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Grand Euro Hotel: Sorte no Amor, Azar no Euro
Fiquei um tempo sem publicar nada durante a pandemia, mas espero estar aos poucos voltando a ativa. Ao longo desses quase 9 meses de apocalipse, adquiri (e me desfiz) de uma penca de joguinhos, mantendo minha filosofia de rotacionar a coleção e deixar "a nata" estática. Pois bem, hoje é dia de falar de um aclamado euro para dois jogadores, o Grand Austria Hotel.
Disclaimer: como sempre, se você querer regras, não vai encontrar isso aqui.
Contexto
Lá em Maio, nos primórdios do apocalipse, fiquei "isolado com a mulhé", e depois de um tempo longe de "euros raiz", fiquei com saudade dos prazeres da movimentação de cubinhos de madeira cujo o tema nem sempre é aparente e que rodasse muito bem em 2 jogadores. Lembrei então que nunca tinha jogado o Grand Austria Hotel, mas já tinha ouvido falar muito bem dele para essa contagem, embora aparentemente o jogo fosse o rei do downtime com três ou mais jogadores. Jogar em 3 ou mais, realmente não era meu objetivo então tudo bem.
E aí? O jogo é bom mesmo?
Um Rostinho Bonito
Fiquei impressionado com a produção. Digo, é um euro, não espere miniaturas detalhadas do seu strudel, bolo e café, mas fiquei "impressionado" com o nível de capricho na arte do jogo. Os tokens dos quartos, que poderiam ser sempre iguais, alternando apenas entre as cores, tem pequenas variações artísticas entre si.

Perfumaria bacana, pra quem diz que euro não é bonito.
Além disso, cada carta de profissão tem uma arte distinta que acompanha o nome da profissão em letra cursiva para dar um charme. Some isso à ostentação:
todas as cartas de visitantes possuem artes distintas, feitas pelo
artista número um do do Euro sem alma, o
lendário Sr. Klemens Franz, ame ou odeie seu estilo, ele entrega um trabalho sólido aqui. Não o suficiente, os designers italianos
Virginio Gigli e Simone Luciani fizeram com que as cartas de visitantes verdes, que tematicamente representam
turistas no seu hotel, sejam referências a uma série de meta-piadas do nosso mundinho dos jogos de tabuleiro.
Fantástico para o nerdão boardgamer.
Marco Polo, Agrícola, Isle of Skye (do Pfister, mas com arte do Franz), Tzolkin.
Sou obrigado a rasgar ceda aqui, pois o Coimbra do próprio Virginio Gigli que tem "cara de euro premium", tem cartas com artes repetidas mesmo com funcionamentos distinto. Como se não bastasse, essas mesmas artes repetidas são novamente recicladas no recente Alma Matter.
O meu artista interior fica realmente
encantado com a produção do GAH, que além disso tudo isso tem boa qualidade de componentes, caixa e capricho, mesmo na produção nacional da PaperGames, coisa que nos tempos atuais até é um luxo.
O Euro Feio, feito Bonito.
Um Hotel que conhece o seu Público
Esse jogo não é apenas um rostinho bonito (para os padrões de um euro). O que realmente é o diferencial dele é entregar aquele euro de fazer combos de deixar seu oponente de queijo caído, numa experiência de pouco mais de uma hora. Isso tudo com um setup que pode ser feito em cerca de três minutos. Eu posso forçar um pouco a barra aqui, e digo que a experiência de fazer combos, lembra o sentimento dos combos do Barrage (também de autoria do Simone Luciani), porém sem precisar de um setup de 20 minutos, duas horas de partida e mil reais de investimento. Não estou dizendo que GAH é um jogo melhor que Barrage, nem acredito que seja, porém esse setup e velocidade tornam ele ideal para uma partida entre dois jogadores, o que faz jus ao seu renome.
Em linhas gerais, diria que os designers seguiram uma
vibe minimalista. O jogo é focado no combos de ações, guiada pelos dados, através das cartas de visitantes. É um jogo bem cobertor curto, o que colabora no seu tempo reduzido então certamente vai trazer aquele clássico sentimento do
"MEU CANÁRIO. NÃO VAI DAR TEMPO!".
Este
não é aquele euro a lá
Bora Bora, com trocentos minigames embutidos, e apesar de ser uma saladinha de pontos, acaba sendo uma bem focada. Por bem ou por mal.
Um Euro de Sorte
Dado é vida.
Eu gosto de jogos táticos, até por isso não me importo, inclusive gosto, com algum
input de sorte nos meus jogos. Se tiver dadinhos de alguma forma, melhor ainda. Porém
GAH faz uma escolha de design
arriscada pra mim. Diferente da maioria dos euros, que possuem alguma mecânica de mitigação de sorte, esse aqui tem como único meio (praticamente), um
push your luck para melhorar a sua rolagem. Como funciona: não gostou dos seus dados? Descarte um dado, role tudo de novo, e espere pelo melhor. Desnecessário dizer que certamente isso eventualmente vai terminar mal. Dependendo do seu
grau de chatice, você vai ficar choramingando dizendo que o
"jogo é quebrado" ou então vai
gourmetizar sua opinião dizendo algo como
"isso é um tempero diferente no seu euro típico", eu fico com a segunda por dois motivos:
- É um jogo curto (1 hora e 10 minutos~).
- Uma aposta ousada, independente do resultado, é motivo para rir da desgraça ou reviravolta.
Até existem outras formas de controlar sua rolagem, mas elas também dependem de sorte para que apareçam no jogo.
Pra mim é evidente, como alguns podem ficar incomodados da forma que a sorte é implementada aqui, e longe de ser um
jogo de sorte, porém na minha experiência é muito mais do que o
Euro Gamer Amargurado Típico™ estaria disposto a aceitar.
A Experiência de Jogo
GAH realmente faz jus ao seu título de
"Excelente Euro Moderno para dois Jogadores", consigo ver como alguns arquétipos de jogadores realmente não vão querer mais nada da vida.
É mentalmente recompensador e entrega isso em pouco tempo… porém,
para mim, isso foi justamente o problema. Embora seja realmente uma questão pessoal, ele não é daqueles jogos que você
sente que construiu algo, não é como se estivesse melhorando os serviços do hotel para dar upgrade nas suas ações, é algo sem "sentimento de progressão". Em alguma escala, contratar os funcionários até poderia ser considerado esse "upgrade", mas ainda assim fico com um
gostinho ruim de quero mais, curioso, e potencialmente contraditório, mas é algo que um euro mais tradicional como
Maracaibo e
Brass acabam me atendendo bem melhor.
Por último, ele é um Euro
quase solitário, apesar de ter algumas "corridinhas típicas de euro" e mesmo o draft de dados, a
interação é sempre bem indireta. Como o jogo é muito apertado, é difícil você abrir mão da sua ação pra prejudicar o oponente. O "Novo-Velho"
Rococó por exemplo, é muito mais interativo, com um controle de área que acaba gera um confronto muito mais direto (para um Euro).
Conclusão
Tão bonitinho, que até chega a ser um euro "relativamente temático".
Talvez
GAH seja um perfil
Filler Pesadão de 1 hora (sim inventei um novo nicho) e tenha seu espaço para um perfil específico de
gamers, um outro público, que não faço parte. Mesmo assim, consigo ver muito bem suas qualidades e certamente recomendo pra quem está na busca do seu
Eurinho à 2, principalmente pela relação tempo de Setup/Conteúdo. Pra mim ele é o clássico
Nota 7, o jogo bom pra jogar na casa dos outros, mas hoje eu acabo preferindo uma experiência mais "robusta".