Caros boardgamers
Plágio eu acho que é uma palavra muito forte, e que está associado a elementos mais objetivos, e mais fáceis de comprovar. Por isso, o plágio ocorre tanto na música,pois bastam oito compassos iguais e já é plágio. São vários exemplos célebres como "Da Ya Think I'm Sexy" de Rod Stewart e Taj Mahal de Jorge Ben, "Que País é Esse" do Legião Urbana e "I Don't Care" dos Ramones, e até mesmo o mais famoso riff de guitarra do mundo de "Smoke on The Water" do Deep Purple, e a introdução de Maria Moita de Carlos Lyra que saiu oito anos antes. O pessoal do Led Zeppelin eram outros que roubavam músicas sem a menor cerimônia. Em alguns casos o plágio chega às raias do absurdo como ocorreu com a música "Ride on Time" (1989) da BlackBox e "Love Sensation" (1980) de Loleatta Holloway, onde a banda inglesa simplesmente pegou a mesma canção com trechos inteiros da música e dos versos, mudou a ordem (inclusive o famoso grito do início) e lançou como se fosse uma coisa original.
Nos filmes e obras literárias, o mais comum é que ocorram roteiros, mais próximos do que deveriam. Ninguém vai copiar "ipses literis" a cena do balcão ou o monólogo de Shylok e esperar se safar disso. O problema é que, excluindo o caso da cópia literal, fica difícil estabelecer onde é que a inspiração termina e onde o plágio começa. Um exemplo claro e bem conhecido é dos livros do Harry Portter e da subsequente série Percy Jackson. E o próprio Harry Potter também lembra imensamente, principalmente no visual, o Timothy Hunter da HQ Livros da Magia, de Neil Gaiman, lançada 7 anos antes. Obviamente esses dois casos são amplamente discutíveis.
Assim sendo, o plágio era mais comum, em um mundo muito menos interconectado, em que a informação demorava para chegar a todos os lugares. Atualmente isso ainda acontece, mas fica bem mais difícil, quando a informação é divulgada quase que em tempo real.
No caso dos board games, o plágio era mais comum algumas décadas atrás. O caso do WAR da Grow e do Risk, é um bom exemplo. Porém, mais uma vez isso é bastante discutível, porque algumas mudanças foram incluídas no jogo da GROW, e até melhoraram o original em certos aspectos, como as cartas de objetivo. Outros casos mais escandalosos formam os do Scotland Yard, do 221b Baker Street e do Heimlich & Co., que a Grow lançou aqui como Interpol, Scotland Yard e Top Secret, respectivamente. O mesmo ocorreu no caso da Estrela que lançou o Banco Imobiliário, que é o Monopoly, da Hasbro em 1944, mas só começou a pagar royalties, nos anos 70 quando lançou o Detetive.
Como eu citei em outro comentário, recentemente, aproveitando a impossibilidade de se patentear regras, mecânicas e esquemas de jogos, a editora Pais & Filhos lançou o "Suspeito" que é um plágio descarado do Clue, e aparentemente sem pagar um tostão de royalties, pelo menos até onde se sabe. A editora aproveitou o fato dos direitos sobre o "Detetive" estarem em franca disputa judicial entre Estrela e Hasbro desde 2007, ora ficando com uma, ora ficando com a outra.
Por outro lado, o que mais acontece com os jogos modernos é a inspiração em um jogo anterior, ou uma reimplementação, principalmente de jogos clássicos. Um ótimo exemplo é o Kingdomino que é uma releitura do ancestral Dominó. Como até mesmo definir uma mecânica de jogo já é difícil, muito mais difícil ainda é dizer qual jogo foi o primeiro a utilizá-la. No hobby existe um consenso de que o Dominion criou a mecânica de draft, mas algumas pessoas contestam isso. O mesmo ocorre com alocação de trabalhadores, que tem diversas origens. No BGG o jogo mais antigo de alocação de trabalhadores é o Valey of the Mammoths de 1991, mas eu já via pessoas defenderem que até mesmo o Xadrez pode ser encarado como um jogo de "alocação de trabalhadores" (coloca-se sua peça em uma determinada posição do tabuleiro, para conseguir um efeito). Eu particularmente acho que isso é forçar a barra demais, mas existe gente que pensa assim e que defende isso.
O Prof. Knizia, é indiscutivelmente um dos gênios dos board games, e conhecido pela criação de centenas de jogos, especialmente os infantis. Mas alguns boardgamers apontam grandes semelhanças em diversos de seus jogos, principalmente os de cartas.
Por fim existem muitas outras questões a serem consideradas. Se eu comprei um Coup, mas fui a um churrasco sem o jogo, e resolvi mostrar aos meus amigos, usando um baralho normal isso é plágio? Isso é pirataria? Isso é moralmente errado, considerando que eu já paguei e dei dinheiro ao autor e à editora pelo jogo? Todas essas questões também são amplamente discutíveis, tanto quanto até onde um designer pode ir em termos de se inspirar no trabalho de outro designer, sem incorrer necessariamente plágio.
Um forte abraço e boas jogatinas!
Iuri Buscácio