rodrego::Iuri, ótimas ponderações, cara. O que você escreveu está tão de acordo com o que eu penso que vou deixar de postar um texto que estava fazendo com argumentos parecidos.
Gostei especialmente da sua visão mais ampla sobre o futuro do hobby, sobre essa sinuca em que estamos nos colocando fazendo jogos cada vez mais caros. O público se reduz, pois poucos têm condições de pagar o preço pedido, e além disso não se renova, pois quem está fora do hobby, mesmo se tiver grana, não acha que esses preços compensam.
Se o Khan for um sucesso de vendas dentro do hobby, ele pode estar descobrindo um nicho: jogos do tipo "prato principal" da noite de jogatina por preços condizentes com a realidade brasileira, mesmo que à custa de componentes de qualidade muito inferior.
A Estrela fez o jogo pensando no mercado de massa, claro. Essa discussão sobre qualidade de componentes para esse mercado é irrelevante. Uma amiga minha de fora do hobby, que comprou o jogo, me mandou uma foto do cachorro deitado em cima do tabuleiro com a legenda "seu jogo tem um fã canino". A realidade fora do hobby é essa, as pessoas realmente não se importam com componente, não fetichizam.
Mas será que não é viável adotar uma estratégia semelhante à da Estrela, mas focada no nicho? Talvez sem cartas destacáveis ou manual monocromático, mas fazendo uma série de concessões para conseguir colocar o preço final do jogo num patamar viável.
Se uma empresa conseguir esse equilíbrio, quem atualmente se sente excluído do hobby por não ter grana pra pagar 400, 500, 800 reais num jogo, e não quer ter uma coleção apenas de jogos pocket, poderá voltar a consumir. Se eu fosse uma editora, estaria observando atentamente o desempenho de vendas do Khan. Caso seja um sucesso dentro do hobby (e me parece que está sendo), talvez valha à pena explorar essa avenida que a Estrela abriu.
E pra quem me perguntou se estou frustrado por ver um projeto de anos ser produzido com baixa qualidade de componentes: é o oposto. Estou muito feliz (e falo pelo Lucas tb) de ter um jogo com tiragem de 10 mil cópias que vai poder ser encontrado no Brasil inteiro por um preço acessível.
Caro Rodrigo
O atual cenário do board game nacional é como eu falei no tópico: os jogos nunca estiveram tão caros, e mesmo assim as empresas não estão ganhando tanto dinheiro assim. As editoras estão presas em um limbo de 2.000 cópias a R$ 500,00 a unidade, ou em alguns casos, 1.000 cópias a R$ 1.000,00 a unidade. Essa zona de conforto, em que se arrisca pouco mantém as portas abertas, mas também impede as editoras de crescerem.
Recentemente a Meeple BR anunciou o lançamento do Tainted Grail, que é outro simulador de RPG, super imersivo, com miniaturas magníficas, “lindo de morrer”, e que custa R$ 850,00. Com todo o respeito aos apreciadores do jogo, mas a última coisa que o hobby precisava era de mais um simulador de RPG, lindo, imersivo, com miniaturas fantásticas, por R$ 850,00. Esse será mais um produto para meia dúzia de privilegiados.
O que o hobby precisa é de jogo bom e barato. Com a quantidade de jogos que são lançados anualmente, no mundo todo, fica difícil acreditar que não exista um jogo um pouquinho mais complexo, e que possa ser produzido na casa dos R$ 200,00 / R$ 250,00. Hoje a impressão que se tem é de que qualquer jogo já sai na casa dos R$ 400,00, tenha ele a complexidade e a quantidade de componentes que tiver. Essa alta de preços já está refletindo na comunidade boardgamer. As pessoas estão ficando mais seletivas, porque com esse preços, e com a quantidade de lançamentos, é simplesmente inviável comprar tudo aquilo que se gostaria. Isso quer dizer que as pessoas estão comprando menos board games, o que é ruim para o mercado e para as editoras. Nós estamos chegando ao extremo de alguns board games estarem tão caros que as pessoas já falam em juntar dinheiro e se programarem para conseguir comprar alguns títulos. Quem esta aguardando o “Descent: Lendas da Escuridão” que o diga.
Na contramão disso tudo, chega o “Herdeiros do Khan”, e o selo Estrela Premium Games.
A carência da comunidade boardgamer menos abastada é tanta, que esse jogo, que definitivamente não foi produzido tendo em mente esse público, está despertando o interesse de muita gente, dentro do hobby. Mesmo os componentes não sendo no padrão a que estamos acostumados, dá para pagar o preço do jogo, sem ficar preocupado com as contas das casa ou com as compras de mês.
Sinceramente eu desejo com todo o ardor que o "Herdeiros do Khan" seja um sucesso e que venda aos borbotões, a ponto das editoras começarem a reverem suas estratégias e políticas de preços. Evidentemente ninguém espera que as editoras passem a produzir 10.000 cópias de uma hora para outra. Mas o que se espera é que elas pensem em produzir um pouco mais do que a tiragem padrão de 2.000/3.000 cópias, a um preço mais baixo, e principalmente que comecem a focar mais em jogos baratos.
Uma opção totalmente viável é se concentrar em autores nacionais. Certamente existem diversos designers brasileiros com jogos ótimos no portfólio, e que seriam muito mais baratos de produzir, do que os grandes sucessos internacionais, da CMON, Fantasy Flight, Days of Wonder, Ravensburger e assemelhadas. Nesse sentido o lançamento do Estrela Premium Games pode significar uma verdadeiro ponto de virada na história do board game nacional.
Por fim, eu acho que o fato de nós estarmos discutindo isso dentro da comunidade board gamer é um indício fortíssimo de que as coisas começaram muito bem, e de que estão rumo certo.
Um forte abraço e boas jogatinas.
Iuri Buscácio
P.S. Rodrigo se você me permite o ousio de uma pergunta, o "As Viagens de Marco Polo" e "As Viagens de Marco Polo II", foram fontes de inspiração para o "Herdeiros do Khan", não foram?