Rhapsody::
Grande Iuri.
Cara, vou falar de outros jogos, mas esses exemplos se aplicam perfeitamente ao Ticket to Ride.
Não sei se você já teve contato com o Charterstone ou o Pandemic Legacy. Nesses casos, ambos prometem que você terá um jogo perfeitamente jogável após a campanha legacy, e eles não mentem. O grande problema é que a qualidade desse jogo pós-campanha não é 10% da emoção e qualidade da campanha legacy. Comprar um Pandemic Legacy já jogado, por exemplo, pra jogar simplesmente o Pandemic normal, é jogar dinheiro fora, já o Pandemic Legacy novinho é uma experiência bem legal. O jogo pós-legacy (isso vale pro Ticket to Ride também) literalmente deixa de utilizar diversos componentes e situações e regras bem legais da campanha legacy simplesmente porque não dá mais, fica uma sensação tipo, "puxa, na época da campanha foi muito legal quando fiz isso no mapa". E quando o jogo tem adesivos isso se agrava mais ainda, pois dependendo da forma que você colá-los, pode "arruinar" seus jogos pós-legacy, no Charterstone por exemplo, você pode construir construções e depois construir outras por cima, literalmente colando um adesivo em cima do outro, daí existem construções com efeitos legais e únicos que literalmente nunca mais vai ter se alguém cobriu ela na campanha, ou ao final da campanha você pode ter um tabuleiro onde carvão é um componente que vale muito a pena e dá pra fazer muito ponto, mas pegar barro e trigo não vai valer de nada porque não tem onde usar. No Ticket obviamente a regra não é essa mas o conceito de ter um "tabuleiro único pós-campanha" é o mesmo.
andersondealm:: Joguei toda a campanha do TTR Legacy e acho que, com algumas adaptações em algumas partes desse jogo, tornaria totalmente possível rejogá-lo em modo campanha e com certeza ainda seria uma experiência incrível, mesmo sem o elemento surpresa. A questão é que ter elementos que são "destruidos" ao longo da campanha inviabiliza ter uma rejogabilidade exatamente igual, mas porque ao invés de furar, não pensar em um adesivo que possa ser tirado no final da campanha, enfim, da para adaptar e rejogar.
Iero::
Só uma correção. O Clank legacy 1 de 2019 já foi lançado com a ideia de ao final da campanha a pessoa ficar com um Clank que possa ser jogado, como se fosse um jogo base mais expansões.
Entendo o que você fala sobre a ideia original do Legacy. Mas será que o fato de agora os jogos legacy estarem saindo com a opção ter um jogo completamente jogável ao final da campanha, não seria exatamente uma resposta a crítica (que acho justa) que você está fazendo?
Posso falar do Clank Legacy com propriedade porque estou com um grupo terminando a campanha. Cada partida tem sido épica. E se pensar em questão de custo neste caso em específico, ao final ter o jogo base mais expansões seria quase o mesmo preço do legacy. Na verdade pelo preço do clank no Brasil pode até ser mais barato.
Eu também abomino a ideia de destruir qualquer coisa de um jogo. Nunca destruí nenhum componente de um jogo legacy que joguei. Nunca anotei nada no jogo, sempre uso uma folha à parte para anotar o avanço da campanha. Sobre colar o adesivo, entendo e respeito a resistência, mas no caso do Clank pelo menos, faz todo sentido colar os adesivos. Porque a gente acaba colando em espaços vazios, literalmente se expande o jogo. Até remete um pouco a sensação de estar completando um álbum de figurinhas.
Acho que seria um jogo interessante de você jogar para ter uma ideia dessa experiência. Conforme o jogo vai avançando, vai se adicionando componentes, desbloqueando novas regras, desbloqueando novos personagens e mecânicas. Fica até mais fácil de aprender as regras porque se vai aprendendo aos poucos.
Enfim, acho que seria interessante se aprofundar mais no assunto para poder fazer uma crítica mais justa e não correr o risco de ter uma visão parcial e as pessoas acabarem criando uma resistência sem ter uma visão mais completa da questão.
Não quero com isso de nenhuma forma desmerecer seu trabalho, que você sabe que sou grande admirador e leitor assíduo dos seus textos. Gostaria apenas de propor essa ponderação. No mais, concordo com quase tudo que você disse.
Um grande abraço.
Caros
Rhapsody,
andersondealm e
Iero
Meus camaradas, antes de mais nada quero deixar claro que não me senti nem atingido nem desmerecido de forma alguma pelos comentários de vocês. Como vocês sabem os meus artigos aqui no Ludopedia são ou informativos (especialmente a série Dica p/ Novos Jogadores), ou convites à reflexão, como é o caso desse último envolvendo os jogos Legacy. Portanto a ideia aqui é justamente fomentar o debate e confrontar pontos de vistas e entendimentos diferentes. Com isso eu acho que todo mundo aprende um pouco mais, tanto quem participa ativamente das discussões quanto quem apenas lê os comentários. E para isso a dialética e o embate de opiniões é fundamental, porque se todo mundo pensa exatamente da mesma forma, pouco se constrói além daquilo que já é consenso.
No caso do Clank Legacy sou forçado a reconhecer que não joguei, porque não curti muito o Clank original. Sei que é um jogaço, sem dúvida, mas por algum motivo que eu não sei explicar direito, não fui muito com a cara dele. Mas uma coisa interessante a respeito do comentário do Iero, é que se o Clank Legacy já se preocupava desde 2019 a contrariar a ideia original dos jogos Legacy, em torno da "experiência única", isso demonstra claramente que a crítica em relação à descartabilidade dos jogos Legacy é bem mais antiga do que eu imaginava. E ao que tudo indica, esse conceito (jogo normal pós-campanha Legacy) já vem ganhado força há algum tempo, principalmente quando uma das franquias de board games de maior sucesso, o Ticket to Ride adota essa postura. Levando isso em consideração acho que já dá para falar em uma tendência dos jogos Legacy a se distanciar e cada vez mais daquela ideia original de "experiência única".
E vejam só como uma boa discussão respeitosa é saudável. De um lado Rhapsody relata que a questão do adesivo no Chaterstone é um problema porque, quando se cola um adesivo sobre o outro você inviabiliza a utilização posterior de elementos muito legais do jogo. Do outro lado Iero relata que no Clank Legacy a colagem dos adesivos não é um problema porque isso ocorre em espaços vazios, expandindo o jogo. Isso provavelmente decorre do fato do Chaterstone ser mais antigo (2017) e ainda estar apegado à ideia da "experiência única", enquanto que o Clank Legacy, mais novo (2019), já trazer a ideia do jogo pós-campanha. Daí a colagem de adesivos no primeiro ser mais problemática que a colagem de adesivos no segundo.
Essa divergência, entre entendimentos desses dois jogos, entra justamente na questão levantada pelo andersondealm. Sinceramente, não vejo problema algum em colar um adesivo em um token de papelão e colocá-lo sobre o tabuleiro ao invés de colá-lo. Obviamente isso dá mais trabalho, especialmente no set-up de uma partida para outra, e apenas durante a campanha. Mas a outra alternativa (colar o adesivo no tabuleiro) me parece muito pior, especialmente nos jogos Legacy ainda baseados no conceito de experiência única. Se a colagem do adesivo no token for feita no Charterstone, por exemplo, o problema levantado pelo Rhapsody não aconteceria, e todos os elementos estariam disponíveis. Já no caso dos jogos Legacy mais recentes, que utilizam o conceito de jogo pós-campanha, como é o caso do Clank, isso talvez não fosse necessário.
Mas aí entra outra questão interessante. Se mesmo nos jogos Legacy mais recentes, a ideia do adesivo colado em um token e não no tabuleiro for utilizada, e as condições do final de uma partida forem anotados em separado, os jogadores passarão a contar com novos cenários assimétricos, conferindo uma enorme rejogabilidade ao jogo. Com isso seria possível sempre retornar a uma determinado cenário do meio da campanha, e conforme ele se desenrolasse, seria gerado, ao menos em tese um novo cenário. Assim, em um exemplo para lá de genérico, o jogador X poderia jogar com o time azul durante a campanha e o jogado Y com o time vermelho. Após finalizada a campanha, esses jogadores poderiam retornar à partida 6 da campanha, mas com os times invertidos e jogar à partir daí. Nesse caso essa partida 6 talvez tivesse um desfecho diferente, criando as condições para um partida 7 alternativa, diferente da partida 7 da campanha original.
Sei que essa proposta acima pode parecer uma "viagem muito grande", e possivelmente ela não seria aplicável a todos os jogos Legacy, mas não consigo deixar de pensar que ela também poderia ser um caminho muito interessante. Isso sem falar que ela abre uma grande possibilidade de novas partidas, em jogos com um roteiro mais ou menos, definido que são os jogos Legacy. Na minha humilde opinião isso transforma um conceito de jogo que já é bom, em algo ainda melhor.
O que vocês acham a respeito?
Um forte abraço e boas jogatinas!
Iuri Buscácio