"É impressionante ver como a arrumação de um manual pode influenciar tanto no jogo."
Foi assim que o Cacá, nosso querido DrGrayrock do "E aí, tem jogo?" chamou a atenção para os manuais em um artigo aqui da Ludopedia no ano passado.
Realmente, um item que está sempre em pauta no fórum, quase sempre por erros de tradução e, o que pode ser ainda mais terrível, de escrita.
Com os jogadores cada vez mais preocupados com a experiência completa proporcionada por um jogo de tabuleiro e a necessidade de um material de fácil leitura pela galera do videogame, Patrick e eu sabíamos que o manual do O Bom do Videogame deveria agradar tanto quanto o jogo em si.
Logo, demos tanta atenção ao manual quanto demos ao próprio jogo.
Duvida?
Saca só:
De cara a jornada começou com muita pesquisa, sendo o pontapé inicial um artigo que já tinha lido, mas agora estava pronto para devora-lo.
Uma reunião de alguns conhecimentos da perfumada autora do Grasse, Bianca Melyna:
Dez dicas para escrever seu Manual
Na sequência, as experiências do Renato Lopes do Tábula Quadrada, que também escreve manuais.
Qual o Segredo de um Bom Manual - Cortes Nórdicos

!!!Spoiler!!! É só jogar na mão do Renato.
E isso em português, porque ao partir para o material internacional eu fui soterrado por mais conteúdo.
How to Write a Board Game Manual
Following rules is hard, writing rules is harder!
Writing Rules (com multiplos artigos)
A árdua tarefa de destrinchar esse material, compreender os padrões e fazer anotações me levou à primeira versão do manual...

Mesmo em sua primeira versão o manual já era "ricamente" ilustrado.
...que já chegou ao mundo passando pelo escrutínio dos playtesters. Suas opiniões e críticas, resultantes da leitura de muitos manuais, foi o primeiro passo almejando uma qualidade dos melhores jogos internacionais.

Anotou tudo?
Após 3 versões completas do manual, lá fomos nós para o famoso Teste Cego.
Nessa modalidade o designer coloca o protótipo e o manual na mão dos jogadores e fica quietinho por perto, só observando como a partida se desenrola sem dar nenhum pitaco.
Assim, rolou a avaliação por uma lojista do hobby com amigos e clientes, um jogador do meio com sua família e um professor de Game Design com seus alunos, já em um protótipo atualizado.

Jogo na mesa, manual na mão.
Tendo sido aprovado nessa etapa, agora sim ia começar o desafio, pois a parte mais trabalhosa ainda estava por vir: Diagramação.
Para colocar cada pedacinho do texto em seu devido lugar de forma organizada foi necessário uma reestruturação completa do conteúdo, novamente visando a visando uma qualidade à nível internacional.
Isso porque é necessário que o conteúdo siga uma hierarquia de informações ao mesmo tempo que cada uma delas ocupe uma quantidade específica de páginas.
Logo, praticamente todos os textos foram reescritos, sendo reduzidos à sua essência.
Agora a missão era explicar cada regra com coerência, sem ambiguidades e com termos padronizados. Para isso realizamos baterias intensas de revisão e reescrita, ajustando cada vírgula.
E aqui, embora não pareça, foi onde exigiu mais dedicação de nossa parte, tamanha a quantidade de revisões e ajustes.

Isso que você leu em segundos rendeu mais de 9 horas nesse processo! Imagina o resto...
Nessa etapa os manuais de jogos consagrados como Terra Mystica e Projeto Gaia foram destrinchados, junto com vários outros que serviam como bom exemplo... ou não.
Um detalhe que avaliamos em cada manual foi como o negrito estava sendo utilizado e, embora tenhamos encontrados modelos interessantes, resolvemos usar esse conceito de uma forma unicamente nossa.
No manual do O Bom do Videogame, se você ler apenas os textos em negrito eles servirão como um resumo da regra, chamando a atenção em uma primeira leitura, mas principalmente te lembrando as regras ao ler durante uma partida.

Leia apenas o segmento de texto que estiver grafado em Negrito.
À propósito, essa estratégia de fazer o jogador relembrar as regras também foi utilizada na confecção de uma Carta Guia, contendo todas as etapas do jogo de forma iconográfica.

Pode parecer confuso à primeira vista, mas depois de ler as regras, tudo fará sentido e a lembrança vem fácil.
E outro conceito diferenciado foi que, mesmo durante a escrita do manual, aproveitamos a oportunidade para polir, no jogo, regras que visualizamos uma dificuldade de traduzi-las para um formato escrito, logo, regras que poderiam ser facilitadas.
Por exemplo, o descarte ocorria sempre que um jogador acumulava mais de 8 fichas, se tornando uma regra deslocada. No novo manual essa regra foi centralizada em sua etapa específica. A Fase de Descarte.

Falou em Descarte? Tá tudo aqui.
Finalmente, com tudo ajustado, lá foi o manual ganhar o mundo com novas avaliações dos playtesters, revisões adicionais e mais um tanto de teste cego.

Saca só como ficou a versão final dessa página do manual antigo.
Ufa...
Tudo isso e mais um pouco resultou no material que agora está em suas mãos.
O Livro de Regras do O Bom do Videogame:

Como você pôde acompanhar, foi uma criação nível Hard, mas Patrick e eu acreditamos que valeu cada gotinha de suor.
Afinal, ler o manual é uma fase que é sempre melhor jogar no Easy, né?