Muitos sabem do meu apreço por jogos de corrida, essencialmente SIMULADORES, tenho vários jogos na minha coleção (RALLYMAN, THUNDER ALLEY, CFR, LEGEND-WINDS OF WAR, RACE! FORMULA 90) mas sempre tem espaço para um jogo mais filler, aquele que te seduz através do apelo visual e da mecânica simples mas que permita algum tipo de diversão sem bizarrices. Tanto que FORMULA D e CORRIDA MALUCA são xodozinhos e sempre terão espaço na coleção para tirar a virgindade de alguns recém chegados neste universo. Nunca o mercado de jogos de corrida esteve tão HEAT (olha eu sendo contaminado).
Eis que chega uma grata surpresa no mercado: O "queridinho do momento", um jogo que está causando o maior furor no mundo dos jogos de corrida e a julgar pelo sucesso que tá fazendo, bem provável deve ser trazido pra cá por alguma produtora nacional. O nome desta criança é HEAT - PEDAL TO THE METAL, algo como "Aquecimento - Senta o pé!" ou algo semelhante, um jogo de corrida casual ambientado nos anos 60 que me cativou bastante devido a... aos... bem, leiam a resenha.
Normalmente faço essas resenhas usando fotos próprias mas como meu HEAT tá nos EUA e deve demorar um pouco pra chegar (e o jogo tá no maior hype), bora usar fotos do BGG e outros sites para ilustrar melhor este texto e não deixar potenciais curiosos na fissura.
Já tive a chance de jogá-lo várias vezes no TABLETOP SIMULATOR e adquirir bagagem suficiente nele para trazer a vocês minhas "primeiras impressões".
Calcem suas luvas, vistam seus óculos e façam o sinal da cruz (porque aqueles carros eram chamados de "caixões com rodas") e PEDAL TO THE METAL!
O JOGO
HEAT PEDAL TO THE METAL é um jogo de corrida de 1 a 6 jogadores ambientado nas corridas da década de 60 com os tataravôs dos atuais carros de F1, chamado de "charutos" (eu prefiro "baratinhas").

Criado pelos mesmos idealizadores do aclamadíssimo FLAMME ROUGE (simulador de provas de ciclismo europeu) e que teve lançamento aqui no Brasil pela Conclave, HEAT PEDAL TO THE METAL bebe um pouco desta fonte porém houve apenas uma adaptação, não é uma conversão.
HEAT é um jogo totalmente orientado por cartas (gerenciamento de mão). Basicamente o jogo consiste em engatar uma marcha (sim, o jogo tem câmbio, como no FORMULA D) e dependendo da marcha engatada isso vai obrigar o jogador a jogar uma quantidade de cartas de movimento no seu turno e mover o carro exatamente aquela soma das cartas jogadas.

Cada jogador tem à sua disposição um deck de 12 cartas básicas (iguais para todos os jogadores) contendo cartas de movimento e que podem ser incrementadas com Cartas de Upgrade, Cartas de Stress e Heat Cards conforme a pista ou modo de jogo escolhido (básico ou avançado). São 4 circuitos no total.

Painéis dos Carros: Super temáticos.

Até câmbio eles tem. Chuuupa FORMULA D!
MANUAL
Há 2 manuais no jogo, o manual básico e o avançado. São muito bem feitos e bem fácil de serem consultados, com poucas páginas e com regras bem distribuídas, porém são falhos em alguns aspectos, faltando mais exemplos de uso de algumas cartas de Upgrade, que pelo fato de serem muitas e usarem muitos símbolos, acabam causando confusão. O jogo é simples mas "nem tanto". Já saiu a primeira correção depois de muita reclamação no BGG.

Para não inserir textos nas cartas, HEAT usa (e abusa) dos ícones. Com o tempo você decora...
AQUEÇA E RESFRIE
Há 2 modos de jogo: BÁSICO e AVANÇADO. No modo BÁSICO temos a chance de disputar uma corrida simples com apenas 3 cartas de Upgrade (que são idênticas para todos os jogadores), sem presença de chuva ou qualquer outro elemento, visando apenas o aprendizado.

Upgrade Básico: Com isso na mão até eu corro mais rápido... Essa carta de valor "0" ali não é erro de impressão não, ela pode ser usada para reduzir sua velocidade.
Mas é no modo AVANÇADO que o HEAT brilha. A quantidade de elemento eleva-se de forma considerável, permitindo enfrentar BOTs ou disputar um Campeonato empregando poderosas Cartas de Upgrade, acrescentar chuva e até um sistema de "patrocínio" (comento mais à frente).
O grande “pulo do gato” do HEAT são justamente as cartas que lhe dão o nome: HEAT CARDS. Elas tentam simular o super aquecimento do motor (algo bem comum nos carros da década de 60). Sempre que um jogador tentar mover mais que o "normal" no seu turno (subindo/descendo 2 marchas, usando "boost" (turbo) ou excedendo velocidade em curvas), ele é obrigado a acrescentar HEAT CARDs em seu deck de compras. Fatalmente estas cartas vão parar na sua mão e como não permitem mover o carro e não podem ser descartadas de forma “natural”, elas estão ali para "sujar" seu deck, reduzindo suas opções de movimento durante um turno.
Só é possível se livrar delas reduzindo a velocidade do seu carro (marchas) ou por meio de alguma carta de upgrade com ícones específicos.
No entanto estas cartas são necessárias. Você precisa delas justamente para mover mais no seu turno e é esse "compra/descarta" delas que dá ao tom da mecânica do HEAT. Você precisa aquecer seu motor para mover mais porém tem que resfriá-lo para justamente poder aquecê-lo novamente.

"Heat Card", que basicamente dá nome ao jogo, é uma carta que aquece seu motor. Saber usar essas cartas para ganhar movimentos extras é a chave para a vitória.
Também temos as STRESS CARDs, cartas que tentam simular "lapsos de concentração". Sempre que estas cartas forem jogadas para mover o carro, o jogador deve comprar cartas aleatórias do seu deck para somar ao seu movimento, tornando impossível saber o quanto o jogador irá mover num turno, o que pode ser perigoso ao estar próximo de uma curva pois se exceder a velocidade nelas, tem que pagar com HEAT CARDs.
EU JÁ FALEI QUE O JOGO É BONITO?
Imagens falam mais que mil palavras, então...

Cartas de Velocidade: Não tem como não se encantar.

Os painéis são um show a parte.

Miniaturas. Sem comentários!
BOTS SÃO SEUS AMIGOS
Seguindo a boa cartilha dos jogos de corrida os criadores do HEAT acrescentaram BOTs no jogo para entreter jogadores solitários ou aumentar o ‘pega’ com os amigos e o resultado final até que ficou bastante satisfatório. O jogo chama os bots de LENDAS e eles realmente correm bastante nos dando muito trabalho nas primeiras partidas, porém com o tempo se tornam previsíveis e acabam necessitando de uma “forcinha” (aumentar seus movimentos) para se tornarem oponentes mais desafiadores.

Os BOTs tem 10 cartas e cada carta movimenta todos os BOTs da pista. Bem fácil de gerenciá-los.
Eles são auto gerenciáveis e movidos exclusivamente por meio de uma carta comprada a cada início de rodada (uma única carta move todos os BOTs quantidades diferentes de movimento - uma ótima sacada dos criadores).
Jogadores experientes saberão usar os BOTs como “ferramentas” para ganhar casas extras já que o jogo permite pegar o VÁCUO o que pode permitir poupar cartas da mão na hora do movimento.
CIRCUITOS
Os 4 circuitos básicos oferecidos no jogo (EUA, FRANÇA, INGLATERRA e ITÁLIA) são muito parecidos do ponto de vista do desafio, contendo longos trechos de reta e pouquíssimas curvas - e isso foi feito de forma proposital. Enquanto alguns são baseados em traçados originais da década de 60 (porém bastante modificados), outros não tem nenhuma semelhança com a realidade. Cada circuito vai informar a quantidade de cartas HEAT e STRESS a serem usadas pelos jogadores, o que pode tornar as provas mais fáceis ou mais difíceis.

Os circuitos são bem semelhantes em desafio, sendo o EUA mais equilibrado e a Gran Bretânia o mais "trabalhoso".
O sistema de CHUVA do jogo é um pouco estranho, você espalha tokens de condição em vários pontos da pista e eles atuam naquele ponto dificultando ou facilitando (?!) determinados trechos (reduzindo ou aumentando a velocidade em curvas entre outras coisas). Aqui a ideia obviamente é variar a dificuldade dos traçados a cada partida.

Correr com chuva permite espalhar diversos tiles pela pista para trazer modificadores em alguns trechos, permitindo desafios diferentes para um mesmo circuito sempre que for correr com pista molhada.
FAÇA BONITO DIANTE DAS CÂMERAS
O modo avançado chama bastante atenção pois tira muitos jogadores casuais de sua zona de conforto. Além de liberar quase uma centena de cartas de upgrade, neste modo é possível disputar campeonatos com regras específicas para cada circuito.


Campeonatos acrescentam eventos a cada pista, incentivando os jogadores a ocuparem boas posições.
Algo que achei interessante são os Patrocinadores. Quando montar uma pista para disputar um campeonato os jogadores colocam tokens de "imprensa esportiva" em algumas curvas, simulando que eles estão ali, esperando que algum piloto arrojado realize alguma manobra impressionante (passar na curva 2 pontos acima da velocidade permitida ou ultrapassar alguém na curva usando vácuo). Se o fizer, o jogador ganha uma carta de patrocinador, uma poderosa carta de movimento que lhe dará um ótimo benefício mas deve ser descartada na sequência.

Imprensa Esportiva: Faça bonito nestas curvas e ganhe cartas de Patrocinador, que permitem mover bastante no seu turno.
HAJA UPGRADE
A "cerejinha do bolo" do jogo são sem dúvida as CARTAS DE UPGRADE. São 48 cartas únicas que podem ser dividas em 17 cartas básicas e 31 cartas avançadas. Desta forma, mesmo ao dar seus primeiros passos no modo Avançado (que aumenta a curva de dificuldade do jogo), ao usar cartas básicas de upgrade os jogadores se adaptam melhor pois elas tem menos figuras e consequentemente são menos complexas de serem compreendidas.
Já as 31 cartas de upgrade do modo avançado exigem mais dedicação no seu uso pois misturam diversos ícones que vão exigir bastante atenção na utilização.

Upgrade Avançado: É disso que eu tô falando! Senta o pé nessa p****!
No modo avançado os jogadores realizam um sistema de “Draft” e escolhem 3 dessas cartas para inserir em seus decks de corrida.
Basicamente essas cartas oferecem a possibilidade de “melhorar” o seu carro de forma bastante tática. Elas podem oferecer uma boa vantagem de movimento, porém exigindo a compra de Heat Cards ou podem mover menos mas oferecer a chance de esfriar o motor ou alguma outra vantagem tática boa para ser explorada.
Aqui reside um dos maiores sucessos deste jogo pois há 2 cópias de cada uma das 48 cartas (somando 34 cartas básicas e 62 cartas avançadas). No modo avançado é possível combinar os 2 decks totalizando absurdas 96 cartas de Upgrade. É claro que com essa quantidade toda há cartas bem "overpower" e outras bem ruins e será preciso jogar bastante para identificá-las.

Cartas de Upgrade: 48 cartas duplicadas permitem escolher 3 dentre as 96 cartas disponíveis antes da corrida começar. Demora até encontrar as "preferidas".
CONCLUSÃO
Se você teve saco pra ler tudo o que foi escrito acima, já deve ter chegado à conclusão do motivo pelo qual esse jogo está fazendo tanto sucesso. Com poucos meses do seu lançamento os criadores já anunciaram uma expansão, já temos mais de 30 circuitos feitos por fãs e até falsificações do jogo no mercado uma vez que o jogo esgotou rapidamente nas lojas (um novo reprint já está programado). Arrisco dizer que HEAT PEDAL TO THE METAL não vai tardar a assumir a pole position dos jogos de corrida casuais fazendo FORMULA D e RALLYMAN GT comerem poeira.

Entusiastas não perderam tempo. A simplicidade dos traçados permite criar pistas novas facilmente.

Achei que fosse morrer e não ver um jogo com a pista de NURBURGRING...
Se você não leu e pulou direto pra cá, vamos tentar explicar o motivo desse hype.
Apesar de sua grande semelhança com FORMULA D no que tange ao "charme" dos componentes (miniaturas, painel do carro, pistas) e a jogabilidade relativamente simples, HEAT está bem longe de ser um mero "FORMULA D com cartas". Temos que lembrar que os pais deste jogo são "Asger Harding Granerud" e "Daniel Skjold Pedersen", os mesmos criadores do FLAMME ROUGE. Sua mecânica de "gerenciamento de mão" foi bastante inovadora e até hoje e bastante elogiada por criadores de jogos de corrida.
HEAT começou a nascer em 2018. Seus criadores até tentaram criar algo mais próximo da simulação, acrescentando elementos como pit stop e gerenciamento de recursos porém isso não foi possível devido a mecânica no FLAMME ROUGE embutido nele, o que tornaria o jogo muito complexo. Tudo isso é descrito num "diário" em PDF disponibilizado para download no site da DAYS OF WONDER onde os criadores apresentam todo o "martírio" para se chegar ao produto final.
HEAT é um jogo sedutor porque conquista aos poucos. Com um visual extremamente agradável e uma jogabilidade muito intuitiva, todos os seus elementos (do básico ao avançado) se encaixam muito bem. Ele foi pensado para ser modular, ou seja, você começa pelo modo básico e vai acrescentando elementos avançados de modo a dosar seu aprendizado (BOTs, Chuva, Cartas de Upgrade), sem cair diretamente na arena dos leões (muito simulador por ai deveria aprender com isso). Suas pistas são muito simples, fáceis de serem lidas e interpretadas. Sua mecânica de jogo é rápida, todos mundo baixa cartas de movimento simultaneamente sem se importar com o que seu oponente vai fazer, mas muitas vezes permitindo adivinhar justamente para fazer uma jogada mais precisa, explorando o vácuo do adversário. Além dessas qualidades, coloque nesta conta um sistema de "gerenciamento de mão" que permite um controle absoluto sobre o carro. Você sabe o quanto vai mover, o quanto vai consumir de "recursos" bem como suas escapadas de pista (só roda se quiser).
Seu fator sorte está na "mão de cartas" compradas a cada turno. Você não sabe o que virá na sua mão mas caso não goste, algumas carta de upgrade ou cartas de stress permitem fazer 'compras cegas' para ajudar a mover o carro. É a parte do "risco" que todo bom jogo de corrida precisa ter para provacar o friozinho na barriga.
Isso que eu nem citei os demais elmentos como chuva que modifica as características de uma pista a cada partida, modo campeonato com eventos exclusívos para cada circuito, BOTs que permitem jogar solo e se adaptam a qualquer novo circuito (oficial ou homemade) e quase uma centena de Cartas de Upgrade que vão exigir toneladas de partidas para testar como elas afetam a jogabilidade em cada pista.
- Mas afinal, esse jogo tem defeitos?
É claro que tem, e vários. Mas eles só atrapalham os que buscam algo mais que um jogo casual. Se for esse o seu caso, não recomendo descartar o HEAT totalmente dos seus planos mas sim dar uma olhada melhor nos videos de gameplay disponíveis na internet para tirar suas próprias conclusões, mas já vamos adiantando alguns problemas que saltam aos olhos:
- Nenhuma dificuldade nas ultrapassagens, pistas com baixo grau de desafio sendo muito semelhantes entre si, ausência de pit stop e carros que permanecem juntos durante quase toda a prova, fazendo-a ser decidida apenas perto da linha de chegada onde uma “mão sortuda” pode falar mais alto que uma boa estratégia. Sem 'mimimi', galerinha. O jogo foi feito para agradar ao público CASUAL e isso tem um preço.
HEAT foi uma grata surpresa. É um jogo perfeito para quem nunca jogou corrida na vida ou aqueles apaixonados que acham FORMULA D ou RALLYMAN GT os melhores jogos do mundo. Simples, rápido, intuitivo, charmoso e com baixo fator sorte, é quase uma obrigação na coleção de qualquer fã de corrida. Para fãs de simulação resta olhar para o HEAT com aquele olhar de "jogo filler", aquele jogo para se ter na coleção para trazer mais gente para o hobby ou dar aquela descontraída com os amigos.
ACELERA
- Arte visual muito bonita baseada nos carros da década de 60;
- Miniaturas "vintage" de ótima qualidade;
- Regras fáceis;
- Modo campeonato muito divertido;
- Quase 1 centena de cartas de upgrade aumentam a rejogabilidade;
- BOTs (carros controlados pelo tabuleiro) para partidas solo ou com amigos;
- Simulação de Aquecimento/Resfriamento do motor bastante eficiente;
- Cartas sem presença de texto tornam o jogo independente de idioma;
- Sistema de chuva altera as características de uma pista a cada corrida;
- Comunidade bastante ativa, já criou mais de 30 circuitos para o jogo;
DERRAPA
- Ausência de pit stop;
- Nenhuma dificuldade nas ultrapassagens;
- Pistas muito simples com curvas pouco desafiadoras;
- Algumas cartas de upgrade são bem desbalanceadas;
- Excesso de ícones e símbolos pode confundir jogadores mais inexperientes;
- Com o tempo Bots requerem house rules para se tornarem bons oponentes;