PedroMVM::Quando vejo jogos recém lançados com expansões à vista já bate o desânimo de conhecer o jogo.
Rapaz, te falar, reconsidere essa abordagem, se não você nunca mais vai querer um jogo novo na vida (o que não necessariamente seria uma coisa ruim se você está satisfeito com o que você tem). Mas digo isso porque hoje em dia é tendência. Os jogos já chegam com uma expansão esperando na fila. Vai chegar o dia que eles vão lançar a expansão antes do próprio jogo.
Tendo em vista a produção massiva de boardgames em quantidade, não necessariamente qualidade, tem cada vez mais jogos traps no mercado, cheio de lantejoulas e papagaiadas para disfarçar as falhas de design e as expansões são literalmente extensões dessa porcalhada toda. Mas isso também não significa que jogos sejam ruins por definição só porque eles vêm acrescidos de expansões e que você não pudesse considerar ter somente o jogo base sem aquele sentimento de que o seu jogo está "incompleto".
Vou te dar alguns exemplos:
1 - Teotihuacan. Comprei esse jogo na pré venda (minha primeira pré venda, comprei lá em fevereiro, esqueci que tinha comprado o jogo para ser positivamente surpreendido meses depois quando ele chegou). E novamente fui positivamente surpreendido quando joguei o jogo pela primeira vez. Eu gosto de jogar jogos solos e normalmente jogo jogos solos pra aprender e nem sempre uso o próprio modo solo, às vezes eu simplesmente simulo uma partida com 2~3 jogadores e controlo todos eles. Foi o que eu fiz com o Teotihuacan. Essa prática funciona perfeitamente em jogos cooperativos e Euros do tipo solitário (é ótimo pra evitar ter Analysis Paralysis). Joguei a primeira pra aprender. Gostei tanto que no dia seguinte, peguei o jogo e joguei de novo sozinho, dado que era meio de semana e não ia rolar uma jogatina por aqui. Fora que no caso do Teotihuacan, assim como muitos outros jogos, o próprio set up e alguns elementos de aleatoriedade lhe permitem rejogabilidade virtualmente infinita. Cada partida muda tudo, a ordem dos tiles de movimento, a aleatoriedade da compra das fichas, etc. É o mesmo feeling, é o mesmo jogo, mas você ainda sente que se eu jogar duas partidas seguidas, você vai assumir estratégias completamente diferentes de acordo com o contexto e os custos de oportunidade. Agora eu lhe pergunto. O jogo é bom, dá vontade de jogar de novo, sozinho até, e sempre que você joga, as partidas são diferentes, então precisa de expansão? Tem expansão, tá saindo esse ano lá fora. Mas precisa, entende? Ou melhor dizendo,
você precisa?
Veja, tem várias razões para se ter uma expansão. Não vou propor uma cruzada contra expansões aqui. Eu mesmo tenho várias. Algumas eu me arrependo, sinto que poderia não tê-las comprado, outras não. Tem expansão que muda o jogo por completo e às vezes é isso que faz uma pessoa A ou B gostar daquele jogo. Mas aí sim entramos naquilo que você falou, que seria o oposto do exemplo acima.
Não é porque um jogo é acrescido de expansão que eu não vou dar sua devida atenção se ele não for minimamente interessante, mas o fato dele só ficar interessante se você usar a expansão, caso contrário, o jogo base por si só não serve. Aí sim, parece que você tá comprando uma venda casada, ou uma falha de caráter em termos de design, em casos que o jogo base é feito em função da expansão e intencionalmente vendidos separadamente. Nesse caso, o protesto é não comprar mesmo. Não é como se só existisse aquele jogo no mundo.
2 - Carcassonne. Meu primeiro jogo moderno como citado anteriormente. Joguei esse jogo exaustivamente até descobrir a sua expansão mais natural, a que acrescentava o meeple grande (relativamente interessante), o sexto jogador (que eu nunca usei) e o rio, que sinceramente não faz tanta diferença em termos práticos, mas deixa o tabuleiro mais bonito apenas. A meu ver, a verdadeira adição dessa expansão são as estalagens e catedrais, que organicamente adicionam uma regra muito sutil, sem sobrecarregar o jogo, mas que ao mesmo tempo abrem um universo de possibilidades. Aí, nesse sentido, meu grupo de jogo tomou o caminho natural das expansões. Jogamos o jogo base até dizer chega e a expansão tornou o jogo como novo sem destruí-lo em sua essência. Tudo estava bem, até que a nação do fogo atacou... O bichinho da empolgação, do consumismo, me picou, comprei mais duas expansões. Resultado, tentei jogar duas vezes com todas as expansões com meu grupo. Uma vez eles pararam na metade e na outra vez a gente foi até o final, mas eles não usaram metade dos meeples novos e ficaram toda hora perguntando o que cada um fazia sem saberem ao certo o que eles estavam fazendo ali. Se eu fosse colocar isso em termos de notas só pra ilustrar a experiência com uma medida, seria algo assim:
Carcassonne base: 10, um jogo que queríamos jogar o tempo todo, nosso único jogo moderno, que colocava os clássicos no chinelo
Carcassonne com a primeira expansão depois de muito gastar o jogo base: 10, manteve a chama acesa
Carcassonne na empolgação desenfreada de tacar duas expansões em cima das crianças: 5, afinal, eles só usaram metade do jogo mesmo...
Ou seja, algo que teoricamente era pra ser bom, ficou ruim. É tipo você estar na praia, com fome, com calor, com sede, pede um picolé pra se refrescar. Naquele contexto, aquele picolé é o melhor que você já tomou na vida. Você então pede logo outro. Só que o segundo já não satisfaz tanto quanto o primeiro, porque a pessoa que tomou o segundo já tinha um picolé na barriga, diferentemente de quando ela tomou o primeiro picolé. E assim gradativamente, cada picolé a mais satisfazia menos. Foi assim com o Carcassonne no meu grupo. Hoje eu tenho que separar as expansões em módulos e pouco a pouco usando uma ou outra, mas nunca tudo junto.
Agora você veja, Carcassonne brincando deve ter algumas dezenas de expansões, mas mesmo assim é um dos jogos mais comprados e jogados, a gente realmente precisa das expansões? Mais ainda, a gente precisa de todas? Legal que elas existam no mercado, cada um customiza a sua maneira, mas precisar é outra dimensão muito mais profunda. Isso vale para qualquer jogo que é lançado em seasons, como o zombicide, por exemplo. Você pode comprar a que se adeque mais ao seu gosto pessoal, mas você seguramente não precisa de ter todas e muito provavelmente não vai jogá-las todas. Se você conseguir, meus parabéns. Fica aqui o voto de admiração para o verdadeiro fã de uma franquia. Respect.
Pessoas que falam "eu não conseguiria jogar isso sem a expansão". Mentira, parem de se iludir. É como se você tivesse tentando convencer a si mesmo de que fez um bom negócio. Claro, ninguém quer admitir que fez uma compra errada. Eu refrasearia essa citação como "olha, agora que eu comprei, só vamos jogar com a expansão". Eu tenho 3 expansões do Carcasonne, mas jogaria sem nenhuma tranquilamente. Eu tenho a expansão do Terra Mystica, mas a grande maioria das vezes as pessoas pegam as raças básicas porque elas são mais simples. Eu tenho a expansão do Five Tribes, a que o torna Six Tribes, mas quando eu jogo com a galera mais light, é muita informação, 5 já são o suficiente. Dizer que nunca jogaria sem essas expansões seria uma hipocrisia. São expansões que eu não me arrependo de ter comprado porque eu gosto de jogar com elas, mas dificilmente eu consigo, então não foi um investimento tão impressionante assim no final das contas.
3 - Scythe, por exemplo, eu tava doido pra "completar a coleção". Eu sempre quis ter moedas de metal. O scythe foi o primeiro e único jogo em que eu fiz isso. E já tinha a primeira expansão, eu TINHA que completar tudo. Um amigo que gosta de jogar o jogo e está acostumado a jogos mais pesados chegou pra mim e falou "cara, o jogo já tem informação o suficiente". Foi ali que eu tive um choque de realidade. A verdade é que nem eu nem eles precisávamos de mais carne em volta daquele osso. Desisti de comprar todas as expansões seguintes do Scythe, inclusive A expansão, aquela que é considerada a melhor de todas, a que traz uma quantidade absurda de módulos, traz uma campanha legacy e etc. Conhecendo o meu eleitorado, sei que isso nunca iria rolar e sinceramente, não me vejo jogando essa monstruosidade nem no modo solo com tanta coisa em volta. Haja mesa. Moral da história, a única expansão que eu ainda tenho vontade de comprar é a que menos acrescenta coisa, mas traz mais variabilidade sem cagar regra. A do tabuleiro modular.
4 - Great Western trail. Repeteco do Scythe. Chegaram pra mim e me abriram os olhos "cara, já tem tanta coisa rolando nesse tabuleiro, você quer aumentar ainda mais o tabuleiro?". Na prática eu só queria os Tiles extras, mas depois eu pensei "mesmo que eu tivesse os tiles extras, digamos, sem usar o tabuleiro que expande", quantas vezes eu ia usar esses tiles de modo que eu ia pensar "Oh, com 10 tiles frente e verso, agora 12 tiles frente e verso, realmente, agora que eu usei esses dois aqui, isso mudou o jogo TODO. Não tinha variabilidade alguma só com 20 possibilidades como antigamente...". Perdoem-me pela ironia, estou apenas tentando provocar uma reflexão aqui.
Vocês têm todo direito de discordar de mim e gostar das expansões que vocês quiserem, ou ainda comprar todas as expansões de um determinado jogo. Eu apenas lhes ofereço uma alternativa de quem sabe redirecionar esse investimento e obter um maior custo benefício.