Quando o jogo é competitivo e jogam 03 ou mais jogadores, não tem jeito. A interação entre os múltiplos jogadores terá um peso na definição da vitória. Como deveria, inclusive, afinal os jogadores estão jogando uns contra os outros. Se isso não acontecesse, seria uma falha no design do jogo.
Uma consequência do peso dessa interação no jogo é alguns jogadores se sentirem injustiçados.
"Fulano me marcou o jogo todo"
"Ciclano só fazia me atrapalhar"
Ou, até pior, sentem que outros foram beneficiados.
"Beltrano ajudou Fulano o jogo todo, parecia que estavam jogando em dupla"
Algo na vibe do bastante desagradável - king making
Vou analisar um pouco essa questão.
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Uma das características de um jogo tradicional é a noção de "desafio". É essencial que o jogador se sinta desafiado, na busca pela vitória, a derrota deve ser uma opção factível, para que se gere a "tensão" necessária.
E o nível desse desafio deve estar muito bem ajustado. Via de regra, as pessoas não querem jogar um jogo onde é quase impossível perder ou quase impossível vencer.
Para que o nível desse desafio esteja bom para todos é importante que todos os jogadores "joguem bem".
Um enxadrista não tem interesse em jogar contra uma criança que só sabe mover as peças, não há desafio. Da mesma forma, os melhores jogadores do mundo buscam jogar entre si, qualquer um que não seja um profissional não o desafiará. (O desafio também não pode ser excessivo. Não é agradável jogar contra um adversário que você não acredita que pode vencer, como uma engine no xadrez.)
Então, quando um jogador se sente injustiçado no contexto da interação na partida, eu acho que pode ser traduzido como:
"Fulano tomou decisões que não lhe favoreceram muito no jogo, inclusive elas ajudaram bastante na vitória de Ciclano. Fulano não jogou bem e isso prejudicou a minha experiência na partida."
Importante salientar que esse sentimento pode ser compatilhado pela própria pessoa que foi "ajudada". Você fica torcendo pra seus adversários não fizerem ações que te prejudiquem, em alguns jogos você até negocia isso com eles. Mas, se chegar um ponto em que você acredita que vai vencer principalmente porque Fulano não está jogando bem e está lhe favorecendo, não é um sentimento legal.
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O problema é que a grande maioria dos casos não é tão extremo. Em determinados contextos no jogo, no turno de Fulano, é dificil dizer se é melhor para ele atacar Beltrano ou Ciclano. Pior ainda é se Fulano já está muito distante da vitória, que está sendo disputada entre os dois. Nesses casos, consigo pensar em pelo menos três mentalidades diferentes
I - Neutralidade
"Não vou atacar nenhum dos dois, mesmo que isso pudesse me render alguns pontos a mais. Esses pontos não fariam diferença no resultado da partida, eles estão disputando, eles se resolvem."
Essa não é minha mentalidade, eu acredito que isso é se abster de jogar no fim e a ideia do jogo é que você permaneça fazendo suas ações/seus ataques e interagindo com os demais até o fim, independente da sua pontuação.
II - Tentar alcançar posições melhores
"Eu não consigo alcançar a pontuação de Ciclano, impossível. Mas, com sorte posso ultrapassar Beltrano, vou ataca-lo para lutar pelo segundo lugar."
Particulamente, apesar de entender, também não gosto dessa mentalidade. Ousaria dizer que isso é jogar mal, inclusive. Defendo isso baseado no conceito de competitividade.
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A competitividade, a meu ver, é buscar sempre se aproximar da vitória. A ideia é vencer, mas se não for possível, ter ficado o mais próximo possível de vencer. Numa corrida, cada posição conseguida lhe coloca mais perto da vitória, sempre. Mas, na maioria dos jogos isso não é o caso.
Se numa partida o resultado é
Ciclano 14
Fulano 9
Beltrano 8
E na outra o resultado é
Ciclano 14
Beltrano 13
Fulano 12
Eu acredito que Fulano jogou melhor na segunda partida, ficou a 02 pontos de alcançar o vencedor. Na primeira, acabou bem atrás. Na minha opinião, é praticamente irrelevante se ele foi 2º na primeira partida e 3º na outra. Competitividade, como eu a enxergo, é buscar se aproximar da vitória sempre, o que num jogo de pontos é fazer a maior quantidade de pontos possíveis em relação ao vencedor.
O que nos leva a última mentalidade
III - Se aproximar da vitória
Essa é a mentalidade que tenho em todo jogo competitivo. Em toda decisão que tomo, procuro me aproximar da vitória (e se tudo der certo, vencer). Se Ciclano ou Beltrano serão ajudados ou prejudicados com minhas ações, é sempre algo secundário. Sempre me guio com a pergunta "quais minhas chances de vencer? Qual decisão vai maximizar essas chances?"
Nesse cenário, eu sempre irei dar meu melhor para impedir que qualquer outro jogador vença, afinal se outro vence minhas chances cairam para 0%. As vezes você sabe que já é impossível vencer, nesses casos, busco me aproximar da vitória o máximo possível (o que pode ser fazer mais pontos ou controlar mais fortalezas). Quero que minha pontuação seja a mais próxima possível do vencedor.
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Uma último comentário, eu acho negativo quando decisões são tomadas baseadas em fatores "extra-mesa" ainda que em determinado nível talvez seja inevitável. Uma pessoa atacar (ou não atacar) a outra por conta da dinâmica social deles fora do jogo.
E quanto a utilizar o fato de que Fulano é um jogador muito experiente e competente para marca-lo desde o inicio? Jogo limpo ou utilização negativa de fatores extra-mesa? Você se identificou com alguma mentalidade? Concorda com a análise?