Conheci o Cosmos no DOFF de 2.018 se não me engano e lembro que na época já me apaixonei pelo jogo. O protótipo já estava excelente, era um jogo com tema espacial, que é meu tema preferido, com mecânicas bem encaixadas e o melhor, feito no Brasil. Foi um must have na época e um dos jogos que mais segui nas redes (e enchi o saco da minha lojista pedindo novidades), desde que soube que seria financiado pelo catarse. Assim, no dia que minha lojista informou que o jogo estava lá, sai correndo pra pegar literalmente.
Sendo assim, o principal motivo para este review existir é que eu gostaria muito que mais pessoas conhecessem o jogo. Acho essencial incentivar o mercado nacional, fora que o jogo veio com um preço muito bom e eu creio fielmente, sem querer desmerecer os demais jogos BR, que este é o melhor jogo brasileiro que já joguei. Então, deixando de lado a conversa fiada, vamos ao que interessa:
Em cosmos, somos protoplanetas orbitando ao redor de uma estrela conhecida como Beta Eva e nosso objetivo é deixar o planeta o mais habitável possível (pelo menos habitável conforme a vida que conhecemos na terra atualmente), melhorando a atmosfera, temperatura, rotação e gravidade. Ao todo, temos 07 rodadas no jogo para realizar estas melhorias.
Cada rodada representa 1 bilhão de anos, e neste bilhão de anos, temos que obrigatoriamente jogar uma carta da mão e realizar a ação dela e opcionalmente comprar uma nova carta de 04 baralhos disponíveis.
Jogo em ação rolando em 2 players
No começo da partida cada jogador possui 03 ações por rodada, porém conforme o tempo vai passando é possível liberar mais ações.
As cartas permitem ações tais como fazer o movimento de translação andando com o planeta, absorver elementos próximos como nitrogênio, oxigênio, carbono, hidrogênio e ferro, que são necessários para melhorar as características planetárias citadas anteriormente e até coisas mais elaboradas, como criar luas ou satélites, sempre com o objetivo de absorver o máximo possível de “nutrientes espaciais” que vão te ajudar nos objetivos.
Dessa forma, o jogo funciona como um deck building com algumas aspas, pois não é um deck building convencional daqueles que todo turno compramos várias cartas, utilizamos e repomos a mão. E sim no sentido de verificar se alguma carta disponível vai encaixar na estratégia que você está construindo e a partir disso comprar aquela carta para melhorar suas ações.
Quando todos os jogadores terminam suas ações entramos na fase estelar, em que todos os elementos (menos os protoplanetas), são puxados pela gravidade da Estrela e se aproximam mais do centro do tabuleiro e da fase de translação, onde os planetas andam ao redor de Beta Eva absorvendo tudo que encontram pelo caminho.
Sério, é um dos jogos mais temáticos que já joguei e dá muito orgulho de verdade de ser um jogo BR. Todas as ações possíveis fazem sentido tematicamente. Melhorar as características protoplanetárias dá bônus que condizem com as melhorias, como por exemplo melhorar a rotação dá mais ações por rodada e melhorar a gravidade permite puxar elementos de mais longe, além de liberar um efeito mais forte em algumas cartas. Acho que tudo foi pensado de forma a encaixar no tema. Os planetas mais próximos da Estrela por exemplo começam a partida extremamente quentes, enquanto os dois mais afastados são o oposto e quando o jogador aciona alguma carta que permite o planeta aproximar ou afastar sua órbita, a temperatura também sobe ou desce.
Quanto a rejogabilidade, apesar das poucas partidas, creio que é bem alta por vários motivos. Primeiro, existem quatro baralhos para compra de cartas mas apenas três são fixos e entram todas as partidas. O último baralho pode ser escolhido pelos participantes, ou entrar de forma aleatória. De qualquer forma, cada um funciona de forma diferente. Um é focado em fazer muitos pontos uma única vez com uma ação mais forte, outro acrescenta um pouco de take that e assim por diante.
Esse evento aleatório que coloca um gato no tabuleiro é assustador. rs
Segundo, o jogo tem vários caminhos para a vitória. Cada partida terminada eu fiquei com vontade de focar em outra coisa. Existem cartas que dão pontos sempre que são jogadas por exemplo, então uma estratégia pode ser melhorar a atmosfera e sair jogando cartas pra ganhar muitos pontos durante a partida. Ou então melhorar rotação e sair ganhando mais ações. Não teve nenhuma partida que joguei igual e em todas senti que podia ter explorado caminhos diferentes.
Mas nem tudo são flores (ou planetas habitáveis, bá-dum-tss).
Bom, chegou a hora de falar do que não gostei do jogo. São poucas coisas e na real, meu intuito (e talvez prepotência minha) é apenas levantar voz da comunidade para que numa futura reimpressão, que eu espero sinceramente que aconteça por que o jogo merece ser um sucesso, sejam melhoradas.
Em primeiro, componentes todos são ótimos. Sério. Tabuleiro, cartas, tokens, todos tem boa gramatura. Único porém é a impressão do tabuleiro que é bem escura. Sinto que o espaço central poderia ser melhor preenchido com imagens de galáxias, estrelas e etc. Ficaria mais bonito.
Ele também é extremamente escuro na trilha de pontuação. Inclusive existem locais de pontuação que não podem ser ultrapassados sem melhorar a atmosfera, mas esses locais são bem apagados. Não que seja impossível de ver, mas poderia ser beeeem melhor e sem incrementar os custos de impressão.
Tabuleiro e trilha de pontuação são meio apagados.
Outra coisa que me incomodou bastante foi o manual. Na verdade, eu já estava pensando em fazer o review mas vinha enrolando, até que hoje cedo um amigo me perguntou se eu já tinha jogado o jogo e quando respondi afirmativamente, ele me perguntou “ok, me ajuda então e como eu volto as cartas que já joguei pra mão?”
Isso exemplifica bem algumas coisas. Creio que faltou talvez outras pessoas que não fizeram parte da produção do jogo e nem fizeram os playtests lerem o manual, pois as vezes para estas pessoas alguma coisa era óbvia, como a informação de como as cartas voltam para a mão, e nem perceberam que isso não estava explicado no manual.
Na parte da ação dos jogadores é dito “na sua vez o jogador DEVE jogar uma carta” e é isso. Onde essa carta fica depois de jogada? Vai pro descarte? Fica na sua frente? Não sabemos. Pode parecer simples pra quem já jogou, mas mesmo jogadores experientes que vão fazer associação com outros jogos podem ter dúvidas. Será que quando acabar as cartas da mão todas as abaixadas voltam? Não sei. E o manual não diz. Aí, quando vamos jogar a primeira partida vemos que existe uma carta chamada “novo ciclo” que permite recuperar todas as cartas já jogadas. Ok, é fácil de ler essa carta e entender, mas quando eu li o manual e antes de jogar a primeira partida, fiquei pensando bastante em como as cartas voltavam pra mão, eu lembrava do DOFF que tinha algo que faziam elas voltarem (e não que era automático a volta), mas como até meu amigo teve a mesma dúvida, percebi que mais pessoas podem pensar igual. As cartas “Pulverizar” e “Arquivar” fazem referência a “sua área de jogo”, porém não lembro de ler no manual qualquer informação sobre isso. Ok, é fácil presumir o que é a área de jogo, mas lembrem, o manual diz “o jogador DEVE jogar uma carta e não fala se ela vai pro descarte, se fica na mesa, se a depender da carta ela fica na mesa separada das demais ou sai do jogo (coisas que podem acontecer durante a partida). Enfim, ao meu ver um simplesmente falar no manual “o jogador DEVE jogar uma carta que ficará em sua área de jogo” já resolveria. Acho ruim terminologias que não estão no manual e apenas em cartas, mesmo essas terminologias simples.
Outra coisa que achei contraproducente são as formas de pontuar/melhorar as características planetárias.
Para melhorar a atmosfera por exemplo, é possível ir colocando elementos aos poucos e quando alcançar a quantidade necessária, liberar aquele espaço. Porém para gravidade e rotação isso não acontece, sendo necessário ter todos os recursos antes de passar para os próximos níveis. Tudo bem que são trilhas diferentes e a explicação tá ali no manual (de uma forma que eu particularmente achei confusa, mas pode ter sido apenas desatenção minha), mas o fato é puxando referências de outros jogos que já jogamos, podemos acabar pensando pensando que todas as trilhas funcionam igual, mas não é o caso.
A pontuação de fim de jogo também é mal explicada. No manual é dito:
“Todos os pontos alcançados no tabuleiro individual de jogador;
Todos os pontos de fim de jogo nas cartas na mão e na área de jogo do jogador;
1 ponto para cada 2 recursos que sobraram”.
Ok, o problema é: atmosfera, cada NÍVEL pontua separado. Assim, a trilha de atmosfera pode possuir três pontuações diferentes até um máximo de 20 pontos. Já nas trilhas de rotação e gravidade, a pontuação é baseada apenas pelo nível alcançado. Percebam que os três são características que precisam ser melhoradas, porém funcionam de forma diferente e isso não é explicado em lugar nenhum. A explicação do designer faz sentido: Rotação e gravidade dão vantagens durante a partida. A vantagem da atmosfera (ganhar mais pontos) é efetivamente pior que as outras. Mas isso não é dito no manual, então não temos como saber, baseados em uma linha apenas, que uma trilha vai pontuar de forma diferente das outras simplesmente por questões mecânicas.
Pior ainda, numa explicação aqui na ludopédia o criador informou que no caso da rotação e gravidade, a pontuação é apenas do lugar em que o marcador PARAR. Então por exemplo, você está num espaço que vale 06 pontos no final do jogo. Se melhorar a característica vai pra um espaço vazio e aí melhorando de novo vai pra um espaço que vale 12 pontos. Bom, se o jogo acabar e você estiver nesse espaço vazio entre o 06 e o 12, você não pontua nada. Tudo bem isso ser uma escolha do design, não é isso que eu estou julgando e sim o fato de que, de uma única linha no manual, eu tenho que abstrair que: Atmosfera pontua de forma diferente de rotação e gravidade e que rotação e gravidade pontuam pelo local onde o marcador parou e não pela pontuação que alcançou. Um simples quadro exemplificando a pontuação de fim de jogo já ajudaria.
Por fim, única questão do design que me incomodou foi em relação a temperatura e asteroides. A temperatura é o único atributo planetário que você não tem muito controle sobre o aumento/diminuição. Isso fica a cargo de eventos que sobem ou descem aleatoriamente a temperatura, algumas cartas e os asteroides. Bom, em relação aos eventos já há tópicos aqui que sou obrigado a concordar. A aleatoridade pode criar partidas em que jogadores ganhem pontos sem fazer absolutamente nada enquanto outros vão passar a partida lutando contra a temperatura. As cartas ajudam um pouco mas talvez não o suficiente já que não é possível comprar mais de uma com o mesmo nome, fazendo assim com que seja limitada a forma de subir/descer a temperatura conscientemente (além de precisar da sorte da carta estar disponível pra compra).
Já os asteroides funcionam como elementos coringa. Quando dois elementos colidem no tabuleiro, eles viram um asteroide. Absorver um asteroide permite que o jogador suba ou desça a temperatura conforme preferir bem como tem um elemento coringa. Meu problema com essa mecânica é:
Para dois elementos colidirem e criar um asteroide, eles devem estar na orbita mais próxima de Beta Eva, que é quando o tabuleiro começa a afunilar. É até possível algum token de asteroide ser sorteado e entrar em um local mais afastado do tabuleiro, mas a chance desse token aleatório entrar num espaço afastado do tabuleiro ou num espaço próximo ao centro é a mesma (e são poucos tokens de asteroide que entram em jogo desse jeito aleatório a maioria vem da colisão de elementos pelo menos nas minhas partidas), ou seja, praticamente apenas os dois jogadores com órbitas mais próximas da Beta Eva vão ter acesso certo a asteroides, que são poderosos coringas e ajudantes no controle da temperatura. Deixar claro que essa opinião é baseada em poucas partidas. Não sei se isso é balanceado de outra forma que não pude perceber, mas é apenas um sentimento que ficou.
Por fim, fica aqui a vontade de ver este jogo alçar voos cada vez maiores, por que com certeza é um trabalho hérculeo lançar um jogo no Brasil com apoio coletivo e entregar algo tão legal e de tanta qualidade. Minha esposa que não é gamer mas joga pra me agradar, sempre sugere o Cosmos quando tá a fim de jogar algo, então pelo menos aqui o jogo foi aprovadíssimo. A reclamação é mais mesmo sobre o manual, mas não por que quero denegrir o game e sim pela vontade de ver um jogo tão bom ficar cada vez melhor. Podem pegar sem medo.
