tuliobarros::JedoLar e brunotron, permitam-me discordar de vocês. Com base no comunicado, o que se percebe é o apagamento da marca Galápagos, estamos diante de uma estratégia de rebranding e há implicações:
A Transição Galápagos-Asmodee: Consolidação Global e o Fim de uma Identidade Local
O comunicado anuncia mais do que uma simples atualização de identidade visual: trata-se da substituição integral e definitiva da marca Galápagos pela marca global Asmodee no mercado brasileiro. Apesar da narrativa que enfatiza continuidade ("não desaparece, se transforma", "mesma paixão") e do histórico de integração desde 2018, a decisão representa um movimento estratégico claro de apagamento controlado da marca local. Há uma perda do interesse para a gestão da marca Galápagos e isso se reflete na gestão, não mais da Galápagos ou de uma "Asmodee Brasil", mas das operações da Asmodee no Brasil.
O que nós podemos ter como implicações técnicas?
- Priorização Absoluta da Marca Global: O texto explicita que a mudança é parte de uma "transformação global". Isso significa que a estratégia corporativa da matriz Asmodee (unificação de marca mundial) sobrepôs-se aos potenciais benefícios de manter uma marca local consolidada, como a Galápagos, no Brasil. O "legado" da Galápagos é mencionado como valor simbólico a ser absorvido pela Asmodee, não como um ativo de marca a ser gerido autonomamente. Consequentemente, todos os recursos estratégicos (marketing, comunicação, trade marketing) serão canalizados exclusivamente para construir e fortalecer a marca Asmodee, numa estrutura rigidamente top-down.
- Centralização e Padronização: A adoção da "nova identidade visual global" e o rebatismo de eventos como o "Asmodee Experience" sinalizam uma forte centralização das decisões de marca e comunicação. A autonomia local para adaptar estratégias, posicionamento ou identidade visual à cultura de mercado brasileira tende a diminuir significativamente. O objetivo é criar uma experiência de marca consistente e padronizada em todos os mercados, buscando sinergias operacionais e maximizando o reconhecimento global. Isso implica, na prática, menor flexibilidade para iniciativas locais que não se alinhem perfeitamente ao molde global.
- Migração de Brand Equity (Valor de Marca): O esforço retórico em vincular a "mesma paixão" e o "DNA" à nova marca é uma tentativa crucial de transferir o brand equity construído pela Galápagos ao longo dos anos para a Asmodee. Trata-se de uma estratégia para mitigar o risco de perda de conexão emocional e lealdade do público brasileiro. A eficácia desta migração dependerá de quão bem a Asmodee conseguir associar suas qualidades globais (escala, portfólio extenso) aos valores positivos já atribuídos à Galápagos localmente.
- Economia de Escala e Poder de Mercado: A justificativa subjacente, expressa em frases como "cada vez mais força" e "uma das maiores forças do entretenimento", revela a lógica econômica central. A unificação sob uma única marca global permite à Asmodee operar com maior eficiência (custos reduzidos de marketing, gestão de portfólio simplificada), ampliar seu poder de barganha junto a canais de varejo e distribuição, e potencializar o impacto de campanhas de marketing internacionais. O sacrifício da identidade local (Galápagos) é visto como um custo necessário para alcançar esses ganhos de escala e competitividade global.
O "apagamento" da marca Galápagos não é apenas cosmético, mas sinaliza mudanças substanciais na gestão e prioridades. O comunicado, ao tentar suavizar a transição, não esconde a essência da estratégia: a integração completa e a subordinação da operação brasileira à marca e às diretrizes globais da Asmodee. A marca Galápagos deixa de existir como entidade de mercado, seu legado é incorporado como narrativa histórica da Asmodee, e o foco estratégico local desloca-se integralmente para a construção e consolidação da presença da marca global no Brasil. Sem esquecer que, como "Galápagos" a empresa também tinha contratos com outras editoras e que não era vinculadas à Asmodee. É necessário também observa como serão feitas essas transições.
Há vários desafios em gerenciar essa transição de forma eficaz, garantindo que o brand equity local seja preservado na nova estrutura globalizada e que a promessa de "força" e "presença" global se traduza em benefícios tangíveis para o mercado brasileiro. A centralização e a perda de identidade local são os trade-offs evidentes desta ambição global.
Mofo é um problema logístico. Quanto aos aspectos logísticos, aí vai para o meu puro achismo. A Devir tem gestão centralizada pela Devir Ibéria e não há tanto mofo nos jogos dela. Mas será que isso não é um problema de gestão de logística global? Se for, esse ponto não mudaria. A memória pode falhar, mas não lembro de termos problemas com mofo quando o mercado estava menos aquecido. Não apenas do lado da Galápagos, mas recentemente tivemos problemas com jogos lacrados e com mofo na Across the Board, Conclave e MeepleBR. São mais de 90 tópicos sobre mofo, mas mofo em lacrados é coisa mais recente.
Respeito sua análise detalhada e a forma como você articulou os impactos do rebranding da Galápagos para Asmodee. De fato, você levanta questões relevantes do ponto de vista de branding, estrutura corporativa e centralização estratégica. No entanto, discordo da premissa central do seu argumento — de que estaríamos diante de um "apagamento" com implicações práticas e negativas para o consumidor. Para mim, essa transição representa mais uma mudança de fachada do que uma revolução nas operações, e possivelmente até um avanço em termos de qualidade, escala e posicionamento global.
1. Rebranding ≠ Apagamento, e sim Consolidação
Chamar essa mudança de "apagamento da marca Galápagos" me parece uma leitura mais dramática do que o necessário. A Galápagos já foi adquirida pela Asmodee em 2018. Desde então, a empresa já operava sob diretrizes e padrões que, mesmo preservando o nome Galápagos por questões comerciais e de familiaridade local, estavam alinhados com o modelo Asmodee global. O que ocorre agora é apenas a adoção formal de uma identidade corporativa já existente na prática. Isso não significa perda de autonomia do dia para a noite, mas sim uma padronização de marca que já estava em curso, como ocorre com praticamente qualquer subsidiária de multinacional.
Além disso, não se trata de “apagamento”, mas de evolução de marca. A Galápagos não está sendo “desligada” ou “esquecida”, mas incorporada a uma marca globalmente reconhecida, com mais poder de investimento, maior influência no mercado internacional e capacidade de trazer ainda mais novidades ao mercado brasileiro. Se o “legado” é incorporado, como o próprio comunicado afirma, então o que se perde em nome, ganha-se em escala e visibilidade.
2. O consumidor final não será prejudicado — pelo contrário, pode sair ganhando
Se olharmos pelo ponto de vista do consumidor, o que muda de forma prática? Quase nada. Os jogos continuarão sendo traduzidos, publicados, distribuídos e vendidos como sempre. Não há indícios de que haverá uma piora no portfólio, nos serviços ou nos eventos. Aliás, com o rebranding pode haver mais investimentos em marketing, canais de distribuição e presença em eventos nacionais com o peso da marca global Asmodee por trás. A Asmodee é uma das maiores distribuidoras de jogos do mundo. Isso significa acesso mais rápido a lançamentos, versões mais fiéis às edições internacionais, e provavelmente mais recursos dedicados à produção local.
A visão de que o “controle global” possa necessariamente representar uma piora é uma suposição, não um fato. Inclusive, muitas editoras que trabalham de forma centralizada conseguem manter qualidade e até aumentá-la — como você mesmo citou o exemplo da Devir Ibéria.
3. O suposto "risco" da centralização é uma generalização indevida
A crítica à centralização das decisões e à “padronização” da marca parte de uma premissa comum em discussões sobre globalização: a de que tudo que é padronizado perde conexão local. Mas isso nem sempre é verdade — na verdade, muitas vezes é o oposto. Marcas globais têm expertise, processos otimizados e uma capacidade logística que editoras menores não têm. Padronizar identidade visual, nomenclatura e campanhas pode criar sinergias que permitem economias de escala e libera recursos para investir em outras áreas, como suporte ao consumidor, eventos, promoções e localização de jogos com mais qualidade.
Além disso, não há qualquer indício de que a operação no Brasil será “engessada”. O histórico da Asmodee é de manter times locais com autonomia em diversos países, inclusive com adaptações culturais e editoriais quando necessário. A própria existência da Galápagos até aqui, mesmo após a aquisição em 2018, prova isso.
4. O valor simbólico da Galápagos está sendo mantido, e não descartado
Você menciona que o brand equity da Galápagos está sendo “absorvido”, o que é verdade — mas isso é exatamente o que deve acontecer em um rebranding inteligente. O valor emocional da marca Galápagos será transferido para a nova identidade. Isso não é um erro ou um problema, é parte natural e bem executada de qualquer processo de branding corporativo.
Se a nova marca for bem gerida, com um discurso coerente e continuidade nos serviços e produtos, o público logo se acostuma. Temos inúmeros exemplos de rebranding que não prejudicaram a relação com o público — pense em quando o Google reorganizou suas marcas sob a Alphabet, ou mesmo quando empresas como Brahma e Skol foram incorporadas à Ambev. O consumidor médio continua comprando, independentemente do nome no rótulo.
5. O argumento de que contratos com outras editoras possam ser prejudicados não tem base factual até agora
Você levanta uma hipótese interessante: a Galápagos, enquanto nome local, tinha acordos com editoras que não pertencem à Asmodee. Mas essa é apenas uma suposição no momento. Nada no comunicado indica que tais contratos serão encerrados. Inclusive, manter esses acordos seria de interesse da própria Asmodee, pois diversifica o portfólio local e aumenta o valor percebido da marca. Não faz sentido estratégico abrir mão de produtos de sucesso apenas por uma mudança de identidade.
6. Problemas como mofo nos jogos são logísticos, não de branding
Concordamos que mofo em jogos lacrados é uma questão importante — mas não há nenhuma evidência concreta de que isso seja causado pela estrutura de marca ou pela centralização de decisões globais. É um problema de armazenagem, distribuição e controle de qualidade local, e pode ocorrer com qualquer empresa, seja ela independente ou parte de um grupo global. Se for algo crônico, a mudança de marca pode até ser uma oportunidade para rever e melhorar processos internos, justamente por estar sob maior escrutínio global.
7. O consumidor brasileiro precisa de uma marca com mais força de negociação global
O mercado de jogos de tabuleiro cresceu exponencialmente no Brasil nos últimos anos, e junto com ele, os desafios: dólar alto, taxas de importação, complexidade logística e competição acirrada. Ter o respaldo de uma gigante global como a Asmodee pode ser uma vantagem estratégica, pois significa maior capacidade de negociação com fábricas, melhores contratos de licenciamento, menor tempo entre o lançamento internacional e a chegada ao Brasil, e até mais margem para promoções e ações com varejo.
Em resumo: a mudança de Galápagos para Asmodee não é um “fim de identidade” ou uma ameaça à diversidade do mercado local — é o reconhecimento oficial de uma realidade que já existe há sete anos, com potencial para aumentar ainda mais a qualidade e a abrangência dos serviços oferecidos ao público brasileiro. Ao invés de lamentar a perda de um nome, é mais produtivo observar o que essa transição pode trazer de bom — e até agora, não há razão concreta para pessimismo.
Se o futuro mostrar problemas, que sejam apontados com base em fatos. Até lá, continuo comprando e jogando com a mesma confiança de sempre.