
No começo de 2003, quando eu estava prestes a fazer 17 anos, eu estava determinado a curtir um verão de muita diversão.
Pretendia pegar uma praia pela manhã, jogar Metroid Prime à tarde e dar uma volta com os amigos ao pôr do sol, repetindo tudo isso no dia seguinte.
Como eu tinha acabado de abandonar o estágio por pura malandragem, queria aproveitar minha liberdade ao invés de ficar enfurnado em um escritório, mas logo acabaria descobrindo que eu ficaria trancado em casa do mesmo jeito, ao menos pelas manhãs.
Isso porque desde o finalzinho de 2002 eu vinha vendo uma propaganda na televisão sobre um novo desenho animado que estava prestes a competir com Dragon Ball Z e Digimon pela atenção da molecada na programação da TV Globinho.
Yu-Gi-Oh!
Era sobre a aventura de um cara com cabelo espetado controlando monstros. Isso dava a impressão de que seria algo bem semelhante à (Poké)mania do momento. No entanto, o fato do personagem estar sempre segurando umas cartas de baralho me deixou encucado.
Será que os monstros são invocados das cartas, como se fossem Pokébolas ou Digivices?
Eu que já estava encantado com Pokémon Trading Card Game não pude deixar de ficar interessado nessa característica.
Assim, quando o primeiro episódio ia ser exibido (em 6 de Janeiro de 2003, se não me falha a memória), lá estava eu de plantão pra dar a conferida.
30 minutos depois eu estava embasbacado.
O tal do Yu-Gi-Oh! não era apenas um desenho em que monstros eram invocados das cartas para lutar, mas sobre duelos de um Trading Card Game na íntegra.
Uau!!!
Olha, é até difícil comentar o quão eu fiquei empolgado, mas tente imaginar.
O novíssimo gênero obscuro de jogo que mais vinha me fascinando estava ali, passando na TV aberta pra todo mundo ver.
Frente a essa exibição matinal diária peguei o costume de só sair de casa após assistir Yu-Gi-Oh! e, quando ia pra rua, perguntava pra todo mundo se estavam assistindo também.
Não é de se espantar que, em geral, a maior parte dos meus amigos não deu muita bola pra novidade, até porque o fissurado em Trading Card Games era apenas eu, mas me contaram por ae que um amigo não só tinha gostado, como já estava jogando Yu-Gi-Oh!.
Sério mesmo?
Eu nem sabia que já tinham lançado as cartas desse jogo.
Frente a minha empolgação, não é de se estranhar que eu resolvi ir na casa dele na maior cara de pau perguntar se podia me mostrar o jogo, né?
Chegando lá, a surpresa:
Eram sim as cartas de Yu-Gi-Oh!... todas desenhadas à mão.
Esse meu amigo, desenhista nato, sempre rabiscando uns personagens enquanto a galera jogava videogame, estava produzindo as suas próprias cartas à medida que elas iam aparecendo nos episódios.
É claro que ele não dava conta de desenhar tudo, mas tinha lá o Mago Negro, Rei Caveira, Dragão Branco dos Olhos Azuis, Força Espelho e até mesmo o Vírus de Infecção de Baralho.
E isso ainda misturado com outras cartas que ele mesmo criava, como A Patrulheira e seus míseros 1300 pontos de ataque.
Já na hora de jogar, aquela confusão.
Como tudo o que tínhamos acesso sobre as regras do jogo era aquilo que aparecia na TV, tentávamos reproduzir a experiência dos episódios na mesa, mas nada funcionava como deveria.
Monstros eram colocados em Modo de Defesa infinitamente caso o oponente tivesse uma criatura mais forte, fazendo com que a maioria das partidas se encerrasse com o término dos pequenos baralhos disponíveis.
Isso porque alguns monstros, de tão poderosos, simplesmente não podiam ser abatidos, travando o jogo a menos que a Infecção de Baralho fosse ativada e, nesse caso, a única carta que ainda poderia ser usada era a tal da Patrulheira. Está aí a justificativa de me lembrar da força de ataque dela após todos esses anos.
As partidas não eram nada divertidas, mas mesmo assim não conseguíamos parar de jogar.
Estávamos tão empolgados pra experimentar os duelos de Yu-Gi-Oh! que mesmo uma experiência de jogo extremamente limitada quebrava o galho.
Um sinal do quão Yugi e seus amigos cativavam os espectadores a viver as emoções de suas batalhas de cartas.
Quem viveu essa febre certamente não vai discordar:
Após assistir Yu-Gi-Oh!, tudo o que queríamos era ter a nossa própria Hora do Duelo.
