Ahhh os Vikings, aquele povo sanguinário, que vive pra guerra, mata a sede com o sangue dos inimigos, cultua deuses guerreiros e cria cabras... pera, cria cabras? Pois é, as histórias modernas sobre vikings na literarura e no imaginário popular falam de grandes conquistadores, perigosos piratas, que desbravaram os mares do norte europeu, mas nunca sobre como de fato esse povo vivia. Uma coisa curiosa sobre a história do povo que hoje conhecemos como Vikings é que esta foi escrita baseado em documentos registrados pelos povos que foram atacados por eles. Por isso não é de se espantar que a visão que temos seja distorcida. Na prática esses povos eram na verdade tribos que habitavam o norte da Europa, da escandiávia até os Bálcãs. Ao contrário do que se acredita, essas tribos se dedicavam primariamente às atividades de criação de animais e ao comércio. Devido ao clima extremamente frio e ao ambiente inóspito em que viviam, eles tinham grande dificuldade em cultivar lavouras e plantar alimentos. Isso, acredita-se, foi um dos grandes motivos que motivaram esses tribos a se aventurarem pelos mares e colonizarem outros territórios.
Agora já chega do momento history channel! Vamos falar hoje de um queridinho meu, o primeiro jogo grande do Uwe que conheci: O Banquete a Odin!! Trata-se de um jogo de alocação de trabalhadores para 2 a 4 jogadores com uma infinidade de componentes. O jogo é um colosso, épico, que se propõe a simular como seria a vida de uma tribo viking. Os jogadores terão toda a liberdade em seguir o caminho que desejarem, vendendo alimentos no mercado, criando animais, construindo casas em suas vilas, caçando, pescando, montando armadilhas para animais selvagens, explorando territórios estrangeiros e até pilhando outros lugares.

Claro que como um jogo grande do Uwe, não poderia faltar certa punitividade e uma fase de alimentação, embora essa não seja a parte punitiva do jogo. Quer pescar baleia? Legal! Então vai pegar a madeira, pra fazer o barco, vai conseguir armas, vai equipar seu barco, pra daí caçar a dita cuja. Assim, como a quantidade de trabalhadores é limitada, em especial no começo da partica, um erro de planejamento no começo do jogo pode ter grande peso na pontuação final do jogador.
O objetivo central é fazer com que o jogador seja um próspero e rico líder. Para isso ele deve partir de produtos mais fáceis de conseguir como carne de animais e frutas (que devem ser usadas também para alimentar seus aldeões) e melhorar esse produtos, trocando-os por itens valiosos através de ações no gigantesco tabuleiro central de ações.
Aliás aqui cabe uma observação importante: não se assuste com a quantidade de ações disponíveis no tabuleiro! Um olhar mais atento já revela que as ações estão dispostas numa espécie de tabela, na qual as colunas determinam quantos trabalhadores são necessários para realizar a ação. Espaços de alocação dispostos em uma mesma linha realizam ações semelhantes, porém em versões mais fortes ou fracas ou as vezes simplesmente a mesma ação com um custo diferente de trabalhadores.

No início do jogo cada jogador recebe um tabuleiro inicial quadriculado recheado de pontuação negativa e deve cobrir essas casas com os artigos valiosos, posicionando-os no "grid" ao estilo tetris. Acontece que cada item terá um formato diferente e existem restrições como cada item pode ser posicionado baseado em sua raridade/valor. Além disso, algumas casas do tabuleiro possuem moedas desenhadas; cobrindo corretamente essas casas, é possível melhorar sua renda. Outras casas possuem itens desenhados que permite ao jogador conseguir produzir automaticamente um itens toda a rodada. Não me estenderei aqui falando sobre as regras pois são extensas e não quero alongar o texto mais do que deveria. Podem ler sem medo o manual desta peróla que é extremamente bem escrito, apesar de extenso.

Um jogo de vikings não faria jus ao tema se não representasse a expansão territorial pela qual esses povos são famosos. Quando um jogador resolve explorar um território estrangeiro, ele recebe um novo tabuleiro, com uma região quadriculada semelhante a seu tabuleiro pessoal mas com formato diferente e diversos bonus interessantes para serem extraídos. Cada tabuleiro de exploração também concede ao jogador pontos de vitória apenas por tê-los adquiridos, embora sempre traga mais pontos negativos para serem preenchidos do que positivos. O mesmo acontece com os tabuleiros de casas. Isso obriga o jogador a cobrir os pontos negativos para não sair no prejuízo, mas é justamente nessa mecânica de exploração que mora a graça do jogo.
Assim como os povos vikings tinham dificuldade de conseguir alimentos, nesse jogo acontece a mesma coisa e explorar novos territórios é essencial para prosperar. Porém não basta fazer um barco e sair pelos mares, é necessário preencher o tabuleiro de forma a extrair o máximo de recursos a cada rodada. Isso vai fazer com que o jogador melhore sua renda, tenha mais recusos valiosos e consiga uma pontuação melhor. Essa exploração ótima representa um quebra-cabeça muito desafiador e gostoso, que exige muito planejamento e conhecimento dos mecanismos do jogo.
Uma vez que existem inúmeras formas de conseguir produtos básicos, a quantidade de estratégias possíveis é astronómica. Mas é sempre bom lembrar que mais caminhos para seguir também implica mais caminhos para se perder e isso é o que mais acontece nesse jogo, então planejamento é tudo.
A preocupação temática desse jogo é espantosa, ele vem com um almanaque que explica o porquê de cada elemento do jogo, desde mecânicas até a escolha de cada item, de cada recurso, de cada localidade. E de fato, olhando para referências de vikings reais, realmente o jogo te dá a sensação de estar reconstruindo a história, através de um jogo denso, pesado e que pode espantar muitos jogadores até mais veteranos.
Eu sempre tento pensar em pontos negativos pros jogos que eu jogo, mas posso dizer que não tem muitos nesse. Acredito que valha a pena citar algumas estratégias que podem ser um pouco deslanceadas como a da imigração e a dificualdade de conseguir prosperar com uma estratégia puramente focada em pecuária.
Apesar dessas pequenas falhas, Um Banquete a Odin é um euro temático, colossal, com muita liberdade de ações, mas que te pune por essa liberdade. Se você é um jogador que gosta de um jogo pesado, denso, mas muito gratificante e com pouca interação entre jogadores, recomendo fortemente Um banquete a Odin. E se você, como eu, gosta de se aprofundar nesse tema recomendo o seguinte livro:
The Sea Wolves: A History of the Vikings.
TL;DR:
Nota: 9.5
Prós
- Muito temático
- Gostoso mas muito desafiador
- Permite diversas estratégias diferentes
Contras:
- Pouca interação
- Pode ser um pouco longo se jogado com mesa cheia (em 4 uma primeira partida pode chegar a 5 horas, mas da segunda em diante dura em média 45 min por jogador)
- Algumas estratégias parecem um pouco mais fracas ou fortes do que deveriam