O que eu gosto no jogo é uma série livremente baseada nos vídeos My Favorite Game Mechanism do designer de jogos Jamey Stegmaier. Nessa série eu vou tentar falar em termos gerais as coisas que mais me chamam a atenção em um determinado jogo, sem me preocupar em explicar regras. Ou seja, você vai ver uma análise de forma mais objetiva e direta de um jogo.
Above and Below é um jogo do designer e ilustrador americano
Ryan Laukat. Ryan tem se destacado nos últimos anos com jogos excelentes e com artes maravilhosas, como o
Eight-Minute Empire, lançado no Brasil pela Devir, e os incríveis
Empires of the Void,
Islebound,
City of Iron e
Artifacts, Inc.. Esse ano, Ryan lançou a campanha de financiamento coletivo de
Near and Far, uma espécie de continuação para a história de
Above and Below, arrecadando mais de meio milhão de dólares.
Em
Above and Below os jogadores são sobreviventes de um vilarejo que foi atacado por bárbaros e que agora procuram um novo lugar para viver. Mas, durante a exploração da região onde seria a nova vila, os sobreviventes descobrem imensas cavernas com grandes mistérios. Cada jogador constrói sua própria vila, inciando a exploração da região e construindo edifícios, tanto na superfície (
above), quanto nas cavernas (
below), criando uma vila cheia de recursos e incríveis histórias.
Basicamente o jogo funciona da seguinte forma: em cada rodada, os jogadores poderão alocar seus trabalhadores para fazer uma das ações possíveis: coletar recursos, explorar as cavernas, treinar outro trabalhador, construir um edifício ou posto avançado e trabalhar (no jogo, significa ganhar uma moeda). Cada trabalhador usado na rodada se move para uma parte do tabuleiro que indica que o mesmo está cansado. No fim da rodada, o jogador poderá descansar um número de trabalhadores igual ao número de camas que tem na sua vila (inicialmente três, o mesmo número de trabalhadores no começo do jogo).
Cada jogador tem em mãos inicialmente 3 trabalhadores com diferentes habilidades. Um deles é um excelente construtor e você precisará dele para construir as casas, outro é um exímio professor e é com ele que você poderá treinar novos trabalhadores. O último é um trabalhador coringa que poderá ser utilizado nas demais ações, inclusive a de explorar. A escolha das ações é bem simples e envolve apenas indicar qual trabalhador fará qual ação e, então, quantos trabalhadores a farão naquele turno. Ao longo do jogo, novos trabalhadores poderão se juntar à sua vila, você poderá explorar as cavernas e construir edifícios que vão trazer benefícios e pontos. Ao final de 7 rodadas, os jogadores somam seus pontos e vence aquele que mais pontuou. O jogo não é muito demorado e tem um
downtime bem baixo, mas bem divertido.
Acredito que, à primeira vista, o que chama mais a atenção em
Above and Below é sua arte. Ryan é um exímio ilustrador e tem uma facilidade muito grande pra criar belas paisagens e personagens. Mas o mais incrível é o nível de detalhes que você pode observar em cada ilustração, seja ela nas cartas, tabuleiros,
tokens de recursos e até mesmo nas moedas. Tudo é muito caprichado. Sem dúvida alguma Ryan se tornou para mim um dos melhores ilustradores de board games, ao lado de
Vicent Dutrait (Lewis & Clark, Medici e o novo Robinson Crusoe) e
Miguel Coimbra (7 Wonders, Cyclades e Small World).
A mecânica de pontos de ação é bastante interessante. Cada trabalhador possui ícones de lanternas que indicam se são bons exploradores ou não. Os melhores exploradores tem, acima do ícone de exploração um determinado valor que deve ser tirado na rolagem dos dados e, quanto menor o número, mais fácil esse trabalhador ter sucesso na exploração. Alguns trabalhadores possuem mais de um ícone, o que indica que eles são ainda melhores. Ao realizar a exploração, o jogador escolhe quantos trabalhadores quer enviar e a soma total dos ícones permitirá ao jogador ter melhores benefícios dessa ação.
Outro grande destaque do jogo é o
Livro de Encontros. Cada vez que os jogadores executam a ação de explorar, um parágrafo do livro deve ser lido, escolhido na rolagem de um dado. Esse parágrafo conta um pequeno trecho de uma história que dá ao jogador algumas opções interessantes de ações que, geralmente, o colocam frente a frente com situações inusitadas ou perigosas. Ao escolher qual caminho ele deseja seguir, o jogador então lança novamente os dados, dessa vez rolando o número de dados igual ao total de trabalhadores que ele utilizou na ação.
Você segue um velho caminho, segurando sua tocha no
alto. Após um tempo, você encontra uma longa escadaria
cravada na pedra, mas o caminho está bloqueado por um
enorme rato marrom com olhos vermelhos brilhando na
escuridão. Você evita o rato, ou tenta passar?
Evite o Rato: 3 Lanternas (3 Moedas, -1 Reputação);
Lute e tente passar pelo rato: 4 Lanternas (Peixe, +1
reputação), 7 Lanternas (4 Moedas, Minério, +1 reputação).
Bônus: +1 Lanterna por Martelo.*
Cada sucesso nos dados conta como um determinado número de lanternas. Se a quantidade de lanternas obtida for igual ou superior à do caminho que o jogador escolheu, ele coleta as recompensas pela exploração. Caso contrário, não completa a ação. Além disso, se conseguir ter sucesso nessa ação o jogador poderá adicionar a carta de exploração à sua vila e, sobre ela, poderá construir posteriormente um posto avançado nas cavernas que, assim como os edifícios da superfície, trarão benefícios e pontos ao jogador. Esse benefícios podem ser recursos, moedas e pontos de reputação (pela valentia e coragem) que também poderão render pontos ao final da partida.

A mecânica de coleção de componentes também é muito bem explorada no jogo. Existem, ao todo, 8 recursos que podem ser coletados nas cartas e nas explorações: vaso, papel, peixe, fruta, corda, cogumelo, minério e ametista. Esses recursos não são utilizados nas ações e servem apenas para que você faça uma coleção deles e pontue no final do jogo. Algo como uma estante de coisas legais que você conseguiu juntar. Algumas das cartas vão trazer dois desses recursos e, cada vez que o jogador utilizar a ação coletar, poderá pegar um desses recursos pra sua coleção. Para cada recurso diferente, mais pontos você ganha, o que incentiva o jogador a não ficar procurando pelo mesmo recurso o jogo todo.

No final do jogo, os jogadores vão somar pontos pelas sua construções, recursos coletados, pela trilha de reputação e pelo dinheiro recebido. Mas o que mais vale é a história construída ao longo do jogo, que pode ter várias aventuras pelas cavernas, ou uma bela vila construída na superfície, ou mesmo uma diversificada coleção de recursos.
Above and Below é um jogo que é muito mais do que bonito. É inteligente e utiliza muito bem as mecânicas sobre as quais foi desenvolvido. Cria uma narrativa divertida e coloca de fato os jogadores para pensar em qual a melhor forma de construir e crescer, se por cima ou por baixo, enquanto apresenta ilustrações lindas na mesa. O jogo peca um pouco no fator interação, uma vez que cada um meio que faz o seu, com bem pouca interferência dos demais jogadores (a não ser na compra das cartas). A leitura do
Livro de Encontros (que deve ser feita por outro jogador da mesa) é o que quebra essa sensação, fazendo os jogadores conversarem bastante entre si.
O jogo está vindo para o Brasil pela
Conclave, o que deve ajudar bastante aqueles jogadores com dificuldades com o idioma. O jogo em si não tem texto algum, sendo muito bem apresentado com iconografia muito clara, mas os encontros dependem totalmente do texto. Sem o
Livro de Encontros,
Above and Below seria um jogo normal, sem muito o que diferenciar de outros jogos do mercado com tema e mecânicas semelhantes (
Caverna,
Stone Age e etc). Porém, com o livro, a ação de exploração brilha no jogo. É um jogo que certamente fará muito sucesso por aqui.
* Tradução dos trechos do
Livro de Encontros pelo usuário
Amffj.
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