“Enquanto a terra sofre com invasões de Orcs e os Draconum liberam-se de suas incubadoras subterrâneas, uma terceira força chega ao local. Os camponeses os chamam de Mage Knights – uma vez que se provaram igualmente hábeis em magia e lâmina. Ninguém sabe quem os enviou, ou por quê. Alguns os celebram como heróis e libertadores e estão ansiosos para se juntar aos seus exércitos, pois acreditam que podem trazer a verdadeira estabilidade com o seu poder. Muitos os temem e fecham os portões de suas cidades, uma vez que os Mage Knights são estranhos e permanecem em silêncio sobre as suas motivações. Em poucos dias, alguns Mage Knights varreram uma região de campo em que exércitos inteiros teriam levado meses para conquistar. A única sugestão em relação a suas motivações é que eles caminham claramente para a capital. Hoje à noite, eles vão chegar às suas paredes ...”
Mage Knight Board Game nada tem a ver com o antigo e relativamente popular jogo de miniaturas colecionáveis comercializado pela Wizkids entre os anos de 2000 e 2005. De fato, a única ligação entre eles é o nome, a marca, “Mage Knight” e o universo de fantasia em que se passam, mas é um jogo totalmente independente das regras do passado.
Em função de grave crise financeira, a Wizkids foi fechada em 2008 e posteriormente comprada, juntamente com suas propriedades intelectuais, pela NECA em 2009. Com isso novas séries de miniaturas utilizando o “sistema Clix” (bases com discos que podem ser girados, representando as estatísticas dos personagens) foram anunciadas. Parte desse sistema é utilizado nas miniaturas das cidades de Mage Knight Board Game, representando apenas quais são os tipos de inimigos defendendo-as.
A oportunidade de renovação da franquia Mage Knight e seu reposicionamento no mercado de board games vieram através da colaboração de um designer versátil e reconhecido pela originalidade e variedade em suas criações: Vlaada Chvátil.
Criador dos premiados e aclamados Through the Ages: A Story of Civilization, Galaxy Trucker e Dungeon Petz, Chvátil é conhecido por utilizar mecânicas inventivas que se encaixam fortemente aos temas propostos. Essa adequação ao tema fica evidente pela forma como ele escreve as regras de seus jogos, que sempre deixam o tema aparente e algumas vezes inclusive o usam para injetar humor no processo de aprendizado.
O jogo utiliza mecânicas diversas, podendo mencionar como principais uma mistura de compra e escolha de cartas, construção de deck e exploração de tiles.
Cada peça no mapa possui sete espaços hexagonais, onde estão representados diversos tipos de terreno e possíveis pontos de interação, como vilas, fortalezas e monastérios, ou desafios aos heróis, monstros, dungeons e outras ameaças. Algo interessante nessas representações variáveis de terreno envolve a movimentação dos personagens pelo tabuleiro que se forma, uma vez que cada tipo de terreno exige um custo específico em pontos de movimento para sua transposição.
Além dessa diferenciação em função do tipo de terreno, outro elemento que influencia muito no deslocamento pelo mapa é o período do dia, já que as rodadas se alternam entre “Dia” e “Noite”. Enquanto atravessar espaço de Floresta durante o Dia exige três pontos de movimento, durante a Noite esse custo sobe para cinco pontos, fato que dificulta muito a definição de táticas para cada rodada, limitando as ações dos jogadores. Essa limitação se dá de forma orgânica à mecânica do jogo, que exige a utilização de cartas para quase todos os tipos de ação disponíveis para serem executadas pelos jogadores.
De maneira geral, as principais ações que um Herói pode realizar num turno são: Movimentação, combate (Ataque e Bloqueio) e interação com locais (através de pontos de Influência). Todas essas ações dependem do uso de cartas e, por esse motivo, é importante procurar alinhar o máximo possível sua tática de jogo à montagem do deck através das cartas disponíveis para compra.
Existem cartas específicas para cada tipo de ação, apesar das regras permitirem sua utilização de forma mais genérica. Em resumo, pode-se utilizar uma carta específica de um tipo de ação para executar qualquer outra ação básica (Movimentar, Atacar, Bloquear ou Influenciar) com valor 1. Por exemplo, usar uma carta de “Ataque 4” para ações de “Movimento 1”, “Bloqueio 1” ou “Influência 1”.
Esse sistema de utilização das cartas gera um dos poucos inconvenientes do jogo, que é a impossibilidade, em alguns momentos, de executar uma série de tarefas num mesmo turno, uma vez que ao precisar descartar toda sua mão para andar algo como dois espaços no tabuleiro, o jogador não terá qualquer chance de iniciar um combate ou interação em seguida. A limitação em si não é exatamente um problema, porém a quantidade de ações possíveis (ainda que restritas) à disposição dos jogadores a cada turno aumenta consideravelmente o “down time” aos jogadores. Mesmo em partidas com jogadores que conheçam profundamente as regras, você provavelmente vai demorar um pouco mais do que gostaria até que seu próximo turno chegue.
Mage Knight é composto por uma série de componentes de boa qualidade, design gráfico muito bem elaborado e arte belíssima, além de incluir miniaturas detalhadas de cada um dos heróis que já vem pintadas. Além disso, existem miniaturas de cada uma das quatro cidades, cada uma com suas particularidades na quantidade de “guardiões”. Essas são as únicas miniaturas do jogo que utilizam o sistema “clix” da Wizkids. Basta girar a base da cidade para conferir qual a quantidade e quais tipos de inimigos serão seus guardiões, dependendo do nível escolhido para ela.
Dentre os componentes, o desapontamento vem por parte da qualidade das cartas, que realmente são um pouco mais frágeis do que se esperaria num jogo onde a manipulação e embaralhamento são constantes. Caso não se usem sleeves logo numa primeira partida, é muito provável que algumas deles possam ser levemente danificadas, ainda que se tome muito cuidado, já que seu material e acabamento poderiam ser melhores.
O jogo possui dois manuais: um completo, com uma série de detalhes avançados nas regras e cenários e outro mais simplificado, com um cenário inicial, recomendado para principiantes, e focado nas regras para esse caso. Recomenda-se a utilização desse cenário sempre que houver um jogador que não conheça as regras entre os participantes da partida. Isso porque a quantidade de regras e detalhes específicos é muito grande e tentar explicar tudo de uma vez pode ser, além de cansativo, muito confuso.
No manual do cenário inicial as regras são expostas de maneira sequencial, incluindo um setup diferenciado para a partida. Enquanto a aventura se desenrola, outros elementos vão sendo incluídos na mesa e suas explicações são detalhadas no manual conformem as situações ocorrem. Permitindo que o jogo seja mais bem absorvido por cada um dos jogadores e evitando que uma quantidade de informação maior do que a necessária para aquele momento seja despejada sobre eles.
O manual “avançado” apresenta, além do setup completo para o jogo e todos os detalhes das regras, uma série de cenários diferentes, cooperativos e competitivos, aumentando o fator de rejogabilidade do título. Esses cenários podem ter como objetivo a simples exploração de determinada área ou a conquista das grandes cidades. O jogo ainda permite, no caso das partidas competitivas, que os próprios jogadores se enfrentem em combates de herói contra herói, que conta com mais uma boa quantidade de regras específicas, mas pode trazer um tempero muito especial.
O jogo possui um sistema de pontuação simples, baseado nas conquistas de cada personagem, como se fosse um contador de experiência dos jogos de RPG. Ao derrotar inimigos, o herói adquire uma quantidade de Pontos de Fama e, em alguns casos, Pontos de Reputação. A Fama é o que vai determinar quando um personagem sobe de nível (ganhando vantagens em habilidades, cartas de ação avançadas, armadura e limite de cartas na mão), enquanto a Reputação vai interferir em suas interações com os locais do jogo que dependem de Influência. Por esse motivo, quanto mais ações “desonrosas” um herói tomar durante a partida, mais difícil torna-se a aquisição de novas cartas através do treino nos monastérios ou do recrutamento de novas unidades para que o acompanhem.
No início de 2013 foi lançada sua primeira expansão, The Lost Legion, que acrescenta novos tiles de locações, cartas de ação, unidades e feitiços, novos inimigos e ruínas, além de um herói e um novo e misterioso vilão, General Volkare. Com todas essas adições, é natural que a expansão venha acompanhada também de um novo manual expandindo as regras para partidas em até cinco jogadores e através de novos cenários.
É essa riqueza de detalhes que torna Mage Knight um jogo tão impressionante e o tem colocado com frequência nas listas entre os melhores board games da atualidade. Não é um jogo simples de ser dominado, ainda que com poucas partidas suas regras possam ser entendidas e memorizadas.
Exigirá empenho e dedicação dos jogadores, mas aqueles que aceitarem esse desafio terão a certeza de estar aproveitando uma das melhores experiências num jogo que envolve a temática de aventura por um mundo de fantasia medieval que estará em constante evolução.