Thiago Guido ::
Ultimamente, tenho observado um padrão na indústria de jogos de tabuleiro que já se tornou comum em outras indústrias, como, por exemplo, na indústria cinematográfica. O padrão ao qual me refiro é a tendência de repetir algo que fez sucesso anteriormente. Essa repetição acontece no mundo dos jogos de tabuleiro de duas maneiras. A primeira maneira ocorre ao lançar diversos jogos da mesma série, fazendo algumas alterações no jogo original, a famosa reimplementação, como aconteceu com o Azul ou com os jogos da linha Pandemic. Já a segunda acontece por meio do lançamento de versões deluxe, nas quais os jogos são idênticos, mas os componentes da versão deluxe são bem mais caprichados.
isaafelixx::
Mas de fato, algumas implementações não fazem sentido, como o que fizeram com Disney Villainous. Pelo menos, por enquanto, os consumidores se beneficiaram podendo adquirir a versão antiga por um preço mais em conta. Acredito que as versões deluxe façam mais sentido para colecionadores. Eu adoro ver um jogo maravilhoso na mesa, com peças de boa qualidade, mas não pagaria o dobro só pra ter isso. No caso de jogos como Ticket to Ride, acho que as expansões e reimplementações fazem sentido por trazerem mapas e objetivos diferentes, então pra quem é muito fã do jogo e já tem dezenas de partidas, vale a pena pra aumentar a rejogabilidade.
Joabfast:: Acho que deveria haver um meio termo.
Não deveria avacalhar, criando dezenas de jogos iguais, mudando apenas o tema ou alguma bobagem.
Ou igual fazem no zombicide, lançando centenas de expansões, cada uma com 2 ou 3 miniaturas, por 200, 300 reais.
Mas tem os emocionados que compram, né, a editora sabe ganhar dinheiro.
Por outro lado, quando o jogo é muito bom, as vezes é bom uma expansão, depois de anos, para dar uma revitalizada ou melhorar ainda mais a experiência.
Um exemplo disso é o jogo Scythe e a expansão do mapa modular e a Rise of Fenris.
viniciusjf:: Tenho reparado também, mas no geral, tenho achado essa tendência das big box muito positiva.
O ruim é quando começa a entrar no esquema edição definitiva, edição definitiva 1.1, edição definitiva 1.2, edição definitiva ultra plus 1.0...
Caros
isaafelixx,
Thiago Guido,
Joabfast e
viniciusjf
Em primeiro lugar ótimo texto Thiago. Por pura coincidência eu escrevi um artigo com o mesmo tema, mas com outro enfoque, mais para o lado do bloqueio criativo que certos designers se auto impõem, quando eles conseguem criar um jogo de muito sucesso comercial, ou que lhe são impostos, pela estrutura da indústria dos jogos. Se você quiser dar uma olhada, acho que vai gostar. O link é:
https://ludopedia.com.br/topico/67251/bloqueios-criativos-voluntarios-devido-ao-sucesso-nos-bg
No mais, eu entendo aquilo que foi dito aqui e concordo, em parte. Mas é como a Isa falou, mesmo havendo uma exploração enorme e repetitiva de alguns títulos, isso não impacta em nada a verdadeira enxurrada de jogos diferentes que saem todos os anos. E isso só em termos de mercado nacional, porque se formos incluir o mercado internacional, então, é quase impossível até mesmo saber todos os jogos que foram lançados, quem dirá experimentar essa avalanche de lançamentos.
Além disso, é preciso considerar tanto o lado da editora quanto do designer. Imagine que você criasse um produto, vendesse, ele fosse um sucesso e você ganhasse muito dinheiro. Nesse cenário se alguém chegasse para você e dissesse: "você deveria parar de fazer esse produto, porque está repetitivo, e ao invés disso você deveria criar alguma coisa nova". Você ou qualquer outra pessoa daria ouvidos a esse conselho? É claro que não!!!! Você continuaria fazendo a mesma coisa, acrescentando uma coisinha nova aqui, uma detalhezinho novo acolá, vendendo como uma nova versão e enchendo a conta bancária de dinheiro.
As empresas funcionam exatamente da mesma maneira, e pensar que elas fariam diferente é no mínimo ingenuidade. Elas podem até fazer alguma investida em outras áreas, para ver se acertam uma segunda vez. Melhor que ter uma galinha dos ovos de ouro é ter duas galinhas dos ovos de ouro, e melhor ainda do que ter duas galinhas dos ovos de ouro e saber como criar galinhas dos ovos de ouro. Por isso, muitas vezes, essas investidas em outros jogos é feita com a segurança de que o seu jogo best seller vai continuar vendendo horrores e para isso a linha de jogos precisa ser alimentada com material novo.
É preciso considerar que antes de acertar, uma empresa ou um designer fazem várias tentativas que podem não dar tão certo e esse processo pode levar anos. Mas quando se descobre a "fórmula do sucesso", a empresa ou design continuam seguindo esse caminho, porque o lucro é certo. Isso sem falar que é muito mais fácil trabalhar em cima de um produto já consagrado do que criar um novo sucesso a partir do zero. Não é todo mundo que tem a genialidade de um Knizia, de um Kiesling, de um Kramer, que produzem um sucesso atrás do outro. E mesmo que o designer seja um gênio a pressão do mercado para continuar trabalhando na linha que está dando certo é enorme.
Alan R. Moon ganhou o Spiel des Jahres de 2004 com o Ticket to Ride, e alguns anos depois ganhou novamente em 2008 com o Elfenland. Mas devido a enorme diferença de sucesso comercial, não há dúvida sobre em qual jogo ele concentraria seus esforços. Klaus Teuber já havia ganho três Spiels des Jahres antes do Catan (Barbarossa 1988, Hoity Toity 1990 e Dunter und Druber 1991). Mas depois de acertar na mosca com o Catan, ele não fez mais nada a não ser se dedicar à sua obra prima, e que lhe rendia uma fortuna. O mesmo aconteceu com o Klaus-Jurguen Wrede do Carcassonne, com o Matt Leacock do Pandemic, com o Fryxelius do Terraforming Mars, com Raphael Guilton, Jean-Baptiste Lullien e Nicolas Raoult do Zombicide, com o Jean-Louis Roubira do Dixit, com o Jacques Cottereau e o Denis Blanchot do Dobble, e por aí vai. De vez em quando um outro jogo do mesmo designer até faz sucesso, mas o foco é sempre no best seller.
Então não é uma questão de falta de criatividade, mas sim de focar naquilo que dá mais retorno, e eu penso que nenhum de nós faria diferente se estivesse no lugar do designer ou do CEO da editora.
Um forte abraço e boas jogatinas!
Iuri Buscácio