Eu gosto de quando um texto tem esse tipo de título, que começa com uma pergunta aparentemente provocativa, porque - como um grande amigo jornalista já bem apontou uma vez - quando uma chamada de qualquer coisa começa com uma pergunta, a resposta geralmente é "não".
E eu acho hilário como isso parece estar certo mesmo em umas boas 95% das vezes.
Então se você quiser parar por aqui, voilá, a resposta mais simples já está dada: nah, RPG nunca precisou de miniaturas pra ser jogado e a perspectiva talvez dos próximos 3275 anos é que continue assim e siga tudo bem, obrigada. Pode voltar a pesquisar os jogos do seu interesse aqui na Ludopedia.
Mas a discussão que eu queria levantar - e eu realmente gostaria muito que você compartilhasse sua opinião e sua experiência nos comentários - é mais sobre em que condições miniaturas enriquecem a experiência de jogar RPG? Em que condições elas "travam" um jogo tantas vezes tão imaginativo em um limitante material? Prós e contras, lá e cá, sim e não. Bem-vindos ao meu divã.
Queria começar falando do ponto de vista de uma pessoa que joga RPG já há mais de 15 anos - como jogadora e como narradora -, mas que só usou uma miniatura para jogar ou narrar pela primeira vez no tão recente ano de 2022 (2 anos atrás em relação a esta publicação). Até então, tudo que eu jogava era muito mais baseado no famoso "teatro da mente" - a prática de simplesmente descrever e imaginar as cenas em conjunto, sem se ancorar em nenhum referencial palpável, como mapas, ilustrações ou mesmo - oh, pasme - miniaturas. Treze anos felizes sem isso ser uma necessidade específica para que meus jogos ocorressem.
E isso segue assim. Na minha concepção, embora existam diversas formas realmente múltiplas de se entender e jogar RPG, das mais simulacionistas e fortemente mecânicas às puramente interpretativas e quase desprovidas de regras, miniaturas seguem não sendo uma necessidade fundamental para que longas horas de aventuras incríveis aconteçam. Mas em dados momentos, em dadas situações, e especialmente em dados sistemas de jogo, elas podem ser um acessório bem-vindo, um puro e simples facilitador para a coesão da mesa em termos de entender o espaço de jogo, e também um artefato estético fácil de se apaixonar por.
O que eu achei mais legal foi a forma como comecei a usar miniaturas e entender seu valor em jogo: fui convidada a trabalhar por um período junto a uma empresa que realiza treinamentos corporativos através do lúdico, utilizando, dentre muitas outras ferramentas, do RPG. Desnecessário dizer que sim, era ele: DnD 5e num hack ultrassimplificado. Sim, embora a complexidade não tão iniciante e não tão intuitiva das regras de DnD 5e, por se tratar do atendimento de um público leigo em RPG, começar pelo que as pessoas acham que um RPG é resulta muito mais fácil e natural do que tentar explicar o que é aquilo antes de tudo. Ding-ding-ding, mais um ponto para Paulo Freire.
Enfim; na minha cabeça de jogadora/narradora, a premissa era clara: papel, caneta e um dado qualquer (e mesmo esse setup é alvo de extensas discussões) é o suficiente para jogar RPG. Mas a experiência é sempre a melhor professora. Vendo pessoas adultas que nunca haviam tido qualquer contato com RPG entrarem em contato pela primeira vez naquelas condições - com mapas belamente desenhados, com miniaturas, com cartas de auxílio a magias, poderes e itens - me mostrou o quanto RPG é, primeiro de tudo, sobre cativar pessoas. E não cativar pela beleza como finalidade, mas sim usando-a como um conduíte para baixar as defesas da nossa tão alimentada "vergonha social de tudo" que cultivamos como adultos, para se permitir contar e viver histórias com as quais, no fundo, a gente sempre sonhou protagonizar.
Na minha experiência pessoal com estes grupos de pessoas - que já deve ter reunido muito mais de uma centena de contatos com o RPG iniciados dessa forma -, a despersonalização que um "bonequinho" promove para novos jogadores ajuda a fazer o pessoal se soltar na mesa e curtir mais a experiência. Entrar no jogo com mais facilidade, e sem a inibição da "vergonha social de parecer bobo" que as normas sociais da vida adulta às vezes nos causam. Porque não sou eu, coordenadora de projetos, que estou falando pra minha gerente de marketing que precisamos encontrar o mago Winslow para forjar a espada milenar que vai derrotar os dragões. É Mileena, aquela arqueira elfa de 2,8cm com uma comunzíssima capa verde, orelhas pontudas e arco longo em posição de combate. Ufa! Se eu transferir esta responsabilidade de brincar para Mileena, fico mais tranquila na minha reputação de Ana. Mas quanto mais me permito brincar através de Mileena, talvez mais Ana se solte e aflore dentro do faz-de-conta. "Quase sem querer", como diria Renato Russo.
Mas não é apenas para novatos que miniaturas ajudam e enriquecem a experiência de se jogar RPG. Um ponto a se considerar sempre é a forma que um sistema de jogo funciona, sob quais premissas ele se assenta, o que ele "pede" pra que talvez sua experiência de jogo seja vivida da forma como ela foi inicialmente pensada por uma equipe de game designers. Tem um valor mecanístico bonito no meio disso, de buscar entender como o outro pensou algo.
É evidente que RPGs de cunho mais narrativista façam menos sentido com miniaturas. Não existe muita função em medir distâncias em Vampiro a Máscara, ou em saber o tamanho de algum ser em City of Mist. O sistema de regras não se ocupa em utilizar minuciosamente destas coisas para que o jogo ocorra. Contudo, um posicionamento estratégico pode ser a diferença entre sucesso ou tragédia - dentro E fora de combate - em Dungeons & Dragons, um raio de explosão em determinada área pode significar vitória ou morte em Savage Worlds. Ou seja, a partir do momento em que distâncias, posicionamentos, dimensões e afins operam como parte essencial dentro das regras, faz mais sentido a necessidade coletiva do grupo de jogo de ter referenciais comuns destas distâncias, posicionamentos e dimensões, para que todos "falem a mesma língua" na mesa, seja se utilizando de rabiscos em um mapa ou de miniaturas 3D caprichosamente esculpidas e pintadas. (Embora, na vasta maioria das vezes, as minhas fiquem cinzas mesmo)
E vamos, enfim, ao argumento mais supérfluo, porém também o mais sincero, humano e, particularmente, meu favorito: a gente gosta de bonequinho daora porque a gente gosta de bonequinho daora. Acho que a melhor característica da minha geração - os tão mal-falados millenials - é ignorar completamente qualquer convenção social e se permitir simplesmente ser quem você é, gostar do que você gosta, e se indulgir nos hobbies que ama sem receio de soar "bobo" ou "infantil" ou qualquer coisa similar que alguém possa querer dizer. E mesmo se você não é millenial mas carrega consigo esse traço, saiba que você é uma pessoa formidável! Nós somos as pessoas que discutem anime no trabalho, que amam jogos de tabuleiro e RPG, que se animam por um trailer de jogo ou pelo próximo filme da Marvel no cinema, indo inclusive a caráter com a camiseta de nossos heróis favoritos. E nós gostamos de bonequinhos. É legal ver algo bonito, bem esculpido, bem pintado - ou não, mas que nos dá uma experiência divertida que ajuda a sonhar - em jogo. É legal ver a cara de desespero dos seus amigos ao perceberem o quanto as personagens deles são pequenas diante do Kraken que eles vão enfrentar, e especialmente gratificante ver o suspiro de alívio e os sorrisos deles ao deitar aquela miniatura gigante na mesa depois de terem-no derrotado. É legal abrir uma caixa com o sentimento infantil e tão sincero e gostoso de um presente de Natal. É legal enfeitar uma prateleira e gostar daquilo.
Enfim... Qual a sua experiência com miniaturas no RPG? As minhas, em geral, são essas. Eu gosto, hoje, de ter esse artifício visual na mesa, muito embora eu jogue muito mais mesas virtuais do que presenciais dado a distância dos meus amigos. Mas, quando existe a oportunidade, é legal. É gostoso. Nos eventos eu sempre passo pelas lojas de miniaturas e encontro algo que me salta aos olhos, que eu queria pôr na mesa. Às vezes presenteio os amigos. Às vezes me aventuro a pintar alguma. É sempre muito divertido colocar elas na mesa, e eu gosto das possibilidades interpretativas, de impacto visual, de "cinematografia" que elas me dão como narradora, como isso mexe com meus jogadores. Nada fundamental, mas até então, muitas coisas interessantes passam longe de serem fundamentais. Talvez a decisão esteja no sentimento. É. Acho que pra mim é bem isso.
Dito isso, essa reflexão foi suscitada por este conteúdo que peguei para produzir, sobre as miniaturas de Tanares RPG. Mostrar, discutir, entender no que elas podem contribuir, de alguma forma, na experiência de jogar um RPG - ou não, como discutimos brevemente acima. Eu sempre gosto de parar e pensar no porquê jogar os jogos que eu jogo, de onde vem o que eu gosto neles. Dungeons & Dragons não é meu sistema nº1 de escolha para jogo, embora seja um dos que eu mais jogue, mas algo nessa nostalgia gostosa que ele promove me cativa. E, particularmente pra mim, "jogar com bonequinho" é algo que me tira um pequeno sorriso.
Concordo demais!
Eu acho que tudo que enriquece nossa experiência e faz a gente feliz vale a pena, exatamente como você falou!
Eu comecei a usar minis no RPG faz pouco tempo e isso mudou bastante minha percepção delas, que antes eu achava só algo bonito, e agora acho muito mais um fator com sua importância dentro do universo de alguns jogos!
Eu gostei muito dessas minis que Tanares trouxe pra acompanhar as novidades que o cenário propõe: novas classes, espécies, novas criaturas... Tô animada de verdade pra levar elas pra mesa com os meus amigos!
Eu jogo RPG de mesa a mais de 30 anos e joguei diversos sistemas. Jogo na maioria do meu tempo como DM e o sistema que mais jogo é D&D, durante todos esses anos de jogo por muito tempo eu e meu grupo não usávamos miniaturas, tinhamos o desenho de mapa em uma folha sulfite e marcavamos o nosso posicionamento no mapa de batalha com coisas simples como dados e/ou outros tokens genéricos. Fazem aproximadamente 4 anos e meio que entrei de cabeça no univerdo dos jogos de tabuleiro e todos os jogos que continham miniaturas principalmente medievais me atraiam demais e comecei a comprar jogos que além de eu jogar o board, eu também conseguisse usar as miniaturas para sessões de RPG.
O que eu posso compartilhar com vocês sobre o uso de miniaturas no RPG:
Pontos positivos:
- Aumenta e muito a imersisibilidade na sessão
- Melhor entendimento do posicionamento em combates
- Melhora o foco de atenção de todos na sessão
Pontos Negativos:
- A grande maioria das vezes temos que adaptar monstros à miniaturas que possuímos
- O cuidado com o armazenamento das miniaturas
- O cuidado ao manipular as miniaturas na sessão de jogo
- O alto custo para comprar miniaturas oficiais de determinados sistemas
Enfim, acredito que valha pena usar miniaturas no rpg! Podemos utilizar miniaturas de boardgames que a grande maioria das vezes possuem um ótimo custo x benefício comparado ao custo de blisters e caixas de miniaturas oficiais. Temos empresas de impressão 3d que fazem excelentes miniaturas de resina e outras oportunidades em financiamentos coletivos. Lembrando que a regra de ouro do RPG é se divertir!
Eu compartilho muito dessa sua experiência: miniaturas são algo que, uma vez que a gente começa a usar, pega gosto e começa a aplicar com mais frequência nas mesas, e começa até a buscar mais delas como hobby mesmo, pra colecionar, ter variedades de personagens, de criaturas, até de assets pros cenários de jogo...
Eu tenho curtido muito! Sempre que posso, tento encontrar algo pra representar pelo menos as personagens dos meus amigos quando jogamos juntos, e uma ou outra criatura que eu queria colocar como um ponto maior de impacto nos encontros, aquele boss pra galera dar uma estremecida rs
Achei legal que na campanha de Tanares o pessoal se propôs a trazer exatamente o que vai de encontro a essa necessidade que você falou, de minis que representem as coisas novas do cenário (admito que não sei o quão fácil ou difícil é encontrar representações de criaturas meio lovecraftianas pra DnD, mas já que Tanares propõe um medieval meio lovecraftiano, trazer isso pronto como uma facilidade pro público que quer minis pra representar isso é uma boa). No mais, eu tô é morta de vontade de começar a pintar! kkkkk
E aí já partimos para a terceira parte do buraco de coelho! kk
Danso::Não precisamos de miniatura para jogar RPG. Nem de RPG. Nem jogar. Nem responder esse tópico.
Mas na vida não fazemos só o que precisamos, RPG é incrível e as miniaturas são lindas
Exato!
"Precisar" de miniatura nem boardgame precisa. Mas quanto mais você agrega em componentes acessórios (componentes bonitos, miniaturas detalhadas, cenários, 3d, etc), melhor fica a experiência.
Danso::Não precisamos de miniatura para jogar RPG. Nem de RPG. Nem jogar. Nem responder esse tópico.
Mas na vida não fazemos só o que precisamos, RPG é incrível e as miniaturas são lindas
Exato!
"Precisar" de miniatura nem boardgame precisa. Mas quanto mais você agrega em componentes acessórios (componentes bonitos, miniaturas detalhadas, cenários, 3d, etc), melhor fica a experiência.
Total! Afinal, a experiência de um jogo também é composta pelo tema, pela imersão, pela estética... E se as miniaturas fazem parte disso, é como você bem colocou, Hugo: agrega valor ao jogo e faz a experiência ser mais gostosa. Concordo total!
Mas agora você implantou uma ideia na minha cabeça que eu preferia não ter tido por motivos de grana: COMO EU QUERIA umas miniaturas meio cthulhescas pra usar no meu Eldritch Horror!! kkkkk Pensamentos perigosos para o período de virada de cartão de crédito!
Assim, para mim (Portugal), não precisa. O elemento de interpretação é a grande base e essência do RPG de mesa, mas lógico que não serei puritano em dizer "que RPG raiz é sem minis". Eu amo as minis, deixam a mesa mais bonitas e tals.
Mas pra mim, como mestre e jogador. Gosto de funcionalidade também. De não só usar as minis para ilustrar os jogadores no mapa, mas para usar como um board game, deixar os momentos de combate e tensão mais estratégicos tbm. E assim os jogadores poderem usar do ambiente mais claramente ao seu favor. Lógico que também, não quero limitar a criatividade e interpretação. E tão pouco deixar a sessão como um boardgame com "ataco", mas sim de usar esse recurso das minis para criar uma imersão maior do que todos estão criando.