AGRICOLA - Conheça a história do "Seu Zygidrino"
(Um conto no universo do jogo Agricola, com um misturado de lembretes de regras do jogo, uma ou outra estratégia, diversão, muita historinha pra boi dormir e quem sabe até uma inspiração espiritual.)
Zygrídino Sapopemba Leco-Leco, conhecido nas suas terras como "Seu Zygidrino", herdou a fazenda do seu pai, Xygrídino Sapopemba Leco.
(Seu Zygidrino batendo um pratão antes do sol nascer.)
Seu pai estava de cama, prestes a falecer, e disse: "Filho, jogando solo
e mais difícil obter comida. Por isso, na primeira rodada, vou lhe ensinar um novo ofício, Catador de Cogumelos, que será gratuito só desta primeira vez. Nas outras, terá de pagar um alimento. Ensinar-lhe esse ofício gratuitamente será o meu último ato aqui na Terra."
(Seu Zygidrino aprendeu com o pai como escolher cogumelos comestíveis nos troncos de árvore.)
Sua esposa, a Dona Zyrgridrina, foi buscar madeira e cogumelos com os conhecimentos adquiridos do seu sogro, e trocou uma das duas madeiras coletadas (no jogo solo só entram 2 madeiras por rodada) por dois alimentos.
(Foto da Dona Zygidrina em casa com a mascote Mimosinha antes de lidar no campo.)
Enquanto Seu Zygidrino trabalhava seus dias na fazenda, sol a sol, domingo a domingo, um anjo celestial, chamado Romival, cantava as Glórias do Senhor no Céu. Ele era um anjo e por isso passava seus dias inteiros só em louvor.
Lentamente, ele começou a se sentir um ser muito superior aos humanos, pois passava seus dias inteiros em atos espirituais. O Senhor viu isso e decidiu ensinar-lhe uma lição.
"Romival, meu filho querido. Tenho uma missão para você. Quero que vá visitar na Terra a criatura mais devota a Mim que existe, o Seu Zygidrino. Vá e passe 6 períodos (ou 13 rodadas ou rondas) com ele."
(Romival ainda no Céu.)
Romival abriu seus olhos na Terra, e logo sentiu o peso do corpo.
Chegando na fazenda do Seu Zygidrino e Dona Zygidrina, apresentou-se à família como um Mendigo e pediu hospedagem para alguns dias, como é de costume na roça naqueles tempos. O casal dividiu com ele o parco alimento, lenha e água que tinham, mas sentiram-se muito honrados em poder auxiliar uma outra pessoa.
(Romival se apresenta como um mendigo chamado "Token de Primeiro Jogador" ao Seu Zygidrino e Dona Zygidrina.)
Na manhã seguinte, o segundo turno da primeira rodada (ou ronda), Seu Zygidrino repetiu três vezes suas orações e foi cuidar da Floresta Privada, usando os dois alimentos que a Dona Zygidrina conseguiu catando cogumelos. A Floresta Privada trará muita madeira para aquecer a casa e fazer melhorias. Já a Dona Zygidrina usou a madeira que tinham para fazer uma Assadeira, já com a estratégia de conseguir um Forno de Barro rapidamente e sem usar pedras, antes mesmo do recurso pedras começar a aparecer na fazenda. Já olhando mais longe, também estava de olho na Cerâmica, que dá dois alimentos e ainda elimina o custo de construir uma Olaria.
(Dona Zygidrina e a Mimosa orgulhosas da Assadeira feita.)
Na hora do almoço, Seu Zygidrino entoou o nome de Deus mais três vezes, comeu, e retornou ao trabalho. Ao retornar da floresta, repetiu suas orações e foi cuidar das tarefas domésticas.
(Seu Zygidrino fazendo suas orações no campo em meio aos animais e ferramentas.)
Romival observou os dias do Seu Zygidrino, sempre os mesmos, repetindo três vezes suas orações, três vezes ao dia. A única coisa que mudava era quando uma nova rodada começava e a acumulavam mais ovelhas em cima de uma das cartas. Até que Seu Zygidrino teve a brilhante ideia de combar o Mestre de Estábulo com o Bebedouro, permitindo, talvez por um erro de digitação, que todos os seus estábulos sem cerca guardassem 5 animais e quase eliminando a necessidade de obter madeira adicional pelo resto do jogo. Ele pegaria todas essas ovelhas para ganhar pontos no fim do jogo e também para cozinhar. (Menos a Mimosa, que é a ovelha de estimação da casa.)
(Os pastos sem cercas do Seu Zygidrino, cada um com 5 animais. Até hoje pecuaristas modernos vão até la para aprender com ele.)
A família do Seu Zygidrino cresceu com um timing perfeito, bem antes do final do segundo período. Isso pois os recém nascidos não trabalham, mas precisam de comida (só que apenas uma). Já os adultos precisam de três (no jogo em grupo é 2, mas no solo é 3). Outro gasto inesperado foi que ele teve de sleevar as cartas de ofícios e melhorias por causa das crianças (mas que é horrível para tirar fotos, pois sempre tem que inclinar a câmera para diminuir o reflexo).
Romival observou todo o dia a dia da fazenda, e percebeu que os únicos momentos em que Seu Zygidrino exteriormente fazia algo claramente espiritual eram aqueles breves segundos de oração três vezes ao dia entre atividades.
O tempo passou, Seu Zygidrino fez 48 pontos e Romival voltou para o Céu. Mas antes de ir, em agradecimento à família, ele deixou a Estátua de Nossa Senhora, que vale mais dois pontos e foi justamente o milagre que Seu Zygidrino precisava para fechar os 50 pontos e conseguir continuar na campanha no ano seguinte.
Chegando no Céu, logo perguntou: "Senhor, o Seu Zygidrino é uma ótima pessoa, sem dúvida, mas ele só passa uns 10 segundos ao dia pensando em Você. Eu passo meus dias inteiros aqui cantando Suas Glórias. Como ele pode ser a criatura mais devotada?"
O Senhor disse: "Romival, estou com sede. Você buscaria um copo de água para Mim?"
Romival foi procurar a água enquanto remoía as ideias na cabeça. Chegando numa casa, foi atendido por uma moça muito bonita. Ele imediatamente esqueceu completamente da sua missão de buscar um copo d'água. Em tempo, casou-se com a menina e constituiu uma grande família.
Anos depois, uma grande fome assolou a região veio e levou tudo. Agora o próprio Romival, uma criatura celestial, foi obrigado a pegar cinco cartas de Pedinte, cada uma valendo três pontos negativos no fim do jogo. Ainda assim, toda a sua família morreu de fome.
(Romival perdido em fome e tristeza e esquecimento.)
Romival chorava desconsoladamente. A tristeza foi tão grande que lembrou-se de Deus pela primeira vez em todos esses anos: "Senhor, por favor, me ajude!"
O Senhor veio e disse: "Romival, onde está o meu copo de água?". Romival de uma vez só caiu na real.
O Senhor disse: "É uma coisa tão singela trazer-Me um copo d'água. Mas no mundo de ignorância e ilusão, você perdeu todoa a sua devoção, aspiração, espiritualidade, tudo. Mas olhe para aquele fazendeiro. Ele possui uma grande família; todos os dias ele tem responsabilidades enormes para lidar, mas ainda assim ele encontra tempo para pensar em Mim e orar para Mim. Eu dei a ele trabalho no campo; dei-lhe a responsabilidade de sustentar uma família. Ele satisfaz todas as suas responsabilidades e ainda assim encontra tempo para pensar em Mim e meditar em Mim. Mas, quando Eu lhe dei uma tarefa, você rapidamente se esqueceu de Mim."
Moral da história: não importa por quanto tempo você faz algo, mas sim com quanta devoção e sinceridade.
História original de Sri Chinmoy adaptada livremente por Patanga Cordeiro. Publicado originalmente em Leão Jogos.
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(Nota do autor do post: Nos últimos anos, eu sempre passei o Natal e início do Ano Novo junto com meus colegas e meu Mestre. Uma das coisas que fazíamos muito eram pecinhas de teatro, em geral curtas, de 5-10 minutos, só engraçadas, às vezes espirituais, ou ambas ao mesmo tempo. (Ontem estava conversando com um amigo ao telefone, e ele me lembrou de uma peça onde um personagem era mau e se arrependeu. "Não sirvo para nada," ele disse. Responderam: "Serve sim, como mau exemplo!"
Neste ano, é claro, não pude fazer isso, e então na nostalgia das peças de teatro resolvi escrever um conto baseado na história de Sri Chinmoy e ambientado no jogo Agricola. Espero que tanto jogadores quanto crianças pequenas ou crescidas quanto buscadores espirituais possam aproveitar esta história que mistura tudo isso.)
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Quem topa escrever uma historinha assim? Quem conseguiu ler ela para os filhos antes de dormir?