Andre79::Resumindo: Andreas Seyfarth se rendeu à agendinha do mimimi. Ou talvez ele faça parte dela. Triste...
Caro
Andre79
Acho que vou me arrepender de levantar essa questão, pelo risco de sequestrar o tópico e acabar levando a discussão para um lado que não tem nada a ver com o assunto principal, e que já foi debatido à exaustão. Por isso, talvez fosse melhor deixar passar seu comentário e não dar atenção. Mas simplesmente não deixar passar é mais forte do que eu.
Você se importaria de me explicar, à qual "agendinha mimimi", você se refere? Pergunto isso porque certamente você não pode estar se referindo à questão da alteração da data, para que os jogadores deixassem de interpretar o papel de senhores de escravos. Eu simplesmente não posso acreditar que você ou qualquer outra pessoa ache tranquilo, e até legal, exercer um papel tão maligno, tão abjeto, e tão baixo desses.
Claro que se pode argumentar que quando o jogo foi lançado ninguém pensava nessa questão, apenas jogava e se divertia, e isso está correto, porque ocorreu exatamente assim. Mas depois que esse problema foi levantado e apontado, simplesmente não dá para ignorar essa questão e voltar a jogar normalmente, como se esse problema não existisse, pelo menos no meu ponto de vista. Depois que se sabe, não é mais possível resolver "des-saber". Do mesmo modo, é possível argumentar que mesmo após a abolição da escravidão em Puerto Rico em 1873, e da sua autonomia política em 1897, os colonos continuaram a ser explorados. Mas uma coisa é receber pouco por um trabalho pesado, outra coisa muito diferente é estar sujeito à escravidão.
Outro argumento que se levanta a esse respeito, é que as pessoas jogam board games interpretando o papel de sei lá, imperadores romanos, ou controlando impérios da antiguidade que também eram baseados e sustentados pela mão-de-obra escrava, e isso não parece tão grave. Mas há duas diferenças gritantes. A primeira é que a Antiguidade está muito distante em termos de tempo, mas a escravidão ocorreu a menos de 150 anos. Então existe gente cujo bisavô foi escravo, mas não existe ninguém, nem entre a nobreza, que possa dizer com certeza documental que seus familiares viveram na Roma/Grécia antiga, ou até mesmo na Idade Média. A segunda diferença é que o Puerto Rico lida diretamente com a produção agrícola que era uma atividade predominantemente escrava no século XIX. Então a identificação é imediata.
E só para você ter ideia de como a proximidade faz toda a diferença. Só uma pessoa muito doente ficaria à vontade jogando um jogo interpretando o papel de um oficial nazista, responsável por um campo de concentração, em que o objetivo fosse trucidar a maior quantidade de judeus, ou de uma torturador da prisão de Abu Ghraib, cujo objetivo é torturar a maior quantidade de prisioneiros e da maneira mais sádica, ou ainda de um pedófilo, cujo objetivo é acumular a maior quantidade de material de pornografia infantil. Falando assim, qualquer um desses três jogos seria inaceitável, pelo menos para pessoas sãs e de bem. Só que essa rejeição se deve, não apenas porque tudo isso é ética e moralmente errado, mas também porque essa questões está muito mais próximas historicamente, do que a escravidão, apesar desse capítulo tão sombrio da nossa história estar distante apenas 150 anos.
Então veja que eu não sou um militante woke ou da turma do mimimi, e inclusive acho que esse pessoal exagera nas reclamações e chega às raias do absurdo em algumas pautas (para mim falar "presidenta", é tão absurdo quanto usar "estudanta" para mulheres, e "todes" é tão sem sentido como usar "pianisto" para homens que toquem piano). Mas certas questões simplesmente transcendem qualquer ideologia, e relativização da escravidão é uma delas. É aviltante, é nefasto, é desumano e qualquer tentativa de minimizar isso, mesmo que em um simples board game, está errado, e não dá nem para discutir, e muito menos defender honestamente esse ponto de vista.
Dito isso tudo eu repito a pergunta: a qual "agendinha mimimi" você se referiu no seu comentário?
Iuri Buscácio