Fel Barros, renomado designer brasileiro de jogos de tabuleiro, destaca-se como um dos mais premiados nesses 9 anos de edições do
Prêmio Ludopedia. Nesta entrevista, ele compartilha sua relação com a premiação, faz críticas construtivas e reflexões sobre o futuro do prêmio.
LUDOPEDIA: Olá, Fel! Primeiramente, parabéns pela conquista do Prêmio Ludopedia com o
Dobro. Foi uma conquista incrível e merecida! Já que o assunto é a premiação, vamos começar falando sobre a sua relação com o Prêmio Ludopedia.
Ao longo das edições, você foi um dos designers que mais venceu (5 vezes). Como você descreveria a relevância desse reconhecimento para a sua carreira ?
FEL BARROS: Incrivelmente relevante! Como alguém trabalhando como autor há quase 10 anos, posso dizer que o Prêmio Ludopedia é algo que me validou como autor (na época do
Space Cantina em 2016) quando eu era mais visto como "amigo dos autores". No mesmo ano, com o Selo de Excelência pelo
Gekido: Bot Battles na Dice Tower, acredito que passei a ser mais respeitado na comunidade como um todo.
Além disso, quando vão se referir a mim de forma superlativa, o Prêmio Ludopedia é o único factível. Halaban fica com o título de mais prolífico, Jordy Adan com a maior honraria (pelo
Cartógrafos) e mais querido para o Marcos Macri. Admiro o trabalho do Eurico e do Daniel (ambos com 5 prêmios também) mas vamos buscar esse desempate no futuro.
Finalmente, apesar de não trabalhar mais diretamente com os jogos lançados aqui, sempre que sou abordado por editoras para um relançamento, penso onde seria categorizado no Prêmio Ludopedia (agora preciso que alguma editora faça uma versão infantil de um jogo meu, pois ainda não fui contemplado nessa categoria

)
LUDOPEDIA: Dos seus jogos que ganharam o Prêmio Ludopedia, qual é o seu favorito ? Um jogo que tenha um significado especial para você.
FEL BARROS: Com certeza o
Dobro. E todo o crédito para a Grok, que está realmente alguns degraus acima, como alguém que de fato pega os jogos "do zero" para construir um produto. Foi um trabalho impecável e que está colhendo os frutos, com o
Dobro passando de 10 mil cópias no seu primeiro ano (inédito para mim no Brasil). Fiquei feliz com o reconhecimento do júri para um jogo de caixa pequena (também inédito).
LUDOPEDIA: Ao receber os prêmios ao longo das edições, houve algum momento engraçado ou inusitado que você gostaria de compartilhar ? Alguma história divertida de bastidores?
FEL BARROS: Acho que daria para contar um causo de (quase) todas as edições. No primeiro prêmio, o Gekido que não tinha caixa, era só uma sacolinha, dados e cartas, chegou na final de forma muito inesperada e eu só fiquei sabendo depois, por que nem achei que seria possível.
A outra (e que felizmente foi retificada esse ano), é que o Rafael, da Grok, sempre me sacaneava por não ter nenhum prêmio físico (o
Space Cantina foi antes da premiação dar os troféus) e o
God of War: The Card Game ficou com a Galápagos). Agora com o
Dobro, finalmente tenho um caneco para chamar de meu.
LUDOPEDIA: Vamos falar agora sobre o impacto do Prêmio Ludopedia para a industria e sua visão geral da premiação.
Em sua opinião, como essa premiação tem contribuído para impulsionar a produção nacional e a nossa imagem internacional ?
FEL BARROS: Toda premiação relevante importa. O Prêmio Ludopedia, que em breve completa 10 anos, com certeza está no radar das editoras. E é uma forma de validar a qualidade do jogo. Mais de uma vez, ter o Prêmio Ludopedia serviu como argumentação para publicar um jogo fora. Alguns canais de fora conhecem o Prêmio e se eu for falar dos jogos mais notáveis nacionais para um "Tom Vasel da vida", certamente falarei dos jogos que venceram o prêmio.
LUDOPEDIA: Com base em suas experiências, como você descreveria a evolução do Prêmio Ludopedia ao longo do tempo?
FEL BARROS: Uma coisa que eu queria valorizar é que desde a primeira edição , o Prêmio valoriza o design nacional. Isso é incrivelmente relevante para o crescimento da nossa indústria. Como alguém que acompanha (e participa) desde a primeira edição, fiquei muito feliz com a inclusão da categoria infantil, os prêmios físicos e principalmente acima de tudo, o maior ganho é a realização de uma cerimônia presencial no DOFF. E aí aproveito para elogiar o trabalho tanto da organização, quanto do Rafael Studart e equipe por serem hosts. E a acertadíssima decisão de colocar a categoria revelação (mas acho que 1 ano elegível, 2 anos já perde o status de revelação, não?). No geral, estou muito feliz com o Prêmio Ludopedia.
LUDOPEDIA: Ano que vem o prêmio completa 10 anos, o que você enxerga de mudanças para o futuro ?
FEL BARROS: Para o futuro, eu vejo alguns pontos de melhoria importantes.
Primeiramente acredito que a categorização (infantil/família/expert) deveria vir do júri. Já vi diversos casos de jogos que claramente não estavam categorizados corretamente. Também acredito que a quantidade de jogos elegíveis deveria ser menor assim como o júri ter menos pessoas (até 10?) de forma que as editoras possam enviar os jogos para o júri para uma avaliação. Realisticamente, quantos jogos o júri de fato jogou? E quanto a acessibilidade reduz a chance de vitória (
Massive Darkness 2: Hellscape , um fenômeno internacional , com top 1 Dungeon Crawler do Tom Vasel, selo de excelência e diversos outros prêmios não foi nem finalista em algumas categorias?)
Outro ponto para se pensar, é que ter 80-100 canais elegíveis para o prêmio de mídia, acho que atrapalha o público e faz os menores sumirem. Talvez uma triagem prévia ajude a destacar os menores.
Por fim, acredito que mais duas categorias precisam ser criadas para dar mais espaço:
A primeira é a revelação para o designer, de forma a dar espaço para os autores indies e que estão em começo de carreira fazendo um bom trabalho (com o DOFF dando espaço para os indies, seria bacana dar esse destaque a quem está chegando agora, como o excelente Aron Palo, Laila Terra e outros autores). E a outra é um prêmio tipo DIANA AWARDS que é alguma contribuição muito valiosa para o hobby. A Barbara Cortes , do Movimento Labareda, por exemplo, merecia ser contemplada pelo seu trabalho incrível nos últimos anos e como podemos reconhecer isso?
LUDOPEDIA: Nessa última parte da entrevista, vamos falar sobre o seu trabalho como designer.
Como você descreveria seu estilo de design de jogos? Existe algo que você sempre tenta incorporar em suas criações para deixá-las únicas ?
FEL BARROS: Eu brinco que meu estilo é focar em brigar com os amiguinhos. Gosto muito de interação e acho que parte integral da experiência é forçar a mão na forma como os jogadores precisam se relacionar durante a partida. Isso sempre vai estar presente em tudo que eu trabalhar. Seja a interação agressiva que foi a base do Medievalia e do Dobro, ou , atualmente, trabalhando com cooperativo, como os jogadores se complementam para que precisem conversar.
Sobre o termo Único eu acho que é incrivelmente superestimado, assim como balanceado. Não sou criativo o suficiente para isso. Desde o
Dominion não existe algo único. E vejo , muitas vezes, as pessoas sacrificando a qualidade do jogo e da experiência em prol de buscar esse "graal"
LUDOPEDIA: Agora, pensando em toda a sua trajetória, se você pudesse dar um conselho para designers de jogos iniciantes, que pensam em receber uma premiação no futuro, qual seria?
FEL BARROS: Aqui na Ludopedia tem um post meu que sintetiza horas de papo de game design:
https://ludopedia.com.br/topico/46799/fel-quero-fazer-um-jogo-e-agora
Prometo fazer uma listinha mais estruturada depois mas por enquanto fica aqui um top 3 de coisas que eu gostaria de saber quando eu entrei:
1) Não faça o jogo sozinho, busque uma dupla
2) O primeiro, usa a Ludens Lab e faz uma tiragem magrinha, você vai ficar muito motivado vendo o produto finalizado
3) Buscar conhecimento é legal mas é mais importante executar. Para de enrolar e cria o jogo. Não vai ficar bom mas você pelo menos terminou o processo.
Bônus: Nunca fale para uma editora ou autor mais cascudo a frase "eu joguei com meus amigos e todos adoraram".
É isso. Agradeço o espaço, sou fã de vocês, admiro muito a evolução da Ludopedia e do Prêmio em si e espero acompanhar, de perto, as melhorias.
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