
Faz tempo que não faço um minireview, porque costumo fazer reviews apenas de jogos ainda sem review aqui, e ultimamente só joguei jogos bem conhecidos.
Mas Veilwraith teminou esse jejum... É um jogo que evoca a poesia do tema pela sua arte e mecânicas.
Seu espírito solitário (o jogo é solo) vaga de um lado do mundo para o outro, lado esse onde precisa atravessar o purgatório para retornar à sua Fonte.
Mas, como o Corvo de Edgar Allan Poe, essa passagem é pela escuridão, e confusão, e vazio. Dêem uma lida em alguns trechos para pegar a ideia:
The Raven
Once upon a midnight dreary, while I pondered, weak and weary,
Over many a quaint and curious volume of forgotten lore—
...
Eagerly I wished the morrow;—vainly I had sought to borrow
From my books surcease of sorrow—sorrow for the lost Lenore—
For the rare and radiant maiden whom the angels name Lenore—
Nameless here for evermore.
And the silken, sad, uncertain rustling of each purple curtain
Thrilled me—filled me with fantastic terrors never felt before;
...
Open here I flung the shutter, when, with many a flirt and flutter,
In there stepped a stately Raven of the saintly days of yore;
Not the least obeisance made he; not a minute stopped or stayed he;
...
“Though thy crest be shorn and shaven, thou,” I said, “art sure no craven,
Ghastly grim and ancient Raven wandering from the Nightly shore—
...
But the Raven, sitting lonely on the placid bust, spoke only
That one word, as if his soul in that one word he did outpour.
Nothing farther then he uttered—not a feather then he fluttered—
Till I scarcely more than muttered “Other friends have flown before—
On the morrow he will leave me, as my Hopes have flown before.”
Then the bird said “Nevermore.”
...
Você pode ver também a tradução de Machado de Assis, de 1883:
Com longo olhar escruto a sombra,
Que me amedronta, que me assombra,
E sonho o que nenhum mortal há já sonhado...

O jogo
Para atravessar os cinco purgatórios que fazem os cinco capítulos da campanha, seu espírito precisa obter as cinco chaves (amor, luz, poder, visão e coragem) e também derrotar os guardiões daquele purgatório. Com isso completo, precisa atravessar o portal. Se demorar demais, o arquidemônio entra no baralho de ameaças - se encontrá-lo, saiba que é o seu fim.
Cada jogo leva uns 30-40 minutos, e, com 5 jogos completos, isso é uma campanha. Você pode ir jogando a campanha várias vezes, melhorando as memórias e poderes do seu espírito. Achei bem difícil, mas consegui passar cada purgatório depois de 1 ou 2 tentativas. Você aprende como aproveitar as possibilidades de cada rodada e vai se virando com o que aparece.

O turno
Toda rodada, um novo acontecimento aparece e você recupera uma lembrança. Cada acontecimento tem suas habilidades e formas de ser derrotado. Cada lembraça lhe dá um poder adicional.
Você pode fazer uma ação principal, à qual as lembranças podem ser adicionadas, que pode ser derrotar um dos habitantes místicos daquele local, explorar uma das chaves ou lidar com os seres do local. Depois de usar um poder, ele fica mais fraco, dando espaço para os poderes não usados se fortalecerem, num ciclo contínuo durante aquela aventura.
A campanha
O funcionamento é sempre igual, mas, após cada purgatório, você substitui uma das suas lembranças por uma mais poderosa. Por vezes, você ganha melhorias adicionais, de acordo com o purgatório que acabou de atravessar.

Arte
A arte do jogo é fantástica - talvez uma das melhores que já vi. Os personagens são lindíssimos, tanto no traço quanto no conceito - anjos, rei dos goblins, eremitas, místicos. Eu não gosto de temas escuros, mas essa arte precisou meu elogio apesar do preconceito. Ela evoca a poesia do tema do jogo muito bem. Acho que esse efeito foi o fator principal para eu adquirir o jogo antes de jogá-lo.
Shadowrun Crossfire x Onirim x Oh my goods
Esse jogo lembra uma mistura de Shadowrun Crossfire com Onirim, dois jogos ótimos e muito bem conceituados. Cada purgatório dura um pouco mais que um jogo de Shadowrun, e tem mais coisas para fazer. No shadowrun, você só ataca o inimigo ou, no máximo, cura seu amigo. Aqui você precisa preparar seus turnos futuros e ficar de olho no objetivo final também. Há menor sorte no Veilwraith do que no Shadowrun - os inimigos são certos ao invés de aleatórios, e portanto não tem a chance de pegar só fáceis ou só difíceis. Apesar disso, cada inimigo, apesar de ter o mesmo nome (Serafim, por exemplo), possui variação nas suas capacidades.
No entanto, cada turno em si é um pouco mais leve, fazendo uma ação, jogando uma carta e melhorando a ação restante. O tema e a questão de achar as portas lembra um pouco o Onirim, só que com menos sorte ao embaralhar.
Lembra também o feeling de jogar a campanha do Oh My Goods! Revolta em Longsdale - não que o gameplay jogo seja parecido, mas é um quebra-cabeças que ao jogar, um me lembra ao outro.
*
O pássaro-alma
Ó ignorância-mundo,
Apesar
de você ter algemado meus pés,
estou livre.
Apesar
de você ter acorrentado minhas mãos,
estou livre.
Apesar
de você ter escravizado meu corpo,
estou livre.
Estou livre porque não sou do corpo.
Estou livre porque não sou o corpo,
Estou livre porque sou o pássaro-alma
Que voa no Céu-Infinidade.
Sou a criança-alma que sonha
No Colo do Rei Supremo imortal.
– Sri Chinmoy