Esta é uma matéria da Revista Vempramesa 7ª Edição. Quer ter acesso a todo o teor da Revista basta acessar aqui.
Resenha Azul
Redator: Roberto Pinheiro
Mês passado, enquanto eu escrevia a resenha, o Patchwork era o Top #1 abstrato no Board Game Geek. Entretanto, antes da revista ser publicada, o Patchwork foi destronado. Então, na edição deste mês, trago o atual Top #1 abstrato do BGG! Você pode espernear e dizer que é puro hype, mas a realidade é essa e hoje colocaremos Azul na linha de fogo dessa análise. Se você esteve embaixo de uma pedra esses últimos meses, reforço que Azul é o nome do jogo.
Lançado em 2017, Azul foi criado pelo Michael Kiesling. Engraçado, ou não, é que o jogo tem apenas seis meses de lançamento e percorreu muitas posições nesse curto período de tempo. Para quem não conhece Michael Kiesling, ele já fez muita parceria com Wolfgang Kramer. Talvez essa informação não tenha ajudado em nada, mas eles trabalharam juntos, por exemplo, no famoso Tikal, jogo que será lançado aqui no Brasil pela Conclave Jogos. Bom, em todo caso, Azul tem um game designer de calibre, mas isso não explica bem sua rápida subida nos ranks. Entretanto, antes de entrar nessa discussão, vamos conhecer mais sobre o jogo.

Azul é um jogo para 2 a 4 jogadores, no qual cada jogador é um artista de azulejos trabalhando para embelezar o Palácio Real de Évora, em Portugal. O nome do jogo vem justamente da cor bastante presente nos azulejos portugueses. Apesar de todo esse histórico e esforço para colocar o tema no jogo, como todo abstrato, serviu “apenas” uma roupagem para possibilitar arte e design gráfico. O apenas está entre aspas, pois o aspecto gráfico nos jogos faz toda a diferença.
Então, traduzindo em termos de jogabilidade, o objetivo dos jogadores é coletar azulejos (representados por excelentes peças plásticas coloridas) e colocá-los na sua parede (tabuleiro pessoal), visando conseguir a maior quantidade de pontos até o final da partida. Deste modo, o jogo se resolve em rodadas até que algum jogador tenha formado uma linha de azulejos completa em sua parede.
Enquanto a condição não é atingida, as rodadas vão sendo resolvidas seguindo uma estrutura de três fases basicamente representando a aquisição dos azulejos, a colocação dos azulejos e preparação para a próxima rodada. Na primeira fase os jogadores realizarão suas ações de acordo com os grupos de azulejos formados de modo aleatório. Suas opções são: coletar todos os azulejos de uma cor de algum desses grupos OU coletar todos os azulejos de uma cor do centro da mesa. O centro da mesa possui inicialmente apenas um azulejo, quem coletar pela primeira vez no centro, coleta esse azulejo e será o primeiro jogador da rodada. Entretanto, como esse azulejo não é de nenhuma cor, ele é colocado em uma trilha de pontos negativos no seu tabuleiro pessoal. Novos azulejos são adicionados ao centro da mesa quando um dos grupos é escolhido por algum jogador. Assim, todas as cores que não forem a desejada por ele, vão parar no centro da mesa. Os jogadores permanecem coletando azulejos dos grupos ou do centro da mesa enquanto houver azulejos em jogo. O detalhe é que não é tão simples assim. Quando o jogador coleta qualquer quantidade de azulejos, ele deve posicioná-los imediatamente no seu tabuleiro pessoal. Em algumas ocasiões, não será possível colocar todos os azulejos no seu tabuleiro pessoal e eles deverão ser colocados naquela trilha de pontos negativos. Então, planejamento é essencial e a escolha dos outros jogadores irá influenciar bastante no bom andamento dos seus planos.

Depois de toda essa escolha dos azulejos, chegou a hora de colocá-los na parede. É nesse momento que a maioria dos pontos obtidos durante a partida são coletados. Essa etapa também requer planejamento, pois você recebe mais pontos de acordo com adjacências previamente estabelecidas entre os azulejos na sua parede. Então, se você colocar os azulejos “onde der”, a situação vai ficar feia na sua pontuação. Afinal, a trilha de pontos negativos aumenta o impacto cada vez que um novo azulejo é colocado lá. Sendo possível um jogador conseguir pontos negativos durante uma rodada. Quem falou que pegar azulejos e botar numa parede fosse fácil? Na verdade, não é tão difícil, acho que o maior problema é ser no Palácio do Rei.
Passadas essas duas fases, o resto é meramente burocracia para preparar a mesa para a rodada seguinte. Eventualmente, a condição de parada ocorre e contabilizam-se alguns pontos extras. Esses pontos extras são por linhas horizontais completas, por linhas verticais completas e por ter colocado todos os azulejos de uma cor específica (sua parede é uma grade 5x5, de modo que cada cor tem exatamente 5 azulejos).
A explicação foi corrida, pois o foco aqui não são as minúcias, mas sim no que o jogo proporciona. Com isso em mente, eu consigo resumir Azul em uma palavra: quebra-cabeça com interação. Acho que essa definição vai mostrar logo de cara se você irá gostar ou não do jogo. Se você gosta de quebrar a cuca, pensar analiticamente sobre “se eu pegar X, meu oponente vai pegar Y, então eu posso pegar Z”, esse jogo é para você. Caso contrário, talvez não satisfaça suas necessidades. Como o jogo é relativamente rápido e fácil de aprender, eu recomendaria pelo menos jogá-lo uma vez. Acredito que a experiência seja válida, a não ser que você abomine jogos que o tema não importa tanto, mas nesse caso você não teria lido até aqui.
Então, concluído? Sim. Concluído, mas faltou eu responder à pergunta inicial: Azul merece ser o Top #1 abstrato? Eu diria que não. Isso não quer dizer que o jogo é ruim, mas que ele não atende muitos dos quesitos necessários para o que eu diria ser excelência em um abstrato.
Azul não proporciona um escopo de centenas de opções para sua jogada. Não que isso seja ruim para jogos de modo geral, mas isso deixa Azul muito mais característico de um jogo família do que um jogo abstrato. O universo do jogo é muito restritivo e fechado. Só não digo que é um jogo família pelo aspecto punitivo da interação e da trilha de pontos negativos.
Azul tem um ponto forte em comum com os abstratos que é a interação, mas a interação é bastante indireta. Azul parece ser mais um Eurogame do que um abstrato. Tanto pela interação indireta como pelo esquema de pontuação durante a partida e final da partida. Para completar, Azul não termina com um jogador “vencendo”. Termina com um jogador contando os pontos.
Então, não faz tanto sentido Azul ser Top #1 abstratos, pois a única parte de abstrato que ele possui é a falta de conexão com o tema, e olhe que nem isso é tão abstrato assim. Acho o mesmo do Patchwork, já resenhado por mim. É como termos o Agrícola como Top #1 temático. Ora, Agrícola é extremamente temático, mas eu não diria que ele se classifica muito bem como jogo temático, pois jogo temático não é simplesmente ter um tema bem implementado às mecânicas. Talvez você me chame de purista ou velho ranzinza, mas a realidade é que os jogos abstratos estão mudando. Essa mudança não é ruim, pois aumenta o alcance de jogos anteriormente vistos com preconceito, mas está descaracterizando o gênero. Encerro por aqui. Inclusive, em protesto, encerro minhas resenhas sobre abstratos que não são abstratos. Brincadeirinha. Até próximo mês!