DuqueXenofontes::Caro Iuri Buscácio
Ótimo texto!
Gostaria de adicionar um outro ponto que vi em uma das lives que a galápagos fez recentemente para anunciar os próximos jogos.
Na live de um canal parceiro, o influencer que estava hospedando disse algo do tipo "Ah, tem gente que reclama da Galápagos trazer muitos jogos e acha isso ruim". Depois complementou citando um designer brasileiro que também teria rebatido tal reclamação. Todos riram e argumentaram que quanto mais jogos, melhor.
Em primeiro momento isso parece óbvio. Mas acredito que o influencer, envolto pelo véu do conteúdo patrocinado, não pôde enxergar as minúcias de inundar o mercado de jogos sem ter as condições de lidar com isso posteriormente. Além disso, as trágicas localizações também podem ser resultado do grande número de lançamentos devido o (possível) menor tempo para a equipe de localização finalizar um projeto.
Eu quero ter mais opções de jogos disponíveis. E eu quero que venham sem defeitos. Mas será que vou ter que escolher entre um ou outro?
Caro Duquexonofontes
Primeiramente, agradeço seu comentário e muito me satisfaz que você tenha apreciado o meu texto.
Acho que você está coberto de razão, e possivelmente essa ânsia, especialmente da Galápagos, de lançar a maior quantidade possível de jogos no mais curto espaço de tempo, deve estar inviabilizando que a equipe de produção se dedique a cada jogo, do modo como deveria.
No entanto, eu gostaria de pontuar, que, se o motivo dos atuais erros dos jogos é esse ou não, isso pouco interessa para os consumidores e para a comunidade boardgamer, em geral. O interesse dos consumidores é apenas saber se o jogo é bom, se ele vale o valor cobrado, e principalmente se ele está correto, sem nenhum defeito mais grave.
Do mesmo modo, o lojista e não quer saber se aquele jogo é muito importante para aquele comprador, se ele será a pessoa mais infeliz do mundo se não puder tê-lo, e coisa e tal, porque para o lojista, o que realmente importa antes de tudo é se a pessoa tem dinheiro para compra o jogo ou não. Outras preocupações podem vir depois, mas elas serão sempre secundárias, em relação a essa primeira. No mesmo diapasão, a editora não quer saber se o lojista está tendo dificuldades, se a pandemia derrubou o faturamento da loja, se o lojista está à beira da falência e coisa e tal, porque o que importa para a editora é se o lojista pagou o não a fatura do último pedido. Com certeza, o hobby também envolve amizade, interesses mútuos, e tudo isso, até porque as pessoas acabam se conhecendo. Mas não se pode esquecer que acima de tudo, o mercado de board games é uma atividade empresarial, comercial e profissional, baseada em relações de consumo. Portanto a obrigação do designer é criar o jogo, a obrigação da editora é produzir o jogo, a obrigação do lojista é vender o jogo e a obrigação do consumidor é pagar pelo jogo. Todo o resto é periférico.
Em relação ao que você disse sobre os produtores de conteúdo, inicialmente eu quero deixar claro que acho todos eles muito importantes, para divulgar os jogos, para mostrar em que consiste o jogo, e talvez o mais importante, como ele funciona e como se joga. Não há, nem pode haver, nenhuma dúvida, de que sem os produtores de conteúdo, certamente o hobby jamais teria chegado aonde chegou.
Só que apesar da sua enorme importância, apesar do seu enorme conhecimento a respeito de board games, e apesar do seu acesso muito maior aos bastidores dessa indústria, do que o boardgamer comum, não se pode esquecer, que os produtores de conteúdo também não são os donos da verdade. Por isso, não dá para concordar imediata e automaticamente com tudo aquilo que é dito em um canal de board games, só porque quem disse foi o produtor de conteúdo A, B, ou C.
Além disso, tem um outro aspecto, que eu acho que deve ser levado em conta, que é a proximidade excessiva de alguns produtores de conteúdo com as editoras. Obviamente não são todos, que tem essa proximidade excessiva, mas todo mundo sabe, que muita gente recebe jogos das editoras para fazer os vídeos, e certamente não vai falar mal da empresa e nem do jogo, mesmo que isso seja justo. Evidentemente, se esses produtores de conteúdo fizerem isso, a editora simplesmente para de mandar jogos, e aí, adeus canal de board games.
Um exemplo disso, foi o Splendor Marvel, cujo lançamento nacional estava marcado para um determinado dia, e quase uma semana antes já havia alguns vídeos de unboxing e de review no Youtube. É lógico que o canal recebeu o jogo da editora, porque de outra forma, não haveria como o produtor de conteúdo, comprar o jogo uma semana antes do seu lançamento. Nem as lojas receberam os jogos com tanta antecedência.
Tem um outro episódio também, do qual eu acabei participando, e que é muito esclarecedor. Eu vi um vídeo, em que um produtor de conteúdo estava fazendo um unboxing da versão “de luxe” o jogo “Corrida Maluca”, baseado no famoso desenho dos anos 60, do prestigiado estúdio Hanna-Barbera. Nessa versão importada, as miniautras já vem pintadas, o que certamente despertou o interesse, não apenas o meu, mas o de muitas outras pessoas também. Eu fiquei naturalmente encantado, porque as miniaturas realmente ficaram muito bonitas, e foi nessa hora, que eu fiz uma pergunta, que eu declaro, perante Deus, e em nome dessa luz que me ilumina, que foi feita da forma mais inocente possível. Eu perguntei quanto o produtor de conteúdo havia pago por aquela versão “de luxe”, incluindo preço, frete e tributação, para poder comparar com o preço da versão normal da Galápagos, e ver se a diferença não era nada assim tão estratosférica, quanto eu imaginava. O produtor não me respondeu, mas um outro usuário escreveu, que, até onde ele sabia, por ocasião do Galápagos Spoiler Fest, onde a empresa divulga seus próximos lançamentos, todos os produtores de conteúdo que participaram do evento, tinham recebido uma cópia dessa versão “de luxe” do “Corrida Maluca”.
Eu não sei até que ponto isso é verdade, mas se for isso mesmo, aí, entorna o caldo, e a situação fica um pouco mais complicada. Tudo bem que os produtores de conteúdo têm de receber alguns jogos, para poderem fazer os vídeos, que eles tem de ser incentivados de alguma forma, e coisa e tal. Tudo isso eu compreendo. Mas também é preciso compreender, que da mesma forma, fica muito difícil, pelo menos para mim, acreditar na sinceridade da opinião de um produtor de conteúdo, quando ele fizer, por exemplo, um vídeo de review do Everdell da Galápagos, após ter recebido tamanho incentivo da editora, na forma de um “mimo” como a edição importada e muito luxuosa do jogo Corrida Maluca, com as miniaturas pintadas.
Pelo menos é assim que eu penso.
Um forte abraço e boas jogatinas.
Iuri Buscácio
P.S. Para quem que saber do vídeo de unboxing da versão de luxe do “Corrida Maluca”, basta acessar: https://www.ludopedia.com.br/topico/50966/wacky-races-deluxe-corrida-maluca-unboxing-minis-pintadas