Demorei bastante pra me render aos encantos de Everdell. À primeira vista nenhum elemento me chamava atenção a não ser a produção e arte que são deslumbrantes. A baixa interação entre os jogadores era outro fator que me mantinha observando apenas à distância, até que veio Essen e literalmente resolvi "pagar pra ver".
Antes de mais nada, não vou gastar muito tempo falando sobre a árvore. Ela existe, é linda e simplesmente faz parte do tabuleiro, se é necessária, útil, etc... realmente não importa. Na verdade para mim ela cumpre com louvor seu simples papel cosmético, e os puristas que me perdoem, mas sim, o prazer visual nesse hobby é algo que conta, neste caso beleza põe mesa e se não pusesse não teríamos cada vez mais investimentos em produção. Você pode ligar mais ou menos pra isso, mas o mercado já entendeu que esse fator existe, é real e pode ser um viés de decisão.
Posto isso, Everdell é talvez um dos jogos mais vistosos que conheço, brigando pau a pau com Feudum mesmo sendo bem menor. Claro que esse é um critério subjetivo mas é inegável que a produção da versão retail é absurdamente acima da média, digna de um deluxe, e a arte também não fica para trás, as ilustrações das cartas, caixa, tabuleiro e manual são incríveis e muito competentes no objetivo de te transportar para o mundinho do jogo, que aliás tem seu tema muito bem implementado.
Everdell é uma misturada de mecânicas que no início me pareceram meio que uma forçada de barra. Um city building com gerenciamento de recursos e alocação de trabalhadores, achei uma salada esquisita, mas até que funciona muito bem. No entanto o estranhamento demora um pouco pra passar.
O jogo se resume em praticamente duas ações (além de possuir uma terceira que é passar de estação , que falarei mais adiante), alocar um trabalhador (na maioria da vezes para ganhar recursos ou gerenciar sua mão de cartas) e jogar uma carta, essas divididas em criaturas e construções que podem possuir uma relação de efeito condicional entre si. Construções são jogadas com recursos como madeira, resina e rochas. Enquanto as Criaturas são recrutadas com frutas, porém cada criatura possui uma construção correspondente (exemplo: O professor e a Escola, o coveiro e o cemitério, etc...) e caso a carta da construção já tenha sido jogada, você automaticamente ganha o direito de jogar o personagem correspondente SE ele estiver disponível (na sua mão, ou nas cartas abertas no tabuleiro).

Em tempo, Jogar uma carta na verdade significa construir sua cidade, sendo que você tem uma limitação de 15 cartas por cidade e não é fácil (nem um pouco) substituir uma carta já jogada. E a construção dessa cidade, também implica na construção do seu engine de pontos/ações determinado pela variedade dos TIPOS de carta que não irei entrar no detalhe aqui. Mas enquanto umas cartas te dão ações imediatas, outras dão condições de pontuação final, etc...
O que mais me chamou atenção no jogo é a fluidez como ele escala durante a partida. A aleatoriedade provocada pelo enorme e variado deck de cartas somado a absoluta escassez de recursos e trabalhadores no duro inverno em que se inicia (primeira estação/turno do jogo) chegam a dar uma caimbra no cérebro com aquela sensação de: por onde começo? Não vou conseguir fazer nada, esse jogo vai durar 10 minutos...
Ou seja, jogo começa muito devagar mas acelera com uma fluidez impressionante ao momento que você executa a ação de mudar de estação, ganhando mais trabalhadores, rodando as opções abertas do tabuleiro e ativando cartas da sua cidade. É a partir daí as suas decisões, escolhas e táticas precisam ser constantemente repensadas, dificilmente uma estratégia a longo prazo dará certo em Everdell pois a variedade da personagens e construções podem fazer com que as cartas que você almeja não estejam disponíveis ou sequer apareçam durante a partida.
Onde alocar os trabalhadores?, em que momento mudar de estação?, qual ordem de quais cartas jogar?, coloco essa criatura ou construção em um dos meus 15 espaços disponíveis? como fazer o gerenciamento da sua mão e das cartas do tabuleiro da melhor forma? Nenhuma ação pode ser desperdiçada, pois é a sequência mais eficiente delas que trarão a vitória do jogo.
Há ainda os eventos que são objetivos de pontuação do jogo, mas que não irei me aprofundar aqui, servem basicamente para dar uma aleatoriedade e direcionar alguns objetivos para os jogadores.
Everdell é um exercício dinâmico e fluido de escolhas em um desencadear crescente de causa e efeito.
Mas o jogo também tem seus problemas.
uma partida para 2 jogadores ou na versão solo, pode deixá-lo um pouco mais travado, principalmente por ser mais difícil rotacionar as cartas do tabuleiro, a propria variedade gigantesca do deck já ajuda também nesse travamento em determinadas partidas, aliás a quantidade de cartas também tornam Everdell um daqueles jogos que precisam ser jogados algumas vezes para se ter a capacidade de visualizar melhor os caminhos possíveis que surgem durante a partida, já que conhecer o deck é fundamental pra isso, e torna o jogo desequilibrado quando a mesa tem jogadores mais experientes nele jogando contra pessoas que estão ainda conhecendo.
Um outro ponto que incomoda bastante é o PÍFIO manual de regras. Talvez um dos mais secos que já li, sem nenhum detalhe, explicando basicamente a mecânica do jogo, que é muito simples, mas que por ser baseado em diferentes cartas, acabam deixando muitas dúvidas, isso porque os textos das cartas também são muitas vezes enxutos e preguiçosos e te forçam a dar aquela consultada em um faq após alguma partida onde dúvidas surjam (e dificilmente elas não surgirão enquanto não conhecer bem o deck e ter utilizado a maioria das cartas)
Nada de muito diferente ou inovador, porém Everdell é uma ótima opção de um jogo médio/leve com um sistema inteligente em uma mistura legal de mecânicas e que vai deixar sua mesa absurdamente bonita enquanto estiver nela.