiles que são limitados pelos movimentos do seu meeple, fazendo com que aquela peça que você está de olho seja escolhida por alguém que consiga chegar primeiro, até a escolha do que construir; já que a possibilidade de ter seu objetivo "trancado" no final do round pode te deixar com recursos inúteis na mão caso esteja com um planejamento futuro raso e sem planos B´s devidamente traçados. Tudo isso de olho na corrida no track das bandeirolas que pode ser crucial para o sucesso de seus planos.
Essa tensão do draft inclusive me lembra muito a sensação da escolha de azulejos em Azul. Onde fica sempre aquela dúvida de qual peça pegar acompanhada pelo medo de quais opções restarão quando for sua vez de novo e o quanto isso irá influenciar no seu planejamento.
A produção de um jogo é capaz de afetar a sua experiência?
Tudo muito bacana mas nem tudo muito bonito, Carpe Diem levanta no seu maior defeito uma discussão interessante.
Não é novidade a despreocupação com beleza e produção nos jogos de Feld. Mas os equívocos nas escolhas de design dos componentes e arte do jogo ultrapassam a questão estética na minha opinião.
A começar pela incompreensível decisão em como diferenciar os tiles de construção com fundo "verde claro" e “verde escuro” meio tom acima. Invariavelmente você irá misturar os tiles e depois ficará catando milho e perdendo um bom tempo para diferenciar-los antes de guardar o jogo e caso não faça isso se prepare para um setup bem desagradável na próxima partida. Os prédios marrons e amarelos que também se confundem nos tiles, frames e cartas caso não estejam lado a lado para comparação poderão comumente fazer alguém pegar parte de uma padaria atrás de moeda rs.. Fora as cartas para controlar a pontuação que não são nada práticas, não fazem o menor sentido tematicamente (nada faz) ou tem algum outro propósito para existir no lugar de um tracking de pontuação normal no tabuleiro.
Isso claro sem contar os tokens de pães que parecem laranjas cortadas e a arte sem inspiração e genérica de todo resto de uma produção preguiçosa. Mas nesse caso aqui é só uma questão estética mesmo.
Enfim, se beleza não põe mesa, o desleixo atrapalha. Carpe Diem é um jogo divertido
com uma ótima dose de estratégia para um euro leve para médio que funciona tanto para iniciantes quanto para jogadores mais experientes que estejam sem tempo para partidas mais demoradas e/ou pesadas. Apesar do design gráfico medíocre e muitas vezes irritante na qualidade de seus componentes, recebe uma compensação na quantidade dos mesmos. A Numerosa variedade de cartas entregam ao jogo uma enorme rejogabilidade que funciona em qualquer contagem de jogadores, inclusive sendo uma ótima pedida para partidas de dois jogadores.
Uma ótima opção para
aproveitar o dia e ser vitorioso fazendo muitos pontos.
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