Quão sortudo pode ser um game designer?
Foi em 2012 que eu contratei a Dandi para ilustrar Don Capollo.
Desde aquela época eu dizia, (e ainda digo), que ela é a melhor ilustradora do mundo, que ele ainda vai conhecer.
Ainda digo isso hoje em dia porque ela é extremamente versátil, e tem muitos traços diferentes, e todos executados com a perfeição de quem sabe o que está fazendo.
Tive o privilégio em trabalhar com ela em diversos projetos de jogos, sempre com a arte tremendamente elogiada.
Sempre foi uma grata surpresa de ver a capacidade que ela tinha de se reinventar artisticamente e trazer um traço icônico, único e lindíssimo para ilustrar um jogo.
Em 2024 ela foi participar de uma feira de games digitais, e poderia fazer a venda de produtos que quisesse com os seus desenhos.
Ela levou adesivos, canecas, chaveiros, posters e outros produtos com artes novas, que criou para vender naquele dia do evento.
Os desenhos estavam tão lindos que tudo esgotou diversas vezes, algumas peças no primeiro dia.
Depois do evento, ela me ligou, e me disse:
“- Gustavo você precisa criar jogos com artes assim”, e me mandou um watsapp com algumas ilustrações belíssimas.
E me contou de como foram um sucesso de vendas.
Eu perguntei que artes eram aquelas, e se já estavam alocadas em algum projeto, e ela disse que não, que eram autorais dela, e que estavam disponíveis para fazer um jogo.
Poxa, eu me perguntei: Quão sortudo um game designer pode ser?
Imediatamente perguntei se ela aceitaria fazer um jogo com aquelas artes, e ela aceitou.
Bem, agora o desafio era fazer um jogo `a altura daquelas artes!
A ansiedade bateu forte, não só pelo desafio como pela oportunidade.
As artes eram lindas!
Pelo que ela me disse, a arte do gatinho jogando vídeo-game era a que mais tinha vendido, e que o pessoal mais pedia.
Pois bem, já temos a capa do jogo, pensei, agora só falta todo o resto.
Faz alguns anos que digo que o trabalho de game-designer de certa forma é muito mais de pós-venda do que venda.
Muitas vezes o jogador nunca jogou e não conhece as regras, mas compra o jogo pela arte, pelo tema, pelo preço, pelo nome da editora ou nome do autor.
Em grande parte das vezes o jogador não conhece as regras do jogo, e só vai descobrir se gostou ou não em um segundo momento.
Eu mostrei a arte da caixa do jogo para algumas amigas que tinham gatos e elas literalmente gritavam, e pediam a arte para usar no celular.
Todas disseram que iriam comprar, mesmo sem ter visto o jogo.
Já tinha uma capa que por si só já venderia o jogo sozinha, e eu não poderia decepcionar.
Eu disse para a Dani que só esperava que as regras que fiz para o jogo não atrapalhassem a venda dele.
Vi pelas artes que poderia ser um jogo com o tema de gatos jogando vídeo game, onde os animais antropomórficos de RPG poderiam ser personagens do jogo que os gatos estão jogando.
O dragão vermelho seria o chefe final.
Faltavam mais antagonistas, e pedi para a Dandi fazer robôs, para que fizéssemos uma boa história da natureza contra a tecnologia.
Os robôs seriam perigosos contra a floresta, com desmatamento por serras, fogo, e poluição do ar e das águas.
Os heróis iriam combater isso.
No final do jogo, um Dragão Vermelho, que devido ao desmatamento estava sem alimento, e acabou comendo o milionário que estava destruindo a Floresta.
Pelas artes fofinhas, caberia uma arte um jogo cooperativo, para se jogar com toda a família, e seria perfeito para iniciantes.
Pensando no público-alvo, queria que pudesse ter uma versão solo, para que uma criança que seja filho(a) único(a) pudesse jogar sozinho(a), ou alguém que morasse sozinho(a) com gatos pudesse jogar sozinho(a), ou com um companheiro(a).
Também queria um jogo bom para até 4 pessoas, onde um casal poderia encontrar outro casal e ser uma boa opção para divertir.
Gosto muito de jogos com versão solo porque permite que uma pessoa que acabou de comprar o jogo possa desfrutar dele para depois apresentar para mais pessoas.
Um jogo solo provavelmente irá ser jogado várias vezes.
Um jogo cooperativo de 1 a 4 seria perfeito para aquelas artes.
O balanceamento dele foi difícil.
Jogos cooperativos precisam ser difíceis de serem vencidos, para serem emocionantes e interessantes.
Em um primeiro momento, ele estava fácil demais, e depois difícil demais.
Até mesmo jogadores experientes não conseguiam ganhar e isso seria frustrante demais para o público-alvo.
Em conversa com alguns jogadores percebi que um jogador do público-alvo se jogasse dez vezes gostaria de ganhar pelo menos 5.
O jogador iria se incomodar bastante se jogasse dez vezes seguidas e perdesse as dez, especialmente se não chegassem nem a ver o vilão final.
É um jogo com componente de sorte, mas ele é muito mais de estratégia do que parece, porque é um jogo de probabilidades.
O jogador pode escolher qual personagem vai utilizar, qual robô vai derrotar primeiro e quando é o melhor momento de avançar ou de parar.
Mesmo eu que sabia todas as probabilidades de saírem cada número de 1 a 13 em 1, 2 ou 3 dados, estava com dificuldade de ganhar.
O jogo precisava ser mais fácil, mas não tanto.
Depois de meses jogando todos os dias, cheguei em um resultado que gostei muito.
As vitórias podem vir, mas serão apertadas, e as derrotas darão aquela sensação de "quase-vitória".
Além disso, o jogo poderá ser usado para crianças treinarem matemática e cálculo de probabilidades. Isso na escola seria um grande sucesso.
Um jogador gamer vai se interessar em explorar mais as probabilidades de escolher cada personagem na hora certa, saber arriscar, saber parar e otimizar a vitória.
Depois que terminei as regras enviei para a Dandi fazer o design gráfico, e isso valorizou ainda mais a arte das cartas.
A Dandi apresentou o projeto em um concurso de arte para jogos no estado do Amazonas, e ganhou o primeiro lugar.
Com a Devir foi paixão à primeira vista:
Eu estava em uma reunião com a Devir falando de outro projeto, e mostrei as artes para o meu editor, mostrando o projeto que eu ainda estava trabalhando, e ele se interessou imediatamente em conhecer, e pediu para eu apresentar para ele quando ficar pronto.
Quando o protótipo ficou pronto, todos na editora se derreteram pelas artes.
A Dandi acertou de novo!
Fiquei muito feliz pela oportunidade de publicar esse jogo pela Devir.
É uma empresa sensacional, com muita tradição no mercado e faz um trabalho muito bom em escolas e crianças.
O jogo vai entrar na coleção pocket, o que significa que vai ser uma excelente opção de presente, com um bom custo – benefício.
Se arte boa vende jogo, esse será um best seller!
Assim, já sigo avisando: se o jogo for um sucesso de vendas, o mérito é todo da Dandi, e se não for, a culpa será toda minha!
Brincadeiras à parte, esse é um dos jogos que mais gostei de trabalhar. Fiquei meses jogando sozinho diariamente e sempre me diverti.
Espero que vocês se divirtam tanto quanto eu.
Abração,
Gustavo Barreto