VitorMX, vou colocar uma resposta com a minha percepção dos benefícios desse tipo de coisa. Certamente não é a resposta mais completa nem universal, mas é como eu vejo isso hoje.
A separação entre classificações e campeonatos para mulheres pode ter efeitos divisivos. Eu concordo. Porque eu ficava relativamente ofendida com a separação de categorias no xadrez, quando competia. Esse tipo de divisão pode soar ofensiva quando se interpreta que há a premissa implícita de que homens são cognitivamente superiores, e portanto mulheres merecem uma colher de chá.
Ainda, especificamente no xadrez essa divisão existe já faz tempo, e como mquaresma falou, os motivos históricos provavelmente são mais machistas que inclusivos.
No entanto, entre a época em que eu jogava e hoje ganhei outras percepções, e observo benefícios em duas esferas diferentes, que subvertem as motivações históricas citadas acima e que, na minha visão particular, são mais benéficas que o malefício citado anteriormente, muito embora algumas aplicações, como a tradicional do xadrez, possam ser discutidas.
Elas são 1. representatividade e 2. a criação de um espaço convidativo
Ignorando-se os aspectos sociais, é estatisticamente esperado que, se há 100 homens e 10 mulheres competindo, a presença masculina entre os melhores jogares seja de 9 para 1. E qualquer um observa que a esmagadora maioria dos jogares em evidência, em rankings ou produção de conteúdo, é masculina. No entanto, quando um grupo já é considerado pela sociedade ao largo como intrinsecamente inferior em uma atividade e menos compatível com esta, o peso da ausência de referências fica maior. Esse efeito é psicológico e definitivamente não nulo. Não irei citar referências e estudos, mas usar um exemplo que eu vivenciei:
Ao ensinar xadrez a duas crianças, uma menina de 8 e um menino de 5, a menina, que estava aprendendo o jogo com interesse, imediatamente desistiu de continuar quando o irmão menor também quis aprender, segundo ela porque "meninos são mais inteligentes". Claro que ela sabia que mulheres também jogavam xadrez, mas a certeza de que tinha uma desvantagem natural, para ela comprovada pela esmagadora presença de meninos em jogos e incutida pelo seu círculo social, foi o suficiente para que se afastasse da atividade.
A representatividade por si só não apaga essas crenças implícitas de crianças e jogadores, mas sem dúvida contribui para combater essa ideia, porque o que eu posso dizer por minha experiência é que a representação constante do seu grupo como inerentemente inferior e a ausência deste em algumas atividades é psicologicamente desgastante.
O que um campeonato que coloca esse grupo tímido em evidência faz é criar representatividade e mostrar que não há só jogadoras, o já é muito bom, mas boas jogadoras.
Em relação a 2, acho que a maior prova de que este seja um espaço convidativo é o interesse espontâneo desse mesmo grupo minoritário em criá-lo para si.
Eu tenho que admitir, e com prazer, que esse ambiente de jogos é mais inclusivo e convidativo que o de videogames, e me parece menos preconceituoso que a sociedade em geral. No entanto é inevitável que carregue em alguma medida esse problema social, e compreensível que algumas jogadoras se sintam mais à vontade em um grupo em que há um bom grau de certeza de que esses problemas não irão surgir, além do problema citado anteriormente por mim e mquaresma (a partir de caminhos diferentes) sobre o desempenho, e consequentemente conforto, de mulheres jogando com populações diferentes de jogadores.
Não apenas isso, mas quando o grupo já é minoritário, a representação decorrente desse espaço dedicado já se torna por si uma forma de mostrar que mulheres são, sim, bem-vindas no universo de jogos.
Puxando novamente aquele exemplo com as duas crianças, a menina estava disposta a aprender até o momento que o irmão também o quis, ou seja, surgiu um comparativo entre os dois. Porque o mundo de jogos tem forte presença masculina, e ela, na crença de seria inevitavelmente superada, não se sentiu mais à vontade. Esse campeonato pode se tornar atraente ao público em que foca também por causa disso, mesmo quando as crenças das jogadoras de Carcassonne muito provavelmente são outras e mais desenvolvidas.
E para justificar a existência desse campeonato, embora o problema de haver uma vaga dedicada apenas a mulheres na seleção brasileira seja outro e pertinente a essa discussão, a seleção desta integrante é suficiente.
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Acredito que não seja essa a sua intenção, mas dizer que a criação de classificações e campeonatos exclusivos para mulheres traga mais malefícios que benefícios ironicamente é uma das causas pelas quais esses ambientes existem, pois isso desconsidera os outros motivos e desencadeamentos da falta de evidência da minoria.
Eu não disse nada disso com agressividade ou menosprezo, porque eu acho que o problema que você citou é perfeitamente válido. Mas esses tipos de política envolvem outras consequências e partem de outras premissas, que vão além daquela divisão e ressoam mais fortemente com quem está nesse grupo social.