Bruges é uma cidade belga, capital da província de Flandres Ocidental, na região de Flandres. Também é um jogo do aclamadíssimo designer Stefan Feld. Lançado em 2013, originalmente para 2 a 4 jogadores, mistura administração de cartas com rolagem de dados. Existe uma pequena corrida na construção de canais e na trilha de prestígio, mas o que importa mesmo é a sua pontuação final.
Experimentei o jogo competindo contra um jogador virtual conduzido pela variante não oficial chamada Beat the rival (
https://boardgamegeek.com/thread/1502297/solo-mode-beat-rival-simple-version) que basicamente segue uma seqüência de decisões para adminstrar as cartas e interagir com o tabuleiro. Essa variante tem regras próprias quanto à pontuação, o que gera certa tensão quando vemos seu total de pontos aumentar rapidamente.
Gameplay
O setup é bem simples e rápido. Separam-se cartas, selos (tokens que indicam a cor do jogador), tokens de supremacia, 5 guilders (como é chamada a moeda no jogo) e 5 trabalhadores (1 de cada uma das 5 cores existentes) para cada jogador. Posicionam-se os meeples maiores, que representam os jogadores, no tabuleiro (no town hall, ao lado da trilha de prestígio e na posição 5 da trilha de pontos). Monta-se a pilha de estátuas (bônus recebido ao final da construção dos canais) e o jogo já pode começar.
O jogador que tiver comido chocolate Belga mais recentemente será o 1º jogador.
Uma rodada de jogo é composta de 4 turnos: coleta de cartas, rolagem de dados, ação (e é aqui que rola toda a estratégia do jogo) e avaliação da supremacia.
No começo do jogo as 165 cartas presentes devem ser divididas em 5 pilhas de, aproximadamente, mesmo tamanho. As pilhas devem ficar com o lado que mostra uma CASA virado para cima. São escolhidas tantas pilhas quanto jogadores e o restante é separado. As pilhas escolhidas (2 para 2 jogadores, 3 para 3 jogadores, 4 para 4 jogadores) são embaralhadas e divididas em 2. São dessas 2 pilhas que são escolhidas, aleatoriamente, cartas até um total de 5, para formar a primeira mão de cada jogador. A cor de fundo da palavra BRUGES no topo da carta equivale à cor do outro lado da carta.
Na sequência os 5 dados são rolados. Nesse ponto tanto o valor quanto a cor são relevantes. Para cada cor existe uma ameaça - Azul: inundação, Vermelho: fogo, Marrom: peste, Amarelo: revolta e Roxo: intriga. Caso algum dado mostre 5 ou 6, cada jogador recebe um token referente a ameaça. Quando completar 3 tokens de uma mesma cor, a ameça é concretizada (Inundação - devolve-se todos os trabalhadores obtidos, Fogo - descarta-se um segmento de canal ou uma casa construída, Peste - descarta-se uma pessoa recrutada, Revolta - devolve-se todo o dinheiro para o banco e Intriga - perde-se 3 pontos de vitória). Nesse momento também é determinado o valor a ser pago para avançar na trilha de prestígio somando-se todos os dados com valores 1 ou 2 independente da cor.
No 3o turno do jogo é onde a ação acontece. É aqui onde, cada jogador, alternadamente, poderá baixar uma carta até ficar com apenas 1 em mãos. Cada carta permite 6 ações distintas: obter 2 trabalhadores da cor da carta (que são utilizados para a construção de casas), conseguir dinheiro (a quantidade é o valor do dado da mesma cor que a carta), descartar 1 token de ameaça (da mesma cor que a carta o que garante 1 ponto de vitória), construir um segmento do canal (se o próximo segmento vazio for da mesma cor que a carta e pagando o valor indicado no tabuleiro), construir 1 casa (pagando um trabalhador da mesma cor da carta) ou recrutar 1 pessoa (que tem um custo, vale pontos de vitória no final do jogo e possui poderes especiais). Durante essa fase também são executadas as ações especiais das pessoas recrutadas.
No ultimo turno são avaliadas as supremacias. Cada jogador avalia se está na frente dos demais em reputação (definida pela trilha de prestigio), quantidade de pessoas recrutadas e na construção do canal. Essa supremacia valerá pontos no final do jogo. Uma vez conquistada a supremacia, ela nunca mais é perdida, mesmo que o jogador não esteja mais na frente naquela rodada.
O marcador de primeiro jogador é passado para o próximo jogador no sentido horário e a rodada é reiniciada.
O jogo termina quando 1 das 2 pilhas de cartas acaba. A pilha que acabou é substituída pela pilha de cartas que sobrou da montagem do jogo e aquela é a ultima rodada. A única exceção é quando uma das pilhas acaba durante o 3o turno (alguns poderes de algumas pessoas permitem obter cartas nesse turno). Nesse caso essa rodada é a última. Então todos contam os pontos de vitória (por casa construída, por pessoa recrutada, por estátua conquistada, dependendo da posição na trilha de prestigio, por pessoa recrutada e de acordo com poderes de algumas pessoas), e aquele que tiver o maior número é declarado o mais influente de Bruges.
Variante solo
A variante Beat the rival segue uma seqüência de regras bem simples. O setup é o mesmo utilizado para 2 jogadores. Você será sempre o primeiro jogador.
Assim como no jogo normal, para o rival, no turno de coleta de cartas, na primeira rodada pega-se 5 cartas, 3 da pilha da esquerda e 2 da pilha da direita. Elas ficam dispostas em uma pilha única de 5 cartas. Ao longo da 3a fase, são viradas 1 carta de cada vez (como seria em um jogo normal). Nas rodadas seguintes serão coletadas apenas 4 cartas.
No turno de rolagem de dados, o rival não recebe nenhum token de ameaça.
E aqui começa a "inteligência artificial" do rival. Sua primeira prioridade é avançar na trilha de reputação. Na sequência, no turno de ações, joga-se normalmente (1 carta por vez). Na vez do rival, ele irá avaliar cada carta seguindo as prioridades listadas abaixo:
1. Se a cor da carta corresponder ao segmento de canal que ele pode construir E TIVER DINHEIRO SUFICIENTE , ele construirá o segmento. Se houver dúvida sobre qual segmento de canal avaliar, o maior segmento construido será escolhido. Se a cor corresponder mas NÃO HOUVER DINHEIRO SUFICENTE, o rival receberá dinheiro equivalente ao maior dado rolado (independente da cor). E seu turno termina.
2. Se a cor da carta não corresponder, o rival verificará se possui alguma CASA VAZIA. Se NÃO TIVER, ele irá construir uma casa, descartando o trabalhador correspondente à cor da casa. Se NÃO TIVER TRABALHADOR necessário, o rival irá coletar 2 trabalhadores da cor daquela casa e o turno termina.
3. Se tiver casa vazia, o rival tentará recrutar a pessoa da carta atual. Se TIVER DINHEIRO SUFICIENTE, ele pagará, colocará a pessoa na casa e marcará 6 PONTOS DE VITÓRIA, e seu turno termina. Se NÃO TIVER DINHEIRO SUFICIENTE, o rival receberá dinheiro equivalente ao maior dado rolado. E seu turno termina.
Se o jogador tiver alguma pessoa com poder para eliminar uma pessoa recrutada pelo rival (ou casa com essa pessoa), a última casa/pessoa recrutada deverá ser eliminada e o rival perderá o número de pontos de vitória indicados na carta da pessoa. Por esse motivo é recomendado manter as casas e pessoas enfileirados em uma pilha única.
Outra interação que o jogador pode ter com o rival é através de pessoas recrutadas que possuem o poder de colocar tokens de ameaça no oponente. Esse é a única forma do rival receber tokens de ameaças. E elas são aplicadas normalmente (se fogo, rola-se 1 dado para determinar se será perdido um segmento do canal mais curto ou casa. Se for peste, remove-se a última pessoa recrutada e perde-se os pontos de vitória conforme indicado na carta).
O rival marca pontos normalmente por canal e estátuas.
E não existe verificação de supremacia no final da rodada. A supremacia é levada em conta apenas 1 vez ao final do jogo. Se houve empate, o rival ganha.
A utilização dessa variante altera pouco as regras aplicadas para o jogador solo, permitindo o aprendizado e o teste de estratégias que não dependam de interação. Não receber tokens de ameaça, não testar supremacia a cada fim de rodada, coletar guilders e trabalhadores independentemente da cor da carta e marcar sempre 6 pontos quando recrutar uma pessoa podem parecer injusto, mas são compensados pelo fato do poder da pessoa recrutada não ser levado em consideração. De certa forma entendo ser vantajoso as variantes apresentarem certa vantagens pois tornam o jogo mais desafiador para o jogador solo.
Componentes
tabuleiro com os canais e os selos indicativo dos jogadores
algumas pessoas recrutadas
O jogo vem com 165 cartas, um tabuleiro muito bem desenhado que simula a cidade de Bruges, tokens de papelão que indicam, guilders (dinheiro), ameaças, canais, estátuas (que são conquistadas ao final da construção dos canais e valem pontos de vitória) e selos (para definir as cores dos jogadores). Também vem com meeples pequenos representando os trabalhadores que podem ser obtidos durante o jogo, meeples grandes que representam os jogadores na trilha de pontos e de prestigio e 5 dados.
Um item muito útil que vem dentro da caixa do jogo são 2 card holders de papelão que são montados e utilizados para suportar as 2 pilhas de cartas necessárias para o jogo.
Discussão
1) Decisões interessantes: Existem 2 grandes momentos de decisão no jogo. O primeiro é após a rolagem dos dados onde deve-se avaliar se se investirá dinheiro para subir na trilha de prestígio e marcar mais pontos no final do jogo. O segundo é como utilizar as cartas. Devo avançar na construção dos canais? Ou devo obter trabalhadores para construir uma casa? Devo gastar essa carta para me livrar de um token de ameaça? Ou recruto essa pessoa para utilizar seu poder especial? Essas são algumas perguntas que sempre passam pela cabeça no momento de jogar as cartas.
2) Rejogabilidade: Alta, considerando a quantidade de cartas e a ações variadas de cada. A forma como o baralho do jogo é montado também contribui. Os dados adicionam uma imprevisibilidade que ajuda a tornar cada partida única.
3) Dificuldade: Baixa, considerando a quantidade de fases (4) e as ações possíveis na fase 3 (6). Outro indicador da baixa dificuldade são as 12 páginas do manual.
4) Tema e senso de aventura: Por se tratar de um euro a aventura fica por conta de ver o marcado de pontos de vitória caminhando pelo tabuleiro. Quanto ao tema, a arte do jogo ajuda na imersão pois o tabuleiro central representa muito bem a cidade.
Veredito final
O interessante de
Bruges é poder jogar de forma casual ou com mais estratégia. No modo casual, basta utilizar as ações comuns a cada carta. Dessa forma o jogo se torna uma corrida, pois todos podem obter dinheiro para comprar prestígio e marcar até 12 pontos de vitória no final do jogo. Podem também focar na construção de canais (outra corrida que ocorre dentro do jogo). É possível também obter trabalhadores para construir suas casas (que valem 1 ponto cada no final). E por último recrutar os personagens unicamente pelo valor de pontos que cada um dará no final do jogo.
No modo mais complexo deve-se levar em conta o texto das cartas (para o qual existe uma tradução de todas as cartas na Ludopedia). Nesse modo as opções de estratégia e forma de pontuar aumentam muito. É possível pontuar por grupo de personagem recrutados (eles podem ser pedreiros, mercadores, nobres, etc). Pode-se construir 1 peça de canal a custo zero, mas mantendo a necessidade de ter a carta da cor correspondente. Pode-se ainda aumentar a quantidade de dinheiro obtido pelas cartas. Enviar pragas para o oponente. E até "assassinar" os personagens dos oponentes. Certamente o jogo foi pensado para utilizar esses "poderes", pois adicionam muito mais opção ao jogo.
Como jogo solo, a variante utilizada gera alguma tensão. Apesar das prioridades do rival não mudaram, a aleatoriedade das cartas e dos dados não geram repetição de ações. Dependendo das cores das cartas disponíveis para o rival, várias pessoas serão recrutadas e ele avançará rapidamente no total de pontos de vitória. Para deixar o jogo ainda mais tenso, optei por acrescentar a quantidade de pontos indicadas nas pessoas que o rival possuía. Com essa regra da casa a vitória ficou mais apertada. Ainda não tive a oportunidade de experimentar o jogo com outros jogadores.
Para mim ficou um gosto de gateway, pois achei a complexidade do jogo baixa, sendo facilmente explicado para pessoas que nunca jogaram um euro antes. Me diverti bastante ao perceber como o rival iria se comportar no seu turno (após a rolagem dos dados e a opção de cartas disponíveis para ele). O próximo passo será imprimir os paste up em português disponíveis na Ludopedia para apresentar o jogo para outras pessoas e jogá-lo com oponentes para os quais não tenho a menor ideias das prioridades.