Jogando com música - algumas dicas
Desde que conheci os jogos de tabuleiros modernos, tenho utilizado trilhas sonoras e música incidental para melhorar a experiência à mesa. Acredito que uma boa trilha sonora em um jogo de tabuleiro traz inúmeras vantagens: ajuda na concentração dos jogadores, realça o tema do jogo e cria imersão e ambientação.
Muitas editoras parecem concordar com este conceito, pois é comum vermos jogos com trilhas sonoras oficiais, como Fireteam Zero, Mysterium, Last Night on Earth, Shadows of Brimstone e 7th Continent.
Porém, quando o jogo não vem acompanhado de uma bolachinha cromada, cabe aos jogadores montar suas próprias trilhas, e o propósito deste artigo é justamente compartilhar alguns dos critérios que utilizo na escolha das minhas trilhas.
PESQUISA – A PARTE MAIS DIVERTIDA
O primeiro passo é analisar qual é o tema do jogo – e isso vale, inclusive, para o euro típico com tema meramente incidental, pois é a partir deste tema que iremos buscar a nossa trilha sonora.
Eu tenho um gosto musical bastante eclético e abrangente - na minha estante de CDs você vai encontrar de tudo: Genesis, Ella Fitzgerald, Clannad, Alan Jackson, Bach, etc. E isso facilita muito na hora de selecionar músicas. Porém, na maioria dos casos eu acabo fazendo uma boa pesquisa, que é uma das partes mais divertidas do processo.
Meu critério fundamental é ver em qual período ou época está ambientado o jogo, e qual é o tipo de música desse mesmo período.
Para uma pesquisa rápida, a Wikipedia ajuda bastante. Mas você pode procurar também sites de gravadoras, como a Naxos (que possui muita informação em suas páginas na internet, como biografias, informações históricas e créditos dos CDs) ou sites de musicologia.
Particularmente considero isso muito importante. Cada era ou período histórico tem sua própria música, e uma trilha historicamente fiel é essencial.
Veja, por exemplo, as trilhas que usei para Órleans (música de trovadores medievais), London (Barroco inglês), Agrícola (grandes mestres do Barroco alemão) ou Ganges (música hindustani); cada uma tem características bem peculiares, e isso deve ser levado em conta, sempre.
No caso de jogos derivados de filmes, séries de TV ou animações, sempre procuro utilizar suas respectivas trilhas sonoras, justamente por remeter ao filme ou série que inspirou o jogo. Mas, em alguns casos muito específicos, eu recomendo criar sua própria playlist ao invés simplesmente apertar o play e pôr o álbum para tocar – músicas como Lapti Nek ou Cantina Band destoam completamente da ambientação exigida para jogos como Imperial Assault ou Star Wars Rebellion.
Um jogo com tema de fantasia, mitologia ou ficção-científica, que não possui tema ou ambientação histórico abre mais possibilidades, permitindo utilizar música ambiente instrumental, new age ou mesmo soundscapes inspirados em fantasia, folclore ou ficção-científica. Para dar alguns exemplos, sugiro minhas trilhas para Merlin, Kemet ou Pulsar 2849.
Outra situação que surge ocasionalmente é quando o jogo não tem período histórico definido e o tema é bastante abrangente. Nesse caso, eu tento buscar inspiração pela arte ou pelas situações apresentadas no jogo. Foi o que fiz com Food Chain Magnate (inspirado pela arte, utilizei rock instrumental do final dos anos 50) ou Fungi (busquei álbuns que mesclam música com sons da natureza).
QUAL O TIPO DE MÚSICA?
Eu busco, preferencialmente, música instrumental, pois canções com letras podem distrair os jogadores, principalmente se forem muito conhecidas – mas, mesmo neste caso, há exceções, como fiz com Great Western Trail.
Quanto à mídia a ser utilizada, eu prefiro plataformas de música, pois evitam o trabalho de interromper o jogo para trocar o CD toda hora, além de facilitar a criação de uma playlist particular (CD players mais antigos tinham bandejas para vários discos e permitiam selecionar as faixas de um CD, mas hoje nem todo aparelho traz estes recursos, infelizmente).
E, quando possível, escolha mais de um CD. Repetir sempre o mesmo álbum num loop pode ficar muito chato depois de um tempo.
USANDO LISTAS DE REPRODUÇÃO – OU NÃO
Vocês verão em meus artigos que eu nunca montei ou sugeri uma lista de reprodução (playlist), embora várias vezes tenha recebido pedidos nesse sentido. Há alguns motivos para isso.
Primeiro: nem sempre eu uso o Spotify, mas sim outros sites de streaming, como o Bandcamp e o Soundcloud, que não têm esse recurso.
Segundo: é raro, mas acontece de certos discos saírem do Spotify. Isso aconteceu com as trilhas sonoras de Castle Wolfenstein e Piratas do Caribe: A Maldição do Pérola Negra (este último retirado do Spotify pela Disney há vários anos). Se você monta uma lista com um álbum que posteriormente é removido, sua lista torna-se inútil.
Outro motivo é que estou sempre buscando ouvir coisas novas, e muitas vezes acrescento, retiro ou troco discos das minhas sugestões. Se tivesse uma lista previamente montada, seria um trabalho a mais.
Porém, há exceções, como as trilhas sonoras de filmes ou séries de TV. Como disse acima, as músicas de uma trilha sonora são criadas para cenas específicas de um filme ou série, e nem todas se adaptam bem como música de fundo para jogos.
Enfim, eu não costumo utilizar regularmente mas confesso que acho uma ferramenta bastante prática em certos casos.
"E O MELODICE?"
Olha, eu detesto esse site. Mesmo. Aliás, foi uma das coisas que me levou a criar minhas próprias trilhas.
Há várias razões para isso, mas principalmente porque a seleção dele é limitada ao que está no Youtube, e como qualquer um pode adicionar o que quiser às playlists dos jogos, muitas vezes as músicas selecionadas não têm absolutamente nada a ver com o jogo em questão.
Claro, às vezes, numa emergência, pode ser melhor que nada. Mas eu não uso.
MUSICANDO O JOGO
Após definir sua trilha, é hora de coloca-la à mesa. E aqui vem uma dica importante: atenção com o volume! Se for muito alto, poderá distrair e até mesmo incomodar os jogadores; por outro lado, se estiver muito baixo, não terá o efeito desejado. O ideal é que fique num volume audível, mas que não atrapalhe a conversa entre os jogadores.
Veja, por exemplo, o modo que uma trilha incidental é utilizada em uma série de TV durante uma cena expositiva para ter uma ideia: você percebe a música, ela ajuda a compor a cena, mas não desvia sua atenção do que está acontecendo. E é isso que buscamos durante o jogo.
Espero que este breve artigo, e as dicas aqui apresentadas, sejam de grande valia na hora de ajudá-los a selecionar suas trilhas sonoras.
Até a próxima!
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