Um pequeno relato sobre minha relação com compras compulsivas.
Esse é um sentimento que tive por pouco tempo, quando tentei acompanhar alguns do grupo de jogatina que piraram no colecionismo. Cheguei aos 70, creio eu (nunca contei, quase um terço PNP homemade "da vida") parei. Vi que a coisa não era certa. A esposa olhava, e dizia "você não joga nem os outros".
Dos compradores aficcionados, ficou somente um que ainda compra muito; os outros sumiram. Ao final, a jogatina era dominada por esse colecionador, pois sempre foi quem mais tinha jogo (dizem que é mais de 400, não sei dizer). Como a coleção dele só aumentava, o pessoal começou a reclamar (pelos cantos, é claro) que queriam jogar vários jogos "antigos" que não tinham oportunidade de ver mesa, enquanto perdiamos uma tarde de sábado aprendendo um jogo que jamais seria jogado novamente, pois na próxima semana tinham mais dois ou três novos na fila.
Eu confesso que logo fui cansando disso. Parte do grupo de jogatina dispersou, alguns pela "pressão" de ter que jogar sempre algo novo e não poder jogar os jogos que tinham mais carinho. E quando percebi, de uns quinze jogadores, ficou uns quatro ou cinco; da frequência quase semanal, virou bimestral, com muito custo.
Nesse meio tempo, entrei em Alcoólicos Anômimos. parei de beber e refiz toda a minha rotina para enfrentar o alcoolismo. Uma das coisas que percebi após a sobriedade, é que eu bebia MUITO nas jogatinas pois me cansava daquilo;o que era para ser uma higiene mental, virou um compromisso com alguém que me desagradava. A situação de alguém determinar o que todos deviam jogar (todo mundo tinha jogo, mas ninguém mais levava pois sabia que não veriam mesa). Assim me afastei e o grupo mixou de vez.
Após alguns meses, entrei em contato com dois dos jogadores que eu mais me dava e recomeçamos a jogar. Os três mosqueteiros, ocasionalmente aparecia um D'Artagnam. Após alguns meses, o colecionador descobriu que estávamos jogando e chamos a gente pra ir em sua casa jogar. Como eu já estava a 1 ano sóbrio decidi ir - pensei "quem sabe a coisa fica legal novamente, o cara é legal". Mas foram poucas jogatinas e o sentimento de "saco cheio" voltou; mesma coisa, não jogava nada daquilo que eu gostava, sempre tendo que jogar algo novo pra agradar o cidadão; ninguém com coragem de falar (nem eu). Depois do jogos, chegava em casa reclamando dos jogos e a esposa logo me jogou na cara: "tu é obrigado a jogar com fulano? Se tá te fazendo mal, para!" Assim comecei a dar desculpas e não joguei mais. E logo mixou a coisa de novo.
Após alguns meses procurei so mosqueteiros novamente, falei o que sentia a respeito da situação (eles sabem que sou membro de AA) e disse que não me interessava mais em jogar com o fulano; como não sou o dono de ninguém, disse-lhes que jogassem com o cidadão, caso quisessem, bastava não me chamar, ou avisar se eu chamasse pra jogo - sou um velho de mais de cinquenta anos, se ficar "amuadinho porque preferiram ele a eu hoje", tenho mais é que voltar a me afogar na garrafa, mesmo. Brincadeiras a parte, entenderam a situação e jogamos sempre, não com a frequência que queríamos (compromissos e afins), mas nos divertimos. E recentemente apareceu outro antigo jogador do grupo, e fechamos quase sempre com quatro.
Me livrei de jogos que nunca foram jogados, ou que não agradaram. Voltamos a jogar o que tinhamos vontade. Não compro mais jogos? Sim, mas raramente e somente aquilo que está na lista de desejos a alguns anos. Compra por impulso, em leilão, porque tá "barato", nunca mais. Todos os que foram embora, foram comprados assim.
Dito isso, mais um dia a todo mundo, e boas jogatinas, com alegria, seja colecionando se é o que te deixa faceiro, seja jogando Carcassonne e Catan se é o que te alegra "estou nessa seguna opção).