Fabico::Antes de tudo, parabéns por mais um excelente texto, deixo aqui minha opinião que vai na contramão do que muitos estão dizendo:
Quando eu vi o anúncio da Estrela no mercado e o preço de Herdeiros do Khan já pensei "pronto, é isso que precisávamos, chega de lançamentos todos acima de 400 conto (exceto party games e afins). Comprei na pré venda da da loja do Jeff Bezos (para não citar nomes), sem mesmo pesquisar muito a respeito do jogo em si, apenas para fazer parte disso tudo.
Quando o jogo chegou, que decepção, obviamente não esperava uma qualidade padrão, mas o que veio estava MUITO aquém de qualquer expectativa, se não tivesse comprado de site famoso eu teria pensado que caí em algum golpe e me venderam um jogo pnp impresso em casa. Não estou exagerando, os tiles e tokens tem quase a mesma qualidade/gramatura de cartas de jogos premium, já as cartas (destacáveis tipo punchboard) tem a mesma qualidade e material de manual de regras de jogo padrão normal, mas e o manual então que qualidade tem? feito de papel de jornal, todo azul (não tem nem cores), a caixa do jogo é do pior papelão possível (daqueles que você rasga e vê os "tubinhos" internos), daquelas que estão sempre brilhando e refletindo (mesmo se não houver luz no recinto), quase joguei a caixa fora e guardei na caixa da companhia de entrega.
O jogo em si é bem divertido, entrega o que promete, cumpre bem sua proposta, personagens com poderes legais, boa dose de aleatoriedade, se eu fosse alterar alguma coisa na jogabilidade seria a ficha de Karakorum ter dois lados diferentes para mudar um pouco mais (não faz sentido os lados serem iguais). O símbolo da estrela nas cartas e as peças de ludo eu achei bem interessante, quiçá nostálgico. Inclusive não entendi esse "bafafá" todo a respeito das peças de ludo sendo que elas são de longe (anos luz realmente) os componentes de melhor qualidade no jogo, talvez os únicos componentes aceitáveis no jogo são essas peças.
Me sinto até mal de escrever essas palavra do primeiro jogo dos artistas, porém o trabalho deles foi bem feito e eu no caso deles me sentiria no mínimo "frustrado" pelo que a Estrela fez com o projeto deles.
Dito tudo isso, em minha opinião a consequência de baratear os jogos no mercado acabou se tornando um tiro que saiu pela culatra, e acabou gerando um argumento para as outras editoras "400 reais não é caro para lançamentos como Paris, Lewis and Clark, Hadara, e todos os outros atuais, para que não seja entregue essa qualidade detestável em forma de jogo que a Estrela lançou com a audácia de chamar de Premium". Sinceramente sinto que abriu "jurisprudência" para cobrar mais caro e se diferenciar/distanciar de produtos de qualidade no mínimo duvidosa. Pra Estrela realmente mudar algo no mercado (para o bem, isto é, abaixar os preços da concorrência) vai ter que mudar drasticamente a qualidade do que produz, ou focar em uma linha Legacy pois esse primeiro jogo parece que tem componentes descartáveis.
Por fim, é senso comum achar que o hobby está caro, pois realmente está (sempre foi na verdade, caso contrário não seria um "hobby", mas agora está "agressivamente" caro). Mas pra mim o pior de tudo é quando aparece alguém dizendo "está cheio de jogos baratos no mercado, vocês que só querem os caros", aí você vai ver e o cara tá falando de jogos pocket, party games que possuem algumas cartas e nada mais, joguinhos simples que poderiam praticamente ser jogados com baralho, etc, tudo na faixa de 50, 70 e até 100 reais ou mais, parece que estão debochando da nossa cara, ao meu ver dizer "existem boas opções baratas" se referindo a esses jogos citados é o mesmo que dizer "motoristas e entregadores de aplicativos não ganham mal, o cliente pode dar gorjeta", e ter um jogo de componentes com qualidade muito baixa como esse sendo essa opção barata para as pessoas que tem uma renda mais baixa pra mim é a mesma coisa, é como dizer "você até pode jogar jogos em sua casa como os outros fazem, mas atenha-se aos jogos praticamente infantis ou aos descartáveis.
Caro Fabico
Fico muito satisfeito que você tenha gostado do texto, e só lamento que essa apreciação não tenha se estendido ao “Herdeiros do Khan”, e nessa seara, mui infelizmente eu sou forçado a discordar de você.
Nem oito e nem oitenta, certamente que os componentes do jogo não têm o padrão que se esperava, mas também eles não são tão ruins assim. Muito do que você escreveu, na verdade corresponde ao padrão Estrela de jogos. Por exemplo, nenhum jogo Estrela, pelo menos até onde eu sei, usa caixas de papelão rígido, ou cartas com gramatura maior, portanto não seria crível esperar que o “Herdeiros do Khan” fosse diferente.
Eu entendo a sua indignação com os componentes, e algumas pessoas da comunidade pensam da mesma forma. No entanto, é preciso ponderar que o conceito do que é aceitável e do que não é, trata-se de um parâmetro flexível e que varia de pessoa para pessoa. Para algumas o padrão dos componentes do “Herdeiros do Khan” está abaixo do aceitável, seja pelo preço que for, enquanto que para outras, esses mesmos componentes, possuem um padrão, que apesar de baixo, ainda está dentro do aceitável, principalmente se for considerado o preço.
Outra discordância minha, em relação ao seu comentário, diz respeito à influência do “Herdeiros do Khan” sobre o preço dos board games tradicionais. Não dá nem para começar a justificar que o “Herdeiros do Khan” teria componentes horríveis porque custa apenas por volta de R$ 100,00, e que por isso, os preços de jogos como Tainted Grail (R$ 850,00) e El Grande Big Box (R$ 800,00), da Meeple BR, e “As Ruínas Perdidas de Arnak” (R$ 600,00) e Stone Age (R$ 500,00) da Devir, estariam ótimos, porque os componentes são excelentes. Acho que esse argumento sequer será cogitado, principalmente porque já existem diversas outras justificativas para os preços altos dos board games.
Em primeiro lugar, cobrar R$ 800,00 por um jogo de tabuleiro está completamente fora da realidade brasileira, inclusive de boa parte da comunidade boardgamer. Esse valor será sempre muito dinheiro, independente da qualidade dos componentes que o jogo apresente. Experimente perguntar a qualquer pessoa que não seja do hobby, se ela faria esse tipo de compra, e veja o que ela vai dizer.
Em segundo lugar, é preciso considerar que os jogos já apresentavam preços altíssimos, muito antes da Estrela sequer cogitar lançar o selo Estrela Premium Games. E as explicações sempre foram outras, alta do dólar, pandemia, tamanho das tiragens, impostos, etc. E mesmo que o dólar apresente uma variação para baixo, os preços continuam a subir, porque sempre aparecem outras despesas como aumento do frete e coisa e tal. Além disso, há se fazer certas ponderações.
Em terceiro lugar, não dá para deixar de citar que o “Herdeiros do Khan” veio com componentes de baixa qualidade, mas que estão todos corretos. O mesmo não se pode dizer de alguns outros jogos de empresas tradicionais de board games. Basta lembrar o “Masmorra do Mago Louco”, da Galápagos, com a inesquecível carta de “Guereira”. Basta lembrar o “Nemesis”, também da Galápagos, com um manual completamente equivocado porque a tradutora resolveu transformá-lo em um manifesto ideológico, isso sem falar nas diversas cartas cujo texto traduzido, diz exatamente o contrário do texto original correto. Basta lembrar o “Western Legends”, da Conclave, em que a empresa usou na versão nacional o tabuleiro de uma edição, e as cartas e componentes de outra edição, que são incompatíveis entre si. E olha que não precisa nem falar no “enpansão” na caixa da expansão do Twilight Imperium. A diferença é que nenhum desses jogos custou R$ 100,00.
Portanto fica claro que problemas com componentes não são uma exclusividade da Estrela, só que no caso do “Herdeiros do Khan” os boardgamers mais radicais dizem que ele é um lixo que não merece uma chance. Mas no caso da Galápagos, Conclave, e assemelhadas, o discurso muda para “os componentes estão com problemas, mas não atrapalha a jogatina”, “o manual e as cartas estão mal traduzidas, mas dá para deduzir a regra”, “a carta veio errada, mas dá para consertar”, entra outras pérolas da passividade. Veja que eu não estou querendo comparar os jogos, mas apenas o tipo de postura dos baordgamers, perante jogos com problemas de componentes.
Pessoalmente, eu continuo achando muito mais provável, que o impacto do “Herdeiros do Khan”, sobre o mercado de board games, seja no sentido de que as editoras tradicionais procurem lançar concorrentes ao jogo, possivelmente com componentes melhores e preços mais próximos. Mas isso é pura especulação, muito influenciada pelo meu desejo pessoal por um hobby maior, mais acessível e includente.
Nesse aspecto, eu concordo contigo de que há uma necessidade real, por jogos complexos mais baratos, para suprir a parcela da comunidade boardgamer, que aprecia esse tipo de jogo, mas não tem condição de pagar R$ 500,00, por um jogo de tabuleiro. Se algo não for feito nesse sentido, essas pessoas realmente vão acabar tendo de se contentar com jogos festivos ou familiares, do modo como você escreveu no seu comentário. Isso não é bom, nem para quem cria, nem para quem produz, nem para quem vende e muito menos para quem compra boardgames.
Para terminar, eu acredito que a qualidade dos componentes seja uma questão objetiva (gramatura das cartas, espessura da caixa, acabamento das peças plásticas, etc), mas se essa qualidade será aceitável ou não, aí a questão passa a ser subjetiva, ou seja, uma questão de opinião. Por isso, mesmo discordando da sua opinião caro Fabico, ainda assim eu a respeito, e de certo modo até entendo. Afinal de contas opinião foi feita para ser respeitada, mesmo que não se concorde com ela.
Um forte abraço e boas jogatinas.
Iuri Buscácio