Quando ouço o nome Alexander Pfister, imediatamente meu interlocutor ganha não apenas minha atenção, como meu interesse. Tendo chegado tarde para esse hype train, tive a oportunidade de olhar para os títulos dele com um olhar um pouco mais distanciado, mas me confesso fisgado. Ele tem um dos jogos que mais joguei até hoje, o
Oh My Goods!, que tem uma ótima variante solo não oficial, e o
Great Western Trail, que também tem outras variantes solo não oficiais que já analisei aqui pelo canal.
Quando ouvi falar do lançamento do
Blackout: Hong Kong, fiquei imediatamente curioso. Ao saber que ele tinha um modo solo oficial, já disponível com o jogo no lançamento, sabia que aquele jogo logo viria para minha mesa. Quase comprei uma cópia gringa, mas, por sorte, soube do lançamento nacional e esperei uma boa oportunidade de comprá-lo, o que não tardou a aparecer. O jogo chegou para mim em uma quinta-feira e, entre o dia seguinte e o momento em que vos escrevo, menos de uma semana depois, foram mais ou menos 15 partidas. O jogo ficou montado em minha mesa o tempo todo.
Não preciso dizer que achei esse um jogo muito sólido e que fiquei satisfeito com a compra. Fosse o contrário, não teria passado da segunda ou terceira partida. Posto isso, vamos à uma análise mais pormenorizada do que, em minha opinião pessoal, foi bom e ruim nesse aqui.
O que eu gostei?
1) O modo solo é idêntico ao jogo normal, não muda nada. O jogo possui um grau muito baixo de interação, logo não se perde nada jogando solo em relação à sua experiência multiplayer.
2) Mais do que uma salada de pontos, o jogo tem uma salada de mecânicas. A gente reconhece ações programadas, hand building, push your luck, controle de área, gestão de recursos e por aí vai. Isso se reflete em um monte de caminhos estratégicos diferentes a serem tomados. O fato é que você não pode optar exclusivamente por um deles, acaba sendo necessário fazer de tudo um pouco. Isso torna seu espaço de decisões extremamente rico.
3) Trata-se de um eurogame raiz, de recursos escassos e relativamente poucas ações. Você é pressionado pelo timer do jogo, que é o baralho de compras. Ele funciona excepcionalmente bem. A gente acha que não, mas, de repente, a gente olha e o baralho está acabando. Se não ficarmos de olho e nos programarmos bem, tudo dá errado.
4) O jogo vem com um modo campanha, que pode ser jogado competitivamente ou solo. Na verdade ele muda um pouco o setup e os objetivos da partida, mas a essência é preservada. Nesse modo, jogam-se 5 partidas bastante diferentes e vence aquele que atingir mais pontos conforme um escore específico (diferente da pontuação do jogo) ao fim da 5ª partida. Eu adorei isso aqui, simplesmente adorei! Consegui vencer 4 dos 5 desafios e, à exceção do quarto desafio, joguei 1-2 vezes cada um deles. O quarto desafio eu joguei 5 vezes e ainda não consegui vencer de forma convincente.
5) Se você gosta do Pfister, muitos elementos dos seus outros jogos se farão reconhecidos aqui. Isso é confortável. O timer do jogo, o baralho de compras, e a construção de mão, são elementos que me lembram demais o Great Western Trail. Não cheguei a jogar esse, mas muitos falam que a mecânica de ações programadas é muito parecida com algo do Mombasa. Enfim, são mecânicas simples, não dominantes e absolutamente complementares, que fazem o todo desse jogo ser muito interessante.
Setup para uma partida solo da campanha.
Playmat do jogador com os objetivos iniciais. A trilha de turnos com o marcador roxo me lembra demais a do Banquete para Odin.
Aspecto final do tabuleiro no término da partida, quinta e última da campanha solo. Venci esse desafio por somente 1 ponto! Vendo a imagem depois, comi uma bola aqui. Vamos ver salguem percebe qual é.
E o que ele tem de pontos negativos?
1) Um jogo bonito e bom é muito melhor do que um jogo feio e bom. Arte é uma coisa relativa, que remete ao gosto e preferências, mas, amigos, feiúra é uma coisa absoluta. E esse jogo é pior do que feio, porque os problemas de design gráfico dele interferem em sua jogabilidade. A edição trazida pela Galápagos já traz algumas melhorias em relação à primeira (tabuleiro mais legível, mudanças na organização do playmat do jogador, mudanças no design das cartas e ícones), mas ainda assim tudo podia ser mais claro, legível e melhor. É uma produção cara, de alto padrão, que devia ter tido muito mais esmero nestes pontos.
2) Se você acha que os jogos do Feld tem tema colado, você não sabe o que te espera nesse aqui. A gente não se sente em nada numa situação de blackout, de caos urbano. Nada disso está presente, a não ser por uns pequenos elementos, como os (péssimos) gráficos e o (também péssimo) sistema de cores. Mecanicamente o jogo é perfeito, funcional e muito gostoso de se jogar, mas a temática está longe de se fazer integrada.
3) A rejogabilidade é, sim, limitada. Os principais determinantes do jogo são os planos de emergência, que são 5 cartas somente. No modo campanha você utiliza 4 delas. Depois de ter jogado com cada um deles, a gente de fato perde um pouco o interesse em continuar jogando. Confesso que, apesar de ter adorado o jogo, não me vejo tendo ele na coleção por um tempo muito longo, porque dificilmente retornaria a ele. Esse problema, no entanto, é perfeitamente contornável com o lançamento de mais cartas e, eventualmente, novos mapas de jogo. Blackout: Hong Kong é um jogo mecanicamente muito bom, mas poderia se tornar um jogo excepcional se fosse ampliado no rumo certo. Isso o futuro vai nos mostrar.
4) O preço. Não vejo justificativa de se cobrar entre 350 e 400 reais para o que vem de componenentes nesse jogo. Um baralho pequeno, alguns tokens de cartonado e madeira e uns tabuleiros de cartonado. Considerando-se a pouca funcionalidade/qualidade do design e esse ponto, acho que o jogo é caríssimo. Nessa mesma faixa de preço há jogos que acho que oferecem mais, inclusive no mercado nacional.
Como uma última reflexão antes de finalizar o texto, o Pfister cada vez mais tem me lembrado meu designer favorito, o Uwe Rosenberg. À exceção de
Broom Service e
Isle of Skye, os jogos de caixa grande do Pfister me lembram muito o aspecto evolutivo que os do Uwe também tem. Ele parece aproveitar e refinar mecânicas previamente utilizadas em uma coisa que acaba tendo cara e estrutura totalmente diferentes. É como se você olhasse para aquilo e tissesse um déjà vu. Estou curiosíssimo com o
Expedition to Newdale, que logo chega aqui em casa. Acho que ele vai aprimorar muito o Oh, My Goods!
Em conclusão, mesmo a despeito dos pontos negativos que elenquei acima, acho Blackout: Hong Kong um ótimo jogo e recomendaria fortemente a quem se interessa por eurogames, em particular pela obra do Alexander Pfister. Fornece uma experiência solo muito agradável e desafiadora e deve funcionar bem no multiplayer, sobretudo nas contagens mais baixas de jogadores. Se você não conhece o designer, esse é um bom ponto de entrada enquanto o reprint do Great Western Trail e
Maracaibo não chegam aqui. Se quiser colocar a mão no seu bolso menos profundamente, procure o Oh My Goods. Não tem como errar com esse cara, ele é um dos grandes designers dos últimos anos.
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