Escrita por: Rodrigo Neves.
Introdução:
Roads & Roats é um jogo de produção complexo criado pela editora Splotter Spellen, responsável por outras grandes pérolas como Antiquity, Food Chain Magnate e Indonésia. Aqui você constrói estradas, transportes terrestres e barcos visando criar um império econômico, na esperança de ganhar mais pontos de vitória através da produção de ouro, moedas e certificados de ações ao fim da partida.
Ele é um brainburn inteligente e bastante longo para 1-4 jogadores, com muitas peças e regras, o que resulta em um jogo profundo e com alto fator de rejogabilidade. A proposta maior é o planejamento de longo prazo, focando principalmente na logística, porém imerso em uma atmosfera passível de conflito e até semi-cooperação, algo inusitado em um euro deste porte. Épico em tamanho e escopo.
Mecânicas:
- Colocação de Peças,
- Construção de Rotas,
- Desenhar,
- Marcadores e Hexágonos,
- Pegar e Entregar,
- Tabuleiro Modular.
Visão Geral:
O tabuleiro do jogo apresenta seus mapas por um conjunto de tiles hexagonais. Estes são chamados de cenários e normalmente contém posições de partida sugeridas para cada jogador. Existem cenários para cada número possível de jogadores. Além disso, alguns deles possuem regras de configuração ligeiramente diferentes. Alguns são simétricos em relação às posições de início do jogador... outros não.
Uma vez que o cenário é escolhido e montado, uma folha de plástico é colocada sobre ele e precisa ser presa à mesa. É fortemente sugerido que seja fixado com algum tipo de fita crepe ou durex. Por conta da superfície lisa e de baixa aderência do plástico, um vento forte ou esbarrão na mesa têm o potencial de destruir o trabalho de muitas horas de dedicação. O uso deste plástico é uma das primeiras curiosidades e excentricidades do jogo: ele serve para os jogadores desenharem as estradas e pontes construídas, e serão muitas delas. Usamos uma caneta preta não-permanente que vem no próprio jogo.
Os tiles hexagonais são compostos por vários tipos de terreno (montanhas, campos, florestas, oceanos, desertos, pedreiras, etc.), cada um dos quais pode produzir certos produtos primários ou secundários, dependendo das instalações de produção permitidas. Há também rios que atravessam alguns dos hexágonos, que se tornam um importante meio de transporte.
Existem seis conjuntos de peças de madeira para cada jogador, que representam diversos tipos de transportes que ele poderá criar e usar durante a partida. São três tipos de transportes terrestres: burros, carroças e caminhões e três tipos aquáticos: balsa, barco a remo e barco a vapor. Cada um possui sua capacidade de movimento e carga. Porém, não são fáceis de se obter, já que antes de construir um deles é necessário adquirir a tecnologia e construir sua respectiva fábrica.
Também existem grandes peças de cilindro numeradas que atuam como minas de ouro e ferro, colocadas nos tiles de montanha. Entra aqui o único fator de sorte no jogo. As peças de ouro/ferro são embaralhadas e a produção da mina será por compra desta pilha.
O jogo decorre por consecutivas rodadas com 4 fases cada. Primeiro os edifícios produzem bens. Em seguida os jogadores movem seus transportes, individualmente ou ao mesmo tempo, dependendo do potencial de interação. Na fase seguinte, os jogadores criam edifícios, fábricas, muralhas, estradas, pontes, etc. Então, por fim, na última fase, eles têm a chance de construir parte da Maravilha. E a rodada termina. São jogadas diversas rodadas até que a Maravilha fique pronta, o que desencadeia o fim da partida.
A maravilha é o que realmente conduz o jogo. É, de fato, o relógio de jogo. Para cada turno, não importa o que os jogadores fazem, uma peça neutra é colocada no track dela. Os jogadores também podem ajudar a construir a Maravilha e recebem pontos de vitória por isto. Porém, raramente vale a pena construir nela somente pelos pontos. Se torna interessante construí-los se você estiver ganhando e quiser acelerar o jogo, ou se você não tem mais onde gastar seus recursos. A longo prazo, o potencial máximo de investimento lá é na casa de 100 pontos... muito pouco em comparação a um único certificado de ação que já vale mais que isto.

A cadeia de produção no jogo é longa e complexa. Os burros e os gansos podem se reproduzir se forem deixados sozinhos em um hexágono, no entanto tudo o mais deve ser processado ou produzido. Algumas fábricas produzem espontaneamente a cada turno, enquanto outras exigem insumos para produzir saídas. Por exemplo, lenhadores, pedreiras, plataformas de petróleo e minas produzem espontaneamente. Mas uma serraria precisa de troncos brutos para produzir tábuas. Ou uma fábrica de caminhões que toma ferro e combustível como insumos.
O ponto aqui, é que nenhum jogador é dono dos edifícios ou fábricas que construiu. Se você pode alcançar um edifício, você pode usá-lo. Como ninguém possui um edifício, torna-se importante decidir quais os edifícios que você precisa construir para você e quais você pode simplesmente "atacar" para seu uso. Pode ser inclusive mutuamente benéfico para dois ou mais jogadores cooperarem na construção de um edifício, para que possa haver um elemento compartilhado de resolução de quebra-cabeças e de negociação para o jogo. Porém, isto depende muito de uma postura agressiva ou pacífica dos jogadores em suas estratégias.



É importante investir na eficiência logística. Por exemplo, ter seus lenhadores ao lado de sua serraria é muito útil. Ter um rio ou uma costa que ligando hexágonos que você tem uma necessidade contínua de trocar mercadorias também é útil. No entanto, existem muitos possíveis estrangulamentos ao longo do caminho. Você precisa de combustível para fazer moedas. Os queimadores de carvão podem produzir combustível a partir da madeira. Plataformas de petróleo também produzem combustível, porém exigem que você primeiro investigue a tecnologia, e que você tenha barcos para construir a plataforma, o que significa que você também precisa da fábrica de barcos apropriada. Da mesma forma, você precisa de papel para adquirir tecnologias e sua fábrica de papel só pode produzir se você tiver a madeira para alimentá-lo. Muitas vezes parece um ciclo infindável.
O ponto chave é que não é apenas uma cadeia produtiva que vai precisar desenvolver, mas várias delas. E tudo isso pressupõe que você tenha transporte adequado. Se você não construiu fábricas e evoluiu seus meios de transporte, é provável que no final do jogo você não tenha capacidade de carga para fazer tudo o que precisa em tempo hábil. Apesar do jogo exigir a produção em cadeia de diversos produtos diferentes, no fim do jogo somente ouro, moedas e certificados de ação valem pontos de vitória. O ouro vale 10 pontos, uma moeda vale 40 pontos e um certificado de ação tem valor de 120 pontos. Assim, cada nível de processamento adiciona valor à cadeia.
Avaliação:
Roads & Boats é um jogo diferenciado e muito bem elaborado. Embora não haja a obrigação de existir interação entre os jogadores, quando ela ocorre pode ser bastante emocionante ou devastadora. Há sempre a possibilidade do seu oponente virar e retirar alguns dos seus recursos, ou talvez usar esse edifício de produção valioso que você constrói para si mesmo! Você pode tentar construir muralhas, mas são relativamente fáceis de derrubar.
O jogo também é implacável. Há de se ter muita atenção nos primeiros turnos, porque você pode facilmente afundar, construindo os edifícios errados. Isto recai em uma reclamação recorrente lá fora, dada por script da estratégia inicial. Uma vez que as madeiras são essenciais para quase tudo, a escolha da serraria e do lenhador no início do jogo é prescrita. A pedreira para estradas e tudo mais vem a seguir. As primeiras rodadas serão realizadas praticamente uniformemente. E se um jogador novo optar por um caminho alternativo por ousadia ou por conta de restrições da exploração, ele corre o risco de ser punido severamente.
A arte final da caixa é um ponto de grande discórdia entre os admiradores do jogo. Eu particularmente gosto do estilo "esboço à lápis infantil". Sim, claro, é um desenho de lápis bem executado, mas concordo que ainda sim, parece meio bizarro em um jogo caro e de nicho adulto como este.
As 15 páginas de regras do manual são bem claras em relação à escrita e à organização. E são completas, além de que os exemplos são abundantes. Os player aids também são muito bons, úteis e fáceis de usar. Eles colocam muita informação ao seu alcance de forma acessível.
O tema "construção de uma micro civilização local" é muito bem trabalhado aqui, e proporciona uma sensação de apego ao fruto do seu trabalho, que a maioria dos outros jogos de quebra-cabeça de lógica tradicional não possuem. Alcançar metas intermediárias, como uma determinada tecnologia ou um edifício avançado, oferece sua própria gratificação imediata. Porém, o gerenciamento da árvore tecnológica é um desafio um tanto sem sal, pois a árvore em si é superficial. A pesquisa fica limitada a poucos desenvolvimentos úteis de verdade, com baixa ligação ou dependência entre eles.

O jogo tem tudo para ser épico... o que pesa positivamente e negativamente. A primeira impressão é que será gratificante começar a partida com alguns burros, gansos e madeiras e construir um pequeno império de caminhões e barcos a vapor circulando como seus produtos manufaturados para gerar riqueza e muitas ações aplicadas. O problema é que a partida tem boas chances de terminar no meio do caminho e os jogadores terem menos tempo do que gostariam para criar o motor planejado por longas horas. O fluxo das cadeias tem uma dinâmica muito lenta e custosa. O topo da cadeia de pontos de vitória, que seriam os certificados de ações, raramente são produzidas por todos os jogadores ou por algum em maior quantidade, privando o pessoal daquele sentimento bacana de realização.
A tarimba "épica" traz consigo três características inerentes que podem não ser problema para alguns, mas certamente serão para a grande massa de jogadores. Primeiro, a duração do jogo: demora para montar o setup, demora para explicar, demora para guardar e ainda horrores para jogar. Um processo de 4-8hs investidos dependendo do número de jogadores e familiaridade deles com o jogo. Um verdadeiro jogo evento. Segundo ponto, ele é altamente "fiddly"... são infinitas pecinhas para empilhar, contar e colocar no lombo dos burros ou qualquer outro transporte. E como os transportes são finos, eles ficam caindo com os produtos repetidamente, a ponto da paciência acabar e colocarmos eles deitados de uma vez para adiantar. É outro ponto que serve para atrasar ainda mais jogo, apesar de ser muito interessante para dar um toque extra de imersão ao jogo. E em terceiro e último, o jogo é caro. Não há maneira de contornar isso. Você pode comprar três outros jogos muito bons de estratégia pelo preço de um Roads & Boats. Se você não está disposto a gastar U$ 120 ou + por um jogo, colocar apenas ele na mesa em um encontro e nem sair com a mente literalmente espancada ao fim da partida, este não é um jogo para você.
Eu gostei do jogo... vou mantê-lo na coleção por ser único e proporcionar uma experiência diferenciada. Mas confesso que não tive aquela fascinação proporcionada pelo Antiquity e pelo Food Chain Magnate da mesma editora.