O que eu gosto no jogo é uma série livremente baseada nos vídeos My Favorite Game Mechanism do designer de jogos Jamey Stegmaier. Nessa série eu vou tentar falar em termos gerais as coisas que mais me chamam a atenção em um determinado jogo, sem me preocupar em explicar regras. Ou seja, você vai ver uma análise de forma mais objetiva e direta de um jogo.

Agricola é um jogo de 2007, quando o grande boom do mercado alemão de jogos de tabuleiro já tinha chegado à América. Depois do estrondoso sucesso de Os Colonizadores de Catan, os euro games estavam bastante populares no mundo dos jogos de tabuleiro. O designer de jogos Uwe Rosenberg já havia lançado uma coisa ou outra, mas foi o card game Bohnanza seu primeiro grande sucesso. Agricola veio apenas 10 anos depois e novamente colocou Uwe em evidência. O jogo tirou o posto de Puerto Rico no topo do ranking do BoardGameGeek que já durava um bom tempo.
O jogo apresenta um tema muito simples: você é um fazendeiro e precisa cuidar para que sua fazenda cresça e prospere, mas somente o suficiente para sua subsistência. Não pense em vender animais ou cereais: em Agricola você vai precisar de todos eles. No começo do jogo você está em companhia do seu cônjuge, numa pequena casa de madeira. Ao longo do jogo você poderá melhorar sua casa, ter filhos, trazer animais para a fazenda, plantar alguns cereais e fazer algumas melhorias aqui e ali. Tudo o que você faz te dá pontos de alguma forma e, no final do jogo, vence aquele que fizer mais pontos. Tudo muito simples e objetivo. O que há de tão interessante em Agricola afinal?

Não é mole cuidar de uma pequena fazenda
Agricola foi meu primeiro contato com um jogo de alocação de trabalhadores. E foi bem possível entender a importância desse jogo pro mercado e pro design de jogos em todo o mundo. Ele foi um divisor de águas. É muito fácil ver como o jogo mudou o cenário pela forma que a enorme complexidade do jogo poderia caber num tema tão simples. Num jogo que você poderia perder horas jogando sem perceber que estava fazendo não muito mais do que cuidar de um pequeno espaço de terra.
A primeira grande inovação de
Agricola, a meu ver, foi colocar na mão do jogador duas ações que poderiam ser feitas dentre muitas e que, a partir dessa escolha, o jogo poderia desenrolar de muitas maneiras diferentes. Ao escolher uma ação em detrimento de outras, você não só estava moldando a sua estratégia como estava determinando a estratégia do adversário e dizendo que ele não poderia fazer a mesma que a sua. Em
Puerto Rico, por exemplo, você escolhia sua ação, ganhando um bônus, mas permitindo que outro jogador também fizesse a mesma coisa. Aqui, não. Só você faz aquela ação. E, logo, você percebe que precisa fazer mais de uma ação e não pode, nem deve, ficar insistindo na mesma sequência porque, ao longo do jogo, novas ações estarão disponíveis e os outros jogadores terão outros caminhos para pontuar. Ou seja, a alocação de trabalhadores aqui é não só uma mecânica bonita, mas também e que exige uma enorme estratégia de jogo.
O tabuleiro central do jogo com todas as ações possíveis abertas
Outro grande ponto de
Agricola é quanto à mecânica de "primeiro jogador". Tenho um grande problema sobre o fato de muitos jogos terem um gerenciamento de primeiro jogador meio ruim, favorecendo, em algum momento, algum dos jogadores por isso. Em vários dos jogos que joguei, muitas vezes o primeiro jogador ganhou o jogo. Em muitas outras, o último a jogar estava em vantagem. Em
Agricola, sinto muito pouco favorecimento a um jogador pela sua posição de jogo. Isso porque o jogo permite, primeiro, que você "roube" a função de primeiro jogador se isso for importante para a sua estratégia. Segundo, porque o fato de que muitas ações logo ficam disponíveis com o passar das rodadas, e há tanto para se fazer, que o fato de ser ou não o primeiro a ter uma escolha é superado pelo fato de ter mais membros na família para ir ao trabalho. Numa estratégia bem feita, mesmo sendo o último a colocar suas peças, você pode ter a vantagem de colocar uma ou mesmo duas peças a mais que os outros jogadores, fazendo um maior número de ações.
Isso me leva ao terceiro ponto. O fato de que o crescimento de um jogador não significa que ele está melhor no jogo. Um grande fator que prejudica a diversão em muitos jogos, a meu ver, é aquela sensação de que não há mais como vencer a partida. Como os resultados do final do jogo em uma partida de
Agricola são consequência de muitas formas diferentes de pontuar, não necessariamente um jogador com muitos trabalhadores disponíveis será o vencedor. Enquanto isso, outro jogador pode ter investido seu tempo em encher os espaços vazios da fazenda, enquanto outro poderia estar criando um número expressivo de animais. E aquele primeiro jogador, com muitos membros na família, acabou com sua comida e precisou mendigar. O resultado final é totalmente inesperado. Assim, não há aquela sensação de "fulano já ganhou" que tantas vezes tira a graça do jogo do meio pra frente.
Área de jogo: os recursos são muitos mas o tempo é curto
Meu ponto final é sobre as cartas do jogo: melhorias e profissões.
Agricola também foi minha primeira experiência com um jogo que tivesse tanto de uso de cartas. Em
Catan as cartas são apenas recursos, que poderiam ser peças de madeira (e só não são pra que você possa ter certo segredo sobre o que tem nas mãos). Mas, em
Agricola, as cartas são partes valiosas do que você planeja fazer. Sim, é possível jogar e até mesmo vencer o jogo ignorando completamente que elas existem. Mas não há como negar que é muito mais fácil obter recursos, principalmente comida, com o uso delas. As cartas dão um charme muito especial e peculiar ao jogo por sua características únicas. E também tem que se dar crédito pela quantidade delas. A versão mais comum do jogo hoje vem não só com um
deck, mas com três deles, o que permite uma rejogabilidade muito grande. Além disso, cada carta tem sua ilustração própria, o que mostra o cuidado e zelo do designer com o jogo.
Minha impressão final do jogo é que ele traz para o mundo dos jogos de tabuleiro um tema muito familiar, com inovações na medida certa. Um jogo muito fácil de ir para a mesa, mesmo tendo um certo grau de dificuldade para quem não está acostumado com euros, por ter um visual bonito e ter um modo "família" que deixa o jogo mais simpático. Hoje, com muito mais jogos lançados no mercado e com a enorme popularização que os
board games tiveram nos últimos 5 anos,
Agricola pode até não ser mais o número 1 no
ranking do
BGG (ele ainda está lá no top 10), mas ainda é um dos favoritos de muitos jogadores, inclusive eu.
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