Shem Philips nos presenteou nos últimos anos com três jogos maravilhosos, leves, é verdade, mas muito redondinhos. A trilogia, chamada de North Sea Saga, em alusão ao livro de mesmo nome (Paul Jordan, 2004), se passa durante o período da aventura dos vikings pelo mar, desbravando novos territórios, pilhando e conquistando tudo o que havia. Eu falei sobre essa saga há cerca de 2 anos atrás neste outro texto aqui do canal, pedindo pra que os jogos chegassem ao Brasil.
Iniciada com Shipwright of the North Sea, passando por Raiders of the North Sea (esse, lançado pela Meeple BR Jogos com o nome de Invasores do Mar do Norte agora no começo de 2018) e culminando em Explorers of the North Sea, a trilogia apresenta jogos com excelente produção, arte linda e jogabilidade fácil, rápida e fluída. Explorers é o mais leve dos três, sendo o que tem mais cara de family game, uma vez que não tem o temido take that presente nos outros dois jogos, e também por ter regras mais fáceis de assimilar.
Não foi assim que você imaginou vikings explorando o mapa, foi?
O APOGEU DA ERA VIKING
O Mar do Norte é a parte do Oceano Atlântico que adentra parte do continente europeu e banha os países escandinavos e também Alemanha, França, Holanda e até parte das Ilhas Britânicas. De água geladas e ventos fortes, as águas da região foram marcadas pela disputa territorial de diversos povos, entre eles, os vikings. Originados principalmente da Dinamarca e da Noruega, esse povo avançou por diversos outros territórios sendo que sua invasão da Inglaterra um dos períodos mais marcantes de sua história.
O apogeu dessa civilização, no entanto, se deu quando desenvolveu melhor o comércio e passou a dominar a navegação do Mar do Norte, com forte influência política, militar e comercial na região. Esse período, que durou entre os anos 800 e 1050, é o retratado na trilogia de jogos, sendo que cada um deles foca em um dos aspectos da história viking: a construção de barcos e domínio das técnicas de navegação (
Shipwrights); as invasões do norte europeu e o período em que foram chamados de bárbaros (
Raiders); e, finalmente, seu avanço sobre as ilhas, domínio do mar e o estabelecimento do comércio (
Explorers).
Explore ilhas distantes e descubra o que nelas pode ser mais interessante.
EXPLORADORES DO MAR DO NORTE
Em
Explorers of the North Sea, jogo que tem colocação de tiles e pegar e entregar como suas mecânicas principais, precisamos primeiro desbravar e alcançar as ilhas distantes para só depois ter a oportunidade de saquear, marcar território e pilhar os espólios. Cada jogador representa um clã viking, com seu barco, 6 bravos soldados e uma missão: se tornar o melhor explorador viking do
Mar do Norte.
Às vezes você irá precisar de um grande poder militar.
A dinâmica do jogo, no entanto, é bem simples. Em sua vez, o jogador deve (ação obrigatória) colocar um tile no jogo, ou seja, aumentar o mapa e os lugares possíveis de exploração. Mas essa ação pode ser muito benéfica se ela estiver ajudando o jogador a aumentar o tamanho de uma ilha, colocando barcos para serem atacados, assentamentos que possam ser pilhados ou ainda animais que podem ser saqueados. Boa parte da estratégia do jogo já começa aqui.
Construir postos avançados é uma das maneiras de fazer pontos no jogo.
A regra de colocação de tile é aquela padrão
Carcassonne, os lados da peça devem combinar com as que já estão no tabuleiro, ou seja, ilha com ilha, água com água. No entanto, como as peças tem formato hexagonal, isso pode ser um grande desafio pois, por mais que seja — em 99% das vezes — possível colocar a peça, nem sempre o lugar onde ela vai se encaixar é bom pra você.
A ficha de jogador auxiliar a lembrar as ações possíveis, as formas de pontuar e também sua habilidade.
Num segundo momento, o jogador da vez então pode executar 4 ações, distribuindo como achar melhor. Entre as ações possíveis estão mover seu barco com a tripulação, embarcar ou desembarcar vikings ou animais nos barcos, mover um ou dois vikings pelas ilhas ou construir postos avançados (com custo de 2 ações). Ao final de suas 4 ações, o jogador compra um novo tile, para ter sempre 3 na mão, e passa a vez para o próximo jogador que irá, também realizar sua jogada nessa ordem (colocar um tile, realizar 4 ações, comprar um novo tile).
PILHAR, CONSTRUIR E DOMINAR
O objetivo de
Explorers é ter o clã mais forte, com mais pontos. Pra isso, é possível realizar diversas tarefas que, ao final do jogo, irão pontuar como um
set collection, ou seja, uma combinação de pontos pelo que cada um realizou. Ter animais diferentes, controlar grandes ilhas e perder homens em combates são alguns dos critérios de pontuação. É bem fácil de entender o que você deve fazer e esses pontos também estão o tempo todo à sua vista, na sua ficha de jogador que, além de servir como
player aid, também te dá uma habilidade especial, ou melhor, um bônus único para pontuar no final da partida.
Perder homens em batalhas no mar não é, por incrível que pareça, uma coisa ruim.
Por exemplo, um dos critérios para pontuar é ter uma coleção de pilhagens feitas, levando seus homens até os assentamentos das ilhas e conquistando o local. Para cada pilhagem feita é sorteado uma peça com pontuação aleatória, que pode varia de 2 a 5 pontos. E, é possível, que seu personagem te dê o bônus de 1 ponto adicional para cada marcador de pilhagem conquistado ao final da partida.
Ou seja, o jogo ainda te direciona no que é melhor fazer de acordo com sua habilidade única e você pode focar nisso para tentar maximizar seus bônus, ao mesmo tempo em que realiza as outras ações. O jogo não é aquele cobertor curto, que geralmente os
eurogames costumam ser, sendo possível fazer bastante pontos tentando fazer um pouco de tudo.
Um longo caminho a percorrer.
Por outro lado, muitas coisas no jogo devem ser planejadas. Por mais que seja possível, por exemplo, sair saqueando outros barcos para levar seus homens a morrer em batalha e ganhar glória, isso vai fazer você ficar sem vikings bem rápido no começo da partida e talvez você precise muito deles pra pilhar, carregar animais e para controlar diversas ilhas. Então, você precisa de planejamento, mesmo que seja mínimo.
VIKINGS, MAS NÃO TANTO
Esqueça Ragnar e tudo o que você viu na popular série
Vikings, do canal
History Channel.
Explorers of the North Sea é um jogo leve e rápido que não se aprofunda demais na temática viking e deixa de fora toda a mitologia consagrada desse povo e que é bastante utilizada na maioria dos jogos que aborda esse tema. Toda a trilogia, na verdade, foca muito mais nos traços culturais e de civilização e deixa de lado as questões religiosas como os deuses,
Valhala, e etc.
Vários personagens com habilidades diferentes: todos te ajudam a alcançar a glória!
Apesar de essa ter sido uma decisão controversa e que desagradou muitos jogadores (muita gente reclama que o designer poderia ter usado algum elemento da mitologia), eu acredito que foi uma decisão correta, porque manteve o jogo com um tema mais familiar (apesar das mortes em combates), menos carregado de elementos que, muitas vezes, incomodam certa parcela dos jogadores. Eu mesmo sou um que não costumo gostar de jogos com muita mitologia em cima — principalmente se for
Cthulhu.
Essa pegada mais leve do
Shem Philips em seus jogos me agrada bastante e acredito que mesmo o tema não sendo algo tão profundo nos jogos, a arte maravilhosa do
Mihajlo Dimitrievski — que a gente já chama de
Mico porque tem intimidade — compensa e nos joga numa imersão meia boca, mas que serve. Se você curtiu Invasores do Mar do Norte, há grandes chances de gostar também de
Explorers of the North Sea.
Mais imagens do jogo (clique para ampliar):