Rodrigo Deus::Toda partida tem um fim e é hora de também encerrar esta aqui. Este lindo jogo chamado "Meeple Divino" foi um grande palco pessoal de emoções, decepções, descobertas e material sobre jogos desde 2017 no ar, com altos e baixos. Porém é hora de encerrar enquanto é tempo de encerrar com dignidade.
Os vídeos de conteúdo de jogos tem cada vez mais tomado espaço por conta da escolha do público, mesmo os vídeos que, sinceramente, eu pessoalmente acho que não tem qualquer qualidade no seu conteúdo, apenas palavras repetidas de um outro criador com um formato diferente e vocabulário diferente. Sempre achei que os vídeos brasileiros precisam sinceramente de uma reformulação sobre o formato do conteúdo do vídeo, como tudo é apresentado ao público e seus detalhes, mas quanto mais o tempo passa, mais "do mesmo" se vê por aí, na minha opinião, apenas mudando de plataforma.
Há quem possa achar que o material que postei por anos é ruim, monótono, pouco aprofundado e outros tantos adjetivos interessantes por aí que acumulei na memória por anos a fio. Enquanto respeito a opinião de cada um, isso também não me interessa na mesma proporção. A grande questão é que, somado a falta de interesse de apoio de editoras e profissionais do meio, a interação com as pessoas que supostamente liam o conteúdo foi diminuindo cada vez mais. É incrível como um vídeo de "shorts" do Youtube ou "reels" do Instagram possui tantos comentários e elogios, mesmo que superficiais, enquanto um blog (e não somente o meu) que se dedica a criar material em outro formato (leitura) mal consegue meia dúzia de comentários.
Aliado a tudo isso, a vida pessoal e profissional chamam para outros projetos, outras escolhas e novos caminhos. Rotineiramente é preciso tempo para aprender, jogar, rejogar, escrever, editar fotos, revisar, postar e espalhar a informação pelas redes sociais e a energia para fazer tudo isso já acabou. Fora gastar meu dinheiro para comprar esse ou aquele lançamento, ou correr atrás de eventos para ver novos jogos. Novidade é o que move o interesse passageiro desse mercado: é impossível ter uma renda média e poder acompanhar todos os lançamentos mensais de jogos de tabuleiro, expansões e acessórios. Então é hora de finalizar este blog, assim como os vários malabarismos que precisaram ser feitos para dizer exatamente o que penso, pois os egos são frágeis. Como já dizia dona Maria da Conceição, falecida avó, "meu filho, você vai vê "coisa" nessa vida".
O compromisso de criar conteúdo e escrever semanalmente é barra pesada. Sempre foi, mesmo parecendo que não. A quantidade de lançamentos só aumenta e haja dinheiro, tempo, energia e interesse para acompanhar isso tudo sozinho.
Portanto... Adeus. O canal da Ludopedia continuará, mas apenas por pura preguiça de excluir o mesmo. Como eu ainda tenho milhares de fotos de jogos, partidas, eventos e outros, vou colocar na Ludopedia, pois é o Boardgame Geek brasileiro, ajuda muita gente a começar ou continuar no passatempo de jogos de tabuleiro e eu acredito que desta forma ajudo a comunidade como um todo. Este blog se encerra com essa postagem, assim como suas redes sociais, e se você leu até aqui, o meu obrigado. Se você era leitor ou leitora frequentes, muito obrigado e desejo que todos os seus projetos se realizem, igual a antiga canção de ano novo. Provavelmente o blog ficará no ar até novembro, aproximadamente, pois é até onde o plano de hospedagem e domínio estão pagos.
Que São Meeple, esse camaradinha azul, abençoe a todos.
Caro Rodrigo (
Rodrigo Deus)
É com tristeza que eu recebo essa notícia, principalmente porque que ela é um sintoma do atual status quo, não apenas do hobby dos board games, mas da própria produção de conteúdo em outros campos, e também da cultura brasileira.
Está cada vez mais difícil produzir conteúdo de qualidade em todas as áreas, e esse talvez seja o lado negativo da internet. Antigamente para publicar alguma coisa ou para gravar uma música, o produto tinha de ter muita qualidade, porque a própria dificuldade do mercado já era um filtro muito rigoroso. Antes da popularização da internet de meados dos anos 90 em diante, havia alguma confiabilidade na mídia escrita em geral. Claro que os veículos eram influenciados por questões ideológicas, e pelo viés que os empresários da mídia queriam dar às notícias. Porém, em termos gerais havia a certeza de que as notícias haviam sido escritas por jornalistas e passado pelo sistema de checagem dupla em mais de um fonte. Desse modo, as notícias poderiam ser até manipuladas, mas nunca se ouviu falar em "fake news", e pessoas espalhando desinformação, em um nível criminoso, como hoje em dia.
Por outro lado, nem tudo era um mar de rosas antes da internet. Isso porque da mesma forma que esse filtro rigoroso mantinha alto o padrão de qualidade, ele também excluía, muita gente boa, com ótimos produtos, mas que não tinham a menor chance de mostrar o seu trabalho. Em decorrência disso, muita gente simplesmente não tinha voz, não tinha como se manifestar, e era simplesmente ignorada. Não apenas no aspecto cultural, mas principalmente no campo social. Nesse sentido, a internet foi fundamental para dar voz a quem não tinha anteriormente, e eu acho isso fundamental, e que supera largamente, os pontos negativos dessa democratização da produção de informação. Atualmente todos podem produzir informação e o que é mais importante, todos tem acesso à informação, e eu acho que nem dá para mensurar o quanto isso é importante, para o desenvolvimento da humanidade.
Só que aí surge um problema, porque quando todo mundo pode falar o que quiser, muita coisa boa é dita, mas ao mesmo tempo muita coisa ruim também aparece. Nas palavras do ilustre e saudoso Humberto Eco, um autor cujo trabalho eu aprecio muito, "a internet transformou o bobo da aldeia em portador da verdade", e "as redes sociais deram voz a uma legião de imbecis, que antes só falavam no bar, após uma taça de vinho, sem causar nenhum dano à coletividade". Recentemente, em um dos capítulos mais sombrios da nossa história, durante a pandemia, nós pudemos ver o quão perigoso, e quanto dano real, as redes sociais, a desinformação e as fake news podem causar. Eu acredito que muita gente aqui ainda não tinha nascido no começo da campanha contra a pólio, e menos ainda na época da erradicação da varíola. Pois bem, 50 ou 60 anos atrás seria impensável alguém dizer que a terra era plana e que vacinas não salvavam vidas, e mais ainda imaginável que alguma pessoa sã acompanharia e apoiaria um pensamento tão dissociado da realidade quanto esse. É verdadeiramente lamentável e perturbador que atualmente as pessoas não tenham nem mais o pudor de revelar suas afinidades e simpatias por excrescências como o racismo, o fascismo (seja de que espectro político for), o sexismo, a intolerância religiosa, a ignorância, o fanatismo, entre outras mazelas que já deveríamos ter superado há muito tempo. Hoje em dia, mesmo com todo avanço tecnológico dos últimos 70 anos, a impressão que se tem é que a tecnologia avança, mas o pensamento humano retrocede, em alguns casos.
Desse modo, como tem muita gente produzindo muita coisa, muitas vezes aquilo que é bom acaba se perdendo em uma mar de mediocridade, e eu uso mediocridade no sentido de médio mesmo, não com a conotação mais usual. Evidentemente, produzir um bom trabalho é bem mais difícil e complicado do que produzir um trabalho ruim, e quando se aumenta exponencialmente a quantidade de gente produzindo material, a tendência é que sempre se tenha muito mais trabalhos ruins do que bons. Esse é o principal ponto negativo de toda essa democratização trazida pela internet.
Além disso, a infinidade de trabalhos e de publicações, de mídia e assemelhados, produzidos faz com que seja necessário tomar medidas extremas para que o produtor de conteúdo possa dar o seu recado. Por conta disso, atualmente é mais importante e eficiente em termos de divulgação do trabalho, que ele seja popular do que tenha qualidade. Com todo o respeito aos vencedores de hoje e de ontem, mas isso está muito bem exemplificado no prêmio Ludopedia, onde quem ganha, nem sem é o melhor, mas sempre o mais popular. Isso sem falar que nós seres humanos parecemos ter uma inclinação e uma predileção muito mais pelo que é mau, negativo, bizarro e grotesco, do que pelo que é bom, positivo, e correto. Como se dizia, e ainda se diz, nas redações e nos estúdios, desgraça vende muito mais que felicidade. Não é à toa que mesmo o clikbait sendo um recurso tão condenável, deplorável, e um indicativo de extrema pobreza de espírito e falta de confiança na qualidade do conteúdo, ainda assim funciona que é uma beleza, e é uma das ferramentas mais utilizadas na internet, especialmente no caso dos vídeos.
Infelizmente ao que tudo indica, o conteúdo de alta qualidade, mesmo tendo intrinsecamente um inegável valor, aos olhos de grande parte da comunidade, muito mais interessadas em unboxings e análises chapa-branca, obrigatoriamente positivas, independente da qualidade do jogo analisado, para esses, a análise crítica e fundamentada aparentemente não tem tanto valor assim. Por isso é muito triste, mas ao mesmo tempo muito compreensível, saber que um veículo com um conteúdo irretocável e altíssimo nível de qualidade como o blog do Rodrigo e até mesmo o canal aqui do Ludopedia chegaram ao fim. Pelo menos fica o profundo respeito e o privilégio de ter trocado tão boas ideias com alguém tão elegante, tão respeitoso, que sabe tanto de board game, e acima de tudo tão legal quanto o Rodrigo. Meu amigo, seu conteúdo fará falta, muita falta mesmo.
Por fim, ao invés de terminar como de costume desejando um abraço e boas jogatinas, eu direi:
BRAVO, BRAVO, BRAVÍSSIMO!!!!
Iuri Buscácio