Marajoarafoi um dos grandes destaques do ano no cenário nacional de jogos de tabuleiro. Fugindo das temáticas mais comuns do mercado, o jogo transporta os jogadores para o universo da arqueologia brasileira, mais especificamente para a fascinante cultura marajoara — civilização que habitou a Ilha de Marajó, no Pará, entre os séculos 4 e 14, e que é amplamente reconhecida por sua cerâmica elaborada e seu legado artístico e cultural.
Conversamos com o designer Daniel de Lucca para conhecer os bastidores da criação de Marajoarae os caminhos que o levaram ate o jogo final.
Visual do jogo na mesa durante a partida
Ludopedia: Parabéns ! Sua estreia como designer já veio acompanhada de um prêmio importante. Como foi viver esse reconhecimento logo no seu primeiro lançamento?
Daniel: Muito obrigado! Receber este prêmio foi muito mais do que eu poderia imaginar quando comecei o projeto lá em 2020. Vi a Meeple BR ganhando o prêmio Ludopedia com grandes nomes como o Leandro Pires, Ricardo Amaral, Zé Mendes e entrar pra esse hall de designers é inexplicável! Como eu disse na premiação, é uma felicidade imensa poder ser reconhecido por algo que traz felicidade para as pessoas. A única forma de retribuir esse sentimento é fazendo mais e mais jogos.
Partida em andamento de Marajoara
Ludopedia: O jogo coloca os jogadores no papel de estudiosos que escavam e restauram a arte cerâmica Marajoara. Como surgiu essa escolha temática, que mistura arqueologia, patrimônio cultural e museologia?
Daniel: A mecânica do jogo veio primeiro do que o tema. O jogo teve sua primeira versão com o tema de Chernobil (é.. pois é rsrs) e desde que abandonei essa ideia inicial, a segunda já era algo relacionado a arqueologia. Queríamos algo que remetesse à cultura brasileira e durante o processo, o Márcio Botelho que era do marketing da Meeple BR veio com a ideia dos vasos Marajoara e foi extremamente assertivo! Depois que a temática veio, junto com ela veio novas ideias de implementação de mecânicas secundárias que deram este toque único ao jogo e que exalta algo tão pouco falado, porém tão importante para a nossa cultura.
Ludopedia: Um dos grandes destaques do jogo é a mecânica central inspirada no "Resta Um", com dados que não são rolados, mas pulam, evoluem e se reciclam. Como nasceu essa ideia ?
Daniel: A ideia veio quando eu estava com Trajando Feld na cabeça e vi na tv pessoas jogando resta um com feijões. A mecânica veio na hora: porque que nunca fizeram um euro onde usasse o resta um como uma seleção de ações, assim como Trajanusa a mancala. A partir daí comecei a testar algumas coisas. A ideia era muito legal mas ainda faltava algo. Foi então que veio a ideia de serem dados que evoluem, trazendo um dinamismo muito maior e elevou essa mecânica ao seu máximo.
Protótipo físico de Marajoara durante o processo de desenvolvimento
Ludopedia: Estrear no mercado com um jogo tão original e desafiador não é comum. Como foi esse processo para você ?
Daniel: Acho que eu tive muita sorte de ter meu primeiro trabalho lançado feito de mãos dadas com a Meeple BR. Como foi desenvolvido a partir das mecânica, desde o início com o estúdio Glyptodon (estudio da Meeple BR), Isso permitiu que eu aprendesse muito ao longo do caminho sobre balanceamento, sobre o mercado e tudo mais. Tive oportunidade de trabalhar com pessoas maravilhosas e ao mesmo tempo me deram muita liberdade criativa e de escolha do que ficaria ou não. Foi um trabalho muito gratificante de se fazer e que quero repetir outras vezes.
Peças dos vasos Marajoara para expor em seu museu
Ludopedia: O jogo passou por muitas fases durante o desenvolvimento. Que tipo de mudanças você enfrentou nesse processo?
Daniel: O Marajoara surgiu de um jogo muito maior, euro médio com pitadas de 4x. Assim como Trajan, a ideia era ter um jogo grande que tivesse uma mecânica inusitada como seleção de ações e tableau building. Por outro lado, a Meeple BR pensava em um produto com uma estratégia mais leve, com a mecânica do resta um no centro de tudo e todo o resto como apoio a esta mecânica. Está mudança de paradigma foi desafiadora e muito divertida de se fazer. Foram 23 versões com mecânicas secundárias diferentes, sempre pensando em como apimentar mais a mecânica principal e nunca a diminui-la. Manter a filosofia do menos é mais foi um aprendizado para mim.
Carrinho de mão utilizado durante o jogo
Ludopedia: O visual de Marajoara impressiona e se conecta muito bem com a proposta do jogo. Como foi o trabalho com a equipe da Meeple BR para chegar a essa identidade visual tão marcante ?
Daniel: Desde o início, o processo foi altamente colaborativo. A mecânica do 'resta um' exigia um cuidado especial para que os dados se encaixassem bem, o que levou à decisão de criar um tabuleiro de dupla face, garantindo que a movimentação dos dados fosse muito mais fluida e funcional. Outro ponto importante é que, nos protótipos digitais, eu utilizava tabuleiros individuais, em um estilo parecido com Mandala Stones. Foi o Diego, porém, quem teve a ideia de integrar tudo na própria caixa, e essa solução acabou se tornando a cereja do bolo.
Enriquecendo o projeto, a artista Carmen Ferreira Martinez uniu todos os elementos artísticos com harmonia. O resultado é um jogo que se destaca tanto pela mecânica quanto pelo seu visual, tornando Marajoara um produto único.
Os dados em destaque no tabuleiro de Marajoara
Ludopedia: Com um prêmio na bagagem e um jogo tão elogiado, o que podemos esperar a seguir? Você pretende expandir o universo de Marajoara ou já está desenvolvendo projetos com novas temáticas?
Daniel: Quero tirar do papel muito projeto que tenho parado. Já tenho algumas surpresas pela frente com a Meeple BR e a Glyptodon que em breve poderei revelar. Quero continuar trabalhando temas brasileiros mas sem fechar o escopo para outros temas que eventualmente possam aparecer.
Obrigado mais uma vez a todos que votaram no Marajoara, aos influencers que apoiaram este jogo desde o começo e a Ludopedia por este prêmio tão importante para mim e para minha carreira.
Daniel de Lucca com a sua obra
Marajoara: o que vem na caixa e overview
Veja o cerimônia completa da entrega dos troféus para os melhores do ano
Excelente entrevista! É muito bom ver jogos criativos e divertidos nascerem de designers brasileiros, ainda mais quando usam idéias simples e que remetem a infância.
Pra mim foi uma das melhores surpresas do ano!
Adorei a jogabilidade e ainda mais o conceito por trás, o jogo é tão criativo que me inspirou a fazer um jogo próprio sobre arqueologia e pesquisa científica.
Prêmio merecido, jogo excelente que merece fazer todo o sucesso possível dentro e fora do Brasil, e nem vou comentar sobre o design de produto que é perfeito e impecável. Queria que outros jogos usassem essa ideia maravilhosa de caixa e tabuleiro como um só.
Que venham os prêmios internacionais e a expansão!