Está mais que na hora de começar a estudar e contar a história do design de jogos brasileiro. Eu não sou pesquisador, deixo a tarefa pra alguém mais vocacionado. Mas quero nesse texto aqui plantar uma semente. Quem sabe alguém pega a deixa e faz um trabalho mais sério depois.
Vou postular aqui que existem 3 gerações claramente distintas de autores de jogos no Brasil.
Os primeiros são os Pioneiros. Os caras que se aventuraram a fazer jogo quando não tinha nem editora de nicho direito no Brasil. Pegaram o touro a unha, e todo mundo que veio depois deve tudo a eles. Alguns deles:
- Sergio Halaban, autor do Quartz e do Sheriff of Nottingham, patrono do design de jogos nacional
- André Zatz, co-designer dos mesmos jogos, que hoje se dedica a jogos empresariais
- Luis Francisco, que hoje é um dos sócios da Grok, mas começou lá atrás com o Mehinaku
- Marcos Macri, que publica jogos euro como Dogs e Gran Circo de forma independente há mais de uma década
- Luish Coelho, que estava publicando euros pesados já em 2010 com o Recicle e hoje é um dos sócios da editora LudoCafe
- Maurício Gibrin, autor do Vineta, jogo vencedor de concurso e publicado na Europa que hoje é raridade, e de vários jogos para o mercado de massa
- Fabiano Onça, co-autor de vários jogos com o Maurício, e hoje infelizmente não está mais atuando
- Thiago Boaventura, que criou provavelmente o jogo nacional mais pesado até hoje, The Capitals, publicado nos EUA há mais de 10 anos
- Gustavo Barreto, autor muito prolixo de jogos leves, como Tinco e Don Capollo
- Vince Vader, blogueiro e autor de vários jogos abstratos e para o mercado de massa
- Julio Trois, criador de vários war games de história do Brasil e antigo editor de uma revista mensal sobre jogos de tabuleiro, infelizmente fora do mercado hoje
Em seguida veio a minha geração, que é o título desse texto. Somos da Geração Zombicide porque, mesmo que alguns de nós já conhecessem jogos modernos há mais tempo, só começamos a publicar quando o ecossistema do tabuleiro no Brasil saiu da estaca zero - e o Big Bang foi em 2013, com o lançamento do Zombicide pela Galápagos.
Zombicide deve ter sido o primeiro jogo moderno de muitos que estão lendo aqui. Ele estourou no Brasil e mostrou que havia um mercado possível.
Atrás desse mercado vieram novas editoras. E atrás delas, começaram a pipocar os designers da geração Zombicide.
Chegamos em muito maior quantidade que os pioneiros, e de várias partes do país. Aqui estão alguns de nós (a lista completa seria bem maior):
- No Rio, além de mim, autores como Leandro Pires (Paper Dungeons), Fel Barros (Dobro), Warny Marçano (Space Cantina), Sanderson Virgolino (Cangaço), Alex Francisco (Front Total), Romulo Marques (Die, Die Die), Daniel Sant'anna e Leandro Pinto (Sushi Rush), Jorge e Sabrina (Sereias), Eduardo Andrade (Dino Escape)
- Em São Paulo, Robert Coelho (Comic Hunters), André Teruya (Van Gogh), Diego de Moraes (Cosmos), Luís Brueh (Dwar7s Fall), Michael Alves (Triora), Kevin e Samanta (Café Express), Rogério Lourenço (Loira do Banheiro).
- Em Minas, Renato Simões (Piratas), Patrick Matheus (O Bom do Videogame), Igor Knop (Gnomópolis), Daniel Alves (Caçadores de Galáxias), Eurico Cunha (Beaver Creek).
- No Sul, Bianca e Moisés (Grasse), Jordy Adan (Cartógrafos), Pedro Latro (Tao Long), Edu Reis (Tá na Mesa), Anderson Butilheiro (Rio 1808), Ricardo Spinelli (Quissama).
- E no restante do Brasil, Zé Mendes (World Wonders), Ron Halliday (Carnavalesco), André Negrão (O Bom do Videogame) e Roberto Pinheiro (Distrito 6).
A impressão que tenho dos pioneiros é que cada um trilhou o seu caminho, quase sem saber da existência dos demais. Foram esforços isolados. Por ser mais populosa, e por habitar um ecossistema mais conectada, a geração Zombicide evoluiu toda junta.
Todo mundo testa os jogos uns dos outros, troca figurinha em grupos de Facebook, Whatsapp ou na Ludopedia, organiza eventos, marca de sair junto.
Ao longo dos anos, fomos ganhando experiência, ficando cada vez melhores no que fazemos, e alguns até se profissionalizando - vários trabalham exclusivamente com jogos de tabuleiro.
Alguns dos nossos jogos foram gradualmente fazendo sucesso não só aqui, mas também lá fora: Brazil, World Wonders, Cartógrafos, Gnomópolis, Paper Dungeons, Tao Long. Mas eram todos casos isolados.
Bom, desde essa última Gen Con, eu não acho mais que são casos isolados. Como bem
recapitulou o Robert Coelho no Instagram, a maior feira de jogos de tabuleiro dos EUA tinha 12 jogos de autores brasileiros à venda ou para demonstração, vários deles na condição de destaques:
- Comic Hunters, do próprio Robert
- Videogame Champion, a versão internacional do Bom do Videogame, do Patrick Matheus e André Negrão
- HiFi, do André Teruya
- Landmarks, meu e do Danilo Valente
- Stonespine Architects, do Jordy Adan
- Ozob, do Renato Simões e Jordy Adan
- Fibonachos, do Jordy Adan
- Quartz Dados , do Sergio Halaban e Luis Francisco
- Nine Circles, do Eurico Cunha
- Expansão do World Wonders, do Zé Mendes
- Expansão do Keep the Heroes Out, do Luis Brueh
Jogos brasileiros sendo vendidos ou apresentados na Gen Con
Para mim, essa Gen Con foi como uma formatura para a geração Zombicide. 12 jogos lançados na mesma feira são como um TCC depois de 10 anos de aprendizado. De algum jeito, criamos um movimento, e o mundo está de olho no que está sendo produzido no Brasil - não sou eu quem falo, não é nem o Tom Vasel - é a própria feira. Chegamos. E mal começamos.
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Mas... antes de terminar, notaram um nome diferente na lista ali em cima?
Danilo Valente. Meu parceiro no Landmarks, e autor do Tributo a Mondrian. Não tinha mencionado ele antes, pois ele não é da Geração Zombicide, muito menos um pioneiro.
Danilo, e vários outros como ele, são da Geração ProtoBR, a molecada que começou a fazer jogo na pandemia, graças a ferramentas como Tabletopia e TTS, e principalmente, à iniciativa incrível da Bianca, Moisés, Teruya, Robert e Sanderson (esqueci alguém? espero que não) de criar um evento virtual mensal apenas de protótipos para que os autores pudessem continuar testando seus jogos durante o isolamento social.
Essa geração começa em 2020 e já está tendo seus primeiros jogos publicados: Cultive (
Laila Terra e
Luciana Lima), Marajoara (
Daniel de Lucca), Gataria (
Fernando Cunha), Street Art (
Rennan Gonçalves), entre outros.
O
Landmarks, é o primeiro jogo da nova geração dando as caras lá fora. Vários outros virão e não vai demorar. A Geração Zombicide conseguiu fazer coisas incríveis. A próxima vai fazer ainda melhor.